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Como a distocia afeta a saúde e a sobrevivência de bezerros?

POR CARLA MARIS MACHADO BITTAR

CARLA BITTAR

EM 17/05/2007

12 MIN DE LEITURA

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Introdução

A Distocia ou os partos distócicos são definidos como partos atrasados ou difíceis. Embora não existam estatísticas nacionais, a distocia acomete vários rebanhos leiteiros, resultando em mortalidade de bezerros e redução na produção de leite das vacas. Um grande levantamento demonstrou que vacas primíparas e multíparas apresentaram taxa de distocia de 28,6 e 10,7%, respectivamente, demonstrando que os partos distócicos são mais freqüentes em animais de primeira cria (Meyer et al., 2002).

Os efeitos fisiológicos da distocia são bastante conhecidos, sendo a hipoxia e a acidose sanguínea problemas comuns em bezerros resultantes de partos com algum grau de distocia. Estes efeitos por sua vez podem resultar em morte imediata ou reduzir a sobrevida do animal recém-nascido. Bezerros submetidos a longos períodos de hipoxia, mas que sobrevivem, são normalmente mais fracos e lentos para levantar e mamar. Estes efeitos afetam de forma negativa a absorção de imunoglobulinas e a regulação da temperatura corporal.

A distocia é ainda uma causa potencial de traumas, afetando a função do sistema cardiopulmonar, especialmente quando força excessiva é utilizada durante o parto. Assim, os partos distócicos podem afetar os bezerros de forma negativa através de vários processos.

Meyer et al. (2002) definiu como natimorto o bezerro morto antes, durante ou 48h após o parto. Estes autores observaram que novilhas de primeira cria geram mais natimortos (11%) do que vacas multíparas (5,7%) e que metade dos natimortos ocorriam em resposta a partos distócicos. A outra metade ocorria em resposta a partos não assistidos.

Outro trabalho destes autores (Meyer et al., 2001) demonstrou que um leve problema de parto aumenta a chance de bezerro natimorto em 2,9% em novilhas e 4,7% em vacas. Para partos mais difíceis, novilhas são 6,7 vezes mais propensas a gerar um natimorto, enquanto vacas são 11,3 vezes. Este trabalho também demonstrou que o sexo do bezerro pode afetar a taxa de natimorto, sendo machos filhos de novilhas os de maior chance de ser natimorto.

Embora não existam estatísticas nacionais a este respeito, produtores americanos reportam que 8,7% das bezerras nascidas vivas morrem antes do desaleitamento (USDA, 2002). Alguns trabalhos demonstram que a severidade da distocia tem efeito direto na sobrevivência e saúde subseqüente da bezerra.

Com base nos dados apresentados sobre a incidência de distocia em rebanhos e seu esperado efeito negativo sobre a saúde e a sobrevivência de bezerras, a distocia deveria ser um tópico de grande preocupação para produtores. Assim, Lombard et al. (2007) realