Um estudo conjunto entre pesquisadores brasileiros e alemães revelou que o uso eficiente da água na produção de leite está diretamente ligado à produtividade agrícola, ao manejo de dejetos e à gestão das rotinas nas fazendas. A pesquisa também avaliou os impactos das mudanças climáticas sobre a pegada hídrica do leite, indicador que mede todo o volume de água, direta e indiretamente, utilizado no processo produtivo.
O trabalho, intitulado How do production practices and climate change impact the water footprint of dairy farms?, foi publicado na revista internacional Science of The Total Environment.
O levantamento analisou 67 propriedades localizadas em Lajeado Tacongava, no Rio Grande do Sul, o que representa 81,7% das fazendas da bacia hidrográfica local. Dessas, 57 operam em sistema a pasto, sete são semi-confinadas e três totalmente confinadas.
Foram testadas 192 combinações entre boas práticas e cenários climáticos, avaliando a eficiência hídrica em cada tipo de sistema. A média obtida foi de 704 litros de água por quilo de leite corrigido para gordura e proteína, com variações entre 299 e 1.058 litros, conforme o manejo e o nível de produtividade.
Água verde, azul e cinza: os diferentes usos
A água verde corresponde à umidade natural presente no solo, usada na produção dos alimentos que compõem a dieta dos bovinos, como milho e forrageiras. A água azul vem de fontes superficiais e subterrâneas, utilizada na dessedentação dos animais, na limpeza e no resfriamento do leite. Já a água cinza representa o volume necessário para diluir poluentes, como nitratos provenientes dos efluentes utilizados como fertilizantes.
Segundo Julio Palhares, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste, as ações mais eficazes para reduzir a pegada hídrica incluem melhorar a produtividade de milho e soja, otimizar o uso de água na ordenha, tratar corretamente os efluentes e aumentar a produção de leite por vaca.
“O aumento da eficiência produtiva e o uso racional da água são fundamentais. Práticas simples, como o tratamento do efluente da ordenha e o manejo correto da limpeza, trazem resultados ambientais expressivos”, destaca Palhares.
Impactos do clima e desafios futuros
O estudo aponta que o aquecimento global tende a elevar a pegada hídrica verde e azul, devido ao maior consumo de água pelos animais e à queda na produtividade do milho. Em cenários simulados com aumento de até 2,5 °C na temperatura média, a pegada hídrica azul subiu entre 1% e 2%.
Mesmo com esse efeito climático, o desempenho produtivo continua sendo o fator mais determinante. Em sistemas confinados, a média variou de 562 a 950 litros de água por quilo de leite, reflexo da maior eficiência alimentar e produtiva das vacas.
Rumo à produção sustentável
As práticas que mais contribuíram para reduzir o impacto hídrico incluem:
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aumento de 25% nos rendimentos de milho e soja;
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redução do uso de água na ordenha;
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incremento de 1 litro de leite por vaca ao dia;
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tratamento adequado dos dejetos.
A água verde respondeu por quase 99% da pegada total do leite, evidenciando a importância da eficiência agrícola. Já a água cinza teve participação inferior a 0,1%, indicando baixo impacto de poluentes.
Para Palhares, aumentar a produtividade agrícola é uma estratégia eficaz no curto prazo, mas o avanço do aquecimento global pode limitar esses ganhos em regiões mais quentes. “É urgente investir em sistemas resilientes e integrados, capazes de garantir segurança hídrica e alimentar”, reforça.
Contribuição aos Objetivos da ONU
As conclusões do estudo estão alinhadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU — especialmente os que tratam de produção responsável (ODS 12), combate às mudanças climáticas (ODS 13) e agricultura resiliente (ODS 2).
Ao unir ciência e prática, a pesquisa mostra que o uso eficiente da água na produção de leite é não apenas possível, mas essencial para o futuro sustentável do agro brasileiro em um cenário de mudanças climáticas cada vez mais intensas.
As informações são do Canal Rural.