Os sistemas integrados de produção agropecuária (SIPA) compreendem as áreas que se destinam ao cultivo de mais de uma cultura, sejam elas lavoura, pecuária e floresta. A combinação mais comum é a integração de lavoura e pecuária na mesma área, conhecida como ILP.
A ILP possui diversos arranjos, mas especialmente no sul do Brasil é bastante difundido o modelo de cultivo de grãos no verão (soja ou milho) e o cultivo de forrageiras no inverno. Nos sistemas leiteiros, a área muitas vezes é utilizada para pastejo no inverno, seguido pela produção de silagem de milho (e outras) no verão, ou até mesmo para produção de soja.
Neste cenário discutido acima (pastagem de inverno/lavoura de verão), faço a seguinte pergunta a você leitor: em qual momento do ano ocorre a maior exportação de nutrientes do sistema? Uma reflexão simples talvez seja suficiente para apontarmos que o momento da colheita dos grãos ou da silagem é o evento de maior exportação (o milho sai todo da lavoura e vai para o silo).
Ao considerar esta afirmação, qual seria o momento de realizar o maior aporte de fertilizantes na área? Uma resposta comum e disseminada poderia ser: “no plantio da cultura (imagine um milho para silagem), pois é ela que promoverá a maior exportação de nutrientes”. Embora possa parecer intuitiva essa ponderação, estudos realizados por diversos grupos de pesquisa no Brasil têm demonstrado que é possível posicionar a principal adubação do ano em outro momento, sem comprometer o rendimento da cultura de verão nos sistemas de ILP.
Esta estratégia de adubação invertida consiste na aplicação dos fertilizantes no momento temporal mais distante do maior evento de exportação de nutrientes, leia-se, a colheita da cultura de verão. Essa prática está fundamentada no conceito de que quanto antes o nutriente for inserido no sistema, maior é a probabilidade deste nutriente ser utilizado mais de uma vez pelo sistema solo-planta-animal, ou seja, a ciclagem do nutriente é maior e isso torna possível uma otimização do seu uso.
Como isso ocorre? Imaginemos que o nutriente Fósforo esteja disponível no solo, uma vez que a planta o absorva e o utilize para síntese de novos tecidos, folhas por exemplo, este nutriente estará passível de ser consumido pelos animais. Uma vez que consumido, a maior parte dos nutrientes são reciclados pelo animal, ou seja, retornam ao sistema por meio de fezes e urina. Uma vez que isso ocorra, o nutriente novamente poderá ser utilizado pelas plantas (no momento ou posteriormente).
Nesse contexto, concentrar a adubação na semeadura e cobertura da pastagem significa prover “combustível” para o crescimento das plantas, logo, maiores taxas de crescimento permitem maiores taxas de lotação e maior produção animal. Ao mesmo tempo, a maior parte destes nutrientes retornam ao solo por meio da excreta animal ou da deposição das folhas senescentes do pasto, o que os torna passível de serem absorvidos pela planta do milho, por exemplo, sem comprometer seu desempenho.
Para dar números a essa conversa, um bovino de corte de 450 kg possui em sua composição corporal aproximadamente 3 kg de fósforo (Ball et al., 1991). Uma fazenda leiteira que produz à base de pasto 20.000 litros de leite/ha/ano exporta via leite apenas 20 kg/ha/ano de fósforo, ou seja, os nutrientes permanecem, em sua maioria, no sistema solo-planta-animal. Feita esta linha de raciocínio, resultados positivos já foram encontrados na aplicação da adubação invertida para os nutrientes N (Soares et al., 2023), P (Farias et al., 2020) e K (Farias et al., 2020; Soares et al., 2023).
Ressalvas: algumas considerações são importantes nesta prática:
- Este conceito não é aplicável para áreas que realizam corte da forragem (feno, silagem etc.), tampouco para sistemas em que os animais permanecem um curto período no pasto e concentram a maioria de suas excretas fora dos piquetes.
- É recomendado que os níveis de P e K na área sejam altos, para evitar riscos de comprometimento da produção.
Questionamento: é adequado adotar este manejo em toda a área da propriedade e inverter toda a adubação? Embora não se tenham limitações para isso, não é uma regra, comece devagar, faça a prática em uma parte da área da propriedade (com os maiores níveis de fertilidade), ou então parcele a adubação, metade em cada evento de semeadura (50% no pasto de inverno, 50% na semeadura do milho para silagem). Se funcionar (aposto minhas fichas que sim) talvez seja uma prática para ser consolidada na propriedade, caso contrário, apenas uma parte da área foi utilizada para teste.
Já usa essa “tecnologia”? Compartilhe conosco sua experiência com adubação em pastagem, escreva nos comentários. Quer saber mais sobre este tema? Acesse o episódio que tratamos disso no MaisRúmen Podcast.
Ball, D. et al. Southern forages. Atlanta: Postash & Phosphate Institute, 1991.
Farias, G. D. et al. Integrated crop-livestock system with system fertilization approach improves food production and resource-use efficiency in agricultural lands. Agronomy for Sustainable Development, v.40, n.39, 2020.
Soares, A. B. et al. Nitrogen and potassium fertilization strategies in integrated systems in different black oat management on corn crop. Scientia Plena, v.19, n.050201, 2023.