Não há nada mais diferente que os sistemas de exploração leiteira dos EUA e da Nova Zelândia. São sistemas muito bem definidos e lucrativos em suas próprias realidades, mas neste contexto mundial alguns tentam nos enquadrar próximos de um ou de outro. Vamos discutir neste artigo de que modo podemos tirar proveito destas diferentes visões empresariais de produção de lácteos em busca de um sistema nacional.
Em vários países do Hemisfério Norte, incluindo aí os EUA, o sistema de produção é totalmente confinado com fornecimento de Dieta Total, com altas inclusões de concentrados, acarretando uma alta produção de leite por animal. Na Nova Zelândia há foco muito grande na produtividade do pasto, maximizando assim a maior produção possível de leite por área sem necessidade do uso de concentrados, que são muito caros por lá.
Quem está errado? Ninguém. Cada um adaptou sua realidade de climática, cultural e econômica a um sistema de produção lucrativo. Neste aspecto, para criarmos um sistema de produção nacional que atenda à nossa expectativa, temos que focar o lucro. Os sistemas de produção nacional podem ser divididos em três tipos e cada um deles deve perseguir um objetivo para maximizar o lucro.
O confinamento total não é um sistema muito comum no Brasil. Apesar de termos sistemas muito eficientes de produção com Dieta Total, com ilhas de excelência com produção comparável aos EUA, não se pode dizer que este sistema é muito comum. O sistema aplicado no Hemisfério Norte não é aplicável aqui, pois lá há fortes subsídios, tornando a atividade mais segura. A nosso favor, contamos apenas com insumos e Mão-de-obra mais acessíveis. As principais dificuldades para o aumento do número de produtores com rebanhos em confinamento por aqui é a incerteza do mercado, que, devido à falta de políticas eficientes de preço mínimo, tem um preço muito variável. Nesta ótica, para reduzir o custo de produção e estar apto a conviver com a volatilidade de preços, os sistemas baseados em Dieta Total no ano todo devem ter altíssimas escalas de produção, fazendo uma diluição dos custos fixos em altas produções por vaca e por fazenda.
Vivendo em um país que não tem subsídios à agricultura e com um custo de concentrados proibitivo, os neozelandeses adaptaram-se a um sistema de produção a pasto, com muito pouco ou nenhum concentrado. O foco deles são altíssimas produtividades de pastagem permitindo assim que cada fazenda tenha produção suficiente para remunerar o trabalho na atividade. O sistema da Nova Zelândia tem diferenças cruciais para o sistema nacional. Uma primeira diferença é a qualidade das gramíneas temperadas, que tem fibra de alta qualidade. Outra diferença importante é o alto custo de concentrados, que não é realidade aqui, permitindo que nosso sistema de exploração use um pouco mais de concentrado, até mesmo para suprir as deficiências de nosso volumoso tropical, que não tem a mesma qualidade do volumoso temperado deles.
Mas o ponto crucial das diferenças é a sazonalidade da produção neozelandesa. Lá, a produção se inicia na primavera e aproveita a boa produção de pastagens, que vai até o outono. No inverno, todas as vacas estão secas, minimizando assim o gasto para alimentá-las. Este sistema encontraria várias barreiras no Brasil. Devido a um sistema de baixa tecnologia que impera por aqui, a indústria tem altos excedentes no verão. Isto implica em preços baixos, muitas vezes abaixo do limiar aceitável, principalmente para o produtor que não produz leite no inverno, fazendo uma "cota de produção".
Portanto, a alternativa mais viável é a construção de um modelo nacional de produção de leite. E este modelo não precisa ser inventado, basta apenas que seja difundido, pois empiricamente o produtor nacional já foi se adaptando a este modelo ao longo dos anos. Os pontos chaves deste modelo são a utilização de pastagens nos meses quentes e uma suplementação mais efetiva no inverno para aproveitar a época de bons preços do leite.
Neste aspecto temos dois modelos que posso definir como Especializado e Pouco Especializado. No sistema Pouco Especializado, temos vacas que não recebem ou recebem muito pouco concentrado no verão. Normalmente são animais de baixa aptidão leiteira. O maior desafio da lucratividade nestes sistemas é a escala. Como a produção por animal é baixa, é necessário que se tenha muitos animais para que a renda resultante do leite venha a remunerar o trabalho. Normalmente estes sistemas pecam pela baixa eficiência reprodutiva e grande número de vacas secas.
Estes produtores devem compreender que, para ser lucrativo, temos que pressionar intensivamente a pastagem, e usar pastejo rotacionado, para que quando o animal venha a comer a pastagem, esta esteja em seu melhor período de "colheita", como os neozelandeses fazem. Outro ponto importante é a reprodução. Mesmo na Nova Zelândia onde o custo dos concentrados é alto e as pastagens são de boa qualidade, a adição de concentrados em pequena escala leva a uma melhora substancial na reprodução. Portanto, em um país com tanta fartura de grãos e subprodutos, é ilógico não usá-los. Neste sistema Pouco Especializado o volumoso mais interessante para o inverno é a cana-de-açúcar, pois como os animais são de baixa aptidão, não há necessidade de alimentos mais nobres.
Mas existe um outro tipo de fazenda leiteira muito comum por aqui. Em busca de produtividade a pasto, muitos produtores desenvolveram um sistema Especializado. Este sistema abriga animais mais especializados e seu foco é a produção de leite com alta eficiência nos períodos do ano em que ele é mais bem pago. Geralmente, na seca, se valem de Dieta Total, como os americanos, à base de milho ou sorgo, misturado a concentrados e subprodutos, maximizando a produção por vaca. No verão por serem rebanhos mais especializados, não suportam a mesma provação que outros animais, buscando na pastagem sua fonte de nutrição exclusiva. Este sistema necessita uma suplementação concentrada mesmo no verão. O desafio é manter sob controle os custos no verão para não prejudicar os animais mais especializados. A vantagem deste sistema sobre o Pouco Especializado é conseguir uma escala de produção que remunere o trabalho com um menor número de animais e, conseqüentemente, com menos área, viabilizando projetos de pecuária leiteira em fazendas que não se prestariam ao sistema anterior.
Portanto, como se pode notar, no Brasil não existe um modelo de pecuária leiteira único. A diversidade de condições reflete em vários modelos, mas em todos eles temos que nos pautar pela necessidade da renda obtida, que deve remunerar o produtor pelo trabalho que desenvolve.