Muitas dúvidas surgem quando vamos analisar a viabilidade de produção de leite versus soja. Quais as considerações devem ser feitas para fazer uma comparação e chegar a uma conclusão válida? Leia as observações do engenheiro agrônomo Félix Fares sobre esse assunto:
A forma de análise aparentemente não apresenta grandes dificuldades nem segredos. Trata-se de simplesmente comparar as margens brutas esperadas dessas atividades e, com base nesse número pontual, de tantos pesos ou dólares por hectare, chegar à conclusão correspondente. Porém, creio que é necessário fazer vários esclarecimentos nesse sentido e, por vários motivos, os quais analisaremos ao longo desse artigo.
Para começar, quero citar um argumento dos agricultores: diante de uma eventual igualdade de margens brutas entre ambas as atividades (leite e soja), há que se considerar que o capital imobilizado, como máquinas, equipamentos, os gados, etc. no caso do leite é muito maior e isso leva também ao fato de a rentabilidade resultante, com margens brutas iguais, serem francamente menores no caso do leite, pois estes ativos sofrem depreciação ao longo do tempo, tendo que ser repostos para a manutenção da atividade (por exemplo, apesar da do animal apresentar custos de mantença, sua vida útil é limitada, portanto a "perda" do dinheiro investido na vaca deve ser considerada . Não me detenho ao capital terra imobilizado, porque ambas as atividades fazem isso, e a comparação se refere ao resultado que se obtém por hectare em cada uma delas.
Agora, sigamos analisando outros fatores, primeiro considerando a agricultura.
Toda generalização é ruim. Para começar, não corresponde analisar na comparação a atividade leite, mas sim, minha fazenda leiteira, esta em particular, com seu sistema de produção e seus resultados particulares. Para isso, é necessário contar com os números próprios, algo que às vezes não se têm em abundancia.
Na hora de analisar a fazenda leiteira, que não é um negócio pontual, é necessário ver os números de médio e longo prazo. E o mesmo para a agricultura.
Proponho, então, um interessante exercício: calcular a margem média que se obteve em sua fazenda leiteira nos últimos dez anos. Da mesma maneira, a margem obtida em sua agricultura de colheita nesse período. Ao falar de agricultura de colheita, nesse período de tempo aparecerão vários cultivos: não somente soja, mas também, outros como milho, girassol, sorgo ou trigo. Essa margem bruta obtida é o que reflete um sistema sustentável no tempo, onde aparecem outros cultivos, constituindo uma rotação, que é o que assegura que esse sistema agrícola possa ser replicado uma ou outra vez no tempo. Se nos dedicarmos à calcular a margem bruta média somente da soja, para depois compararmos com a fazenda leiteira, estamos abordando somente uma parte do sistema agrícola. Ou seja, estamos considerando o cultivo de maior margem bruta, mas que não se pode replicar indefinidamente no tempo, seguindo uma rotação de soja sobre soja uma e outra vez. Ao fazer esses cálculos, pode-se garantir que mais de um leitor chegará à grande surpresa ao ver os resultados obtidos, quando o esperável era uma clara vantagem das margens brutas da agricultura sobre o leite. Porque o fato de tomar esse período de tempo de dez anos nos permite comparar o retorno médio das atividades considerando todas as variáveis envolvidas no processo produtivo, que na agricultura varia muito devido à rotação de culturas e, de alguma maneira quantificar os riscos, especialmente climáticos, mas também de volatilidade de mercados que a agricultura enfrenta.
Isso quer dizer que a produção leiteira deve ser analisada partindo da premissa de que não se trata de um negócio de curto prazo. Salvando as distâncias, e como comentou há um tempo um agente da Bolsa que também tinha entrado no setor agropecuário, não se pode analisar o desempenho que teve um investimento de um cliente na Bolsa com base no que ocorreu no último ano, ou nos últimos dois ou três anos. O período de análise deve ser maior para ter um panorama completo.
