Por Marcello de Moura Campos Filho ¹

No artigo "Estabilidade do agronegócio do leite brasileiro: Prioridade para o crescimento do mercado interno ou para as exportações, eis a questão", defendemos que a prioridade deve ser dada para o crescimento do mercado interno, por entender que para absorver grandes excedentes de produção nos próximos anos, ser mais fácil vencer as dificuldades interna para fazer crescer o consumo per capita, do superar as dificuldades externas, em termos de eliminar subsídios e barreiras impostas por restrições tarifárias e sanitárias.

Volto ao assunto, abordando a questão do excesso de oferta no primeiro semestre de 2005 apontada como uma das causas da brutal queda de preços ao produtor que estamos vivendo.

Se compararmos os dados do IBGE da captação de leite do primeiro semestre de 2005 com o de 2004 nos principais estados produtores, veremos que enquanto São Paulo teve uma redução de 3,27 %, nos demais estados houve um violento crescimento: Rio Grande do Sul 23,14%, Santa Catarina 19,59%, Goiás 18,20%, Paraná 14,80%, Minas Gerais 12,42%.

Esse aumento de captação de leite nesses estados elevou a captação brasileira em 13,26% no período, provocando um aumento de oferta que certamente contribuiu para a queda dos preços aos produtores.

Não se pode esperar que para tentar manter preços ao produtor, São Paulo, onde não houve aumento de produção, absorva o excedentes desses outros estados, numa tentativa que certamente será infrutífera, pois causaria a ruína da pecuária de leite paulista, o que certamente os produtores de leite e o Governo de São Paulo não irão permitir.

Aliás, com o estudo "tomografia da cadeia do leite Paulista", que está sendo executado pelo PENSA/USP para a Câmara Setorial do Leite e Derivados de São Paulo visando caracterizar as ações estratégicas para revitalizar a pecuária de leite e a indústria paulista, e com o estudo de projeto de lei na Comissão de Agricultura e Pecuária de Leite da Assembléia Legislativa de São Paulo com vistas a dar suporte legal para as medidas necessárias para essa revitalização, estão demonstrando que o Governo e os produtores paulistas não permitirão o desmanche da produção e industrialização do leite no Estado de São Paulo. O Governo e os produtores de São Paulo sabem que o Estado será grande importador de leite e lácteos por muitos anos, mas sabem também que é preciso revitalizar sua pecuária de leite para garantir a geração de importante número de postos de trabalho permanentes no interior do Estado, seja através da atividade familiar no caso dos pequenos produtores, como nos empregos gerados pelos produtores maiores, que, na maioria dos casos, se caracterizam como pequenas ou micro empresas com faturamento bruto mensal não superando R$ 20.000,00 mensais.

É pois preciso aumentar o consumo interno de forma geral no País, principalmente em Minas Gerais, Goiás, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, estados que são grandes produtores de leite com consumo muito abaixo das suas produções.

Segundo notícia do suplemento Agropecuário do jornal "Estado de Minas", de 05/12/2005, Minas consome menos de 50% do que produz, e parece que começa a ser preocupação do Governo o aumento do consumo interno, tomando medidas para reduzir impostos sobre produtos e equipamentos bem como para incluir produtos lácteos na merenda das redes municipal e estadual de ensino.

É preciso que o Governo de outros estados, principalmente os que estão com produção bem acima de seu consumo interno tomem medidas para aumentar o consumo interno nos seus estados.

É importante a colaboração do Governo Federal com os Governos Estaduais e Municipais para viabilizar os programas de consumo de lácteos na merenda escolar das escolas, garantindo o acesso da população que não terá como consumir a quantidade necessária de lácteos.

Também é necessário que toda a cadeia produtiva do leite dê prioridade e trabalhe para aumentar o consumo interno para absorver esses excedentes de produção, principalmente nos estados onde o consumo por habitante está abaixo da média nacional, a qual já está muito abaixo do preconizado por organizações internacionais de saúde e pelo recém-publicado Guia Alimentar Para a População Brasileira do Ministério da Saúde.

Se os Governos e a cadeia produtiva do leite priorizarem o crescimento do mercado interno e o aumento do consumo per capita, estarão não apenas estabilizando o agronegócio do leite e garantindo empregos no campo, mas tendo um resultado adicional talvez mais importante, que é proporcionar melhores condições de saúde para a população brasileira, passo decisivo para um País melhor e mais desenvolvido.

Por isso, defendemos que a prioridade dos Governos e da cadeia produtiva deve ser o crescimento do mercado. Não desconhecemos a importância das exportações de leite para o País e para o setor leiteiro, apenas consideramos que, principalmente no médio prazo, seus resultados para o País e para o próprio setor leiteiro serão muito menores do que se poderá conseguir num esforço para aumentar o mercado interno.

Concluímos, parafeaseando uma citação bíblica para explicar nosso ponto de vista: procurai aumentar o consumo interno e a qualidade de vosso leite, que as exportações vos serão dadas por acréscimo.


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¹ Marcello de Moura Campos Filho é Presidente da Leite São Paulo