Outro tema, e não menos importante, é que dentro da margem bruta normalmente se considera, para calcular o custo de oportunidade de capital imobilizado, que é o retorno que o produtor poderia obter em outra atividade ou investimento, caso utilizasse o capital para outra finalidade , um período de somente seis meses para a agricultura, enquanto que se considera um ano completo para o caso do leite. Isso já foi analisado anteriormente e concluímos que, com base na forma como está sendo feito o negócio da agricultura, com compras antecipadas de insumos no início do negócio e com venda diferida de grãos na outra ponta, o mais adequado é considerar a agricultura em um período de doze meses como imobilização de capital investido, assim como na produção leiteira.
A coisa não termina aqui, já que todavia faltam outros temas importantes a considerar. Com relação a isso, quero me referir à capitalização que se vai dando anualmente no caso da produção leiteira, pela evolução do capital gado. Essa evolução está referida a dois aspectos.
Por um lado, o crescimento em cabeças que vai ocorrendo pelo crescimento vegetativo. Naquelas fazendas leiteiras que conseguiram reduzir a mortalidade, especialmente na cria, mas também na recria e na produção, isso se reflete em uma diferença de inventário de gado (inventário final - inventário inicial) positiva. Está na estratégia de cada empresa ver como canalizar esse crescimento: seguir crescendo, em maior ou menor medida, e destinar o excedente às vendas.
Porém, tem também outro componente, o valor do gado de leite, que vem crescendo de forma sustentada através dos anos. Quer dizer que o efeito, tanto pelo crescimento das cabeças, como pelo valor das mesmas, é a capitalização do gado, que não é um tema menor. Recordemos que dentro do ativo às empresas, depois da terra, segue o gado como item de maior peso.
O fato de gerar um fluxo constante de rendimentos faz com que a fazenda leiteira forneça à empresa um oxigênio financeiro que, em muitos casos, não se tem quando se fala de agricultura.
Claro que ficam de fora dessa discussão de produção de leite versus de soja o arrendamento daquelas empresas leiteiras que se desenvolvem em solos de baixa potencialidade agrícola, porque, nesses casos, o custo de oportunidade, via rendimentos que se poderiam obter em cultivos de soja, se reduz consideravelmente, já que nestes solos a produtividade da soja seria muito inferior
Finalmente, quero me referir a que, na situação atual de preços baixos no caso do milho, a possibilidade que a fazenda leiteira de convertê-lo em leite, mas também em carne, faz com que esse milho, que na hora de vender teria encontrado um mercado com intervenção, deprimido severamente em sua margem bruta, tenha a alternativa de ser convertido, com o que se melhora notavelmente o negócio.
O artigo é do engenheiro agrônomo Félix Fares, para o Infortambo, traduzidos e adaptados pela Equipe MilkPoint.
Considerações sobre a rentabilidade de leite x soja
Muitas dúvidas surgem quando vamos analisar a viabilidade de produção de leite versus soja. Quais as considerações devem ser feitas para fazer uma comparação e chegar a uma conclusão válida? Leia as observações do engenheiro agrônomo Félix Fares sobre esse assunto.
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NÉUDE
ITUMBIARA - GOIÁS - PRODUÇÃO DE LEITE
EM 27/08/2012
É impossível comparar a rentabilidade de atividade leiteira e produção de soja, pois normalmente os produtores de soja são altamente profissionais, e produzem quantidades superiores a 50 sacas/ha, já a maioria dos produtores de leite são amadores e produzem menos de 5000 Litro de Leite/ha/ano, agora gostaria de ver a comparação com produtores de leite altamente profissionais com produtores de soja, aí sim, seria uma comparação justa, produtores de leite que produzem acima de 15000L/ha/ano. "O LEITE NÃO É RUIM, RUIM É O QUE FAZEM COM ELE." (Instrutor do Senar de Goiania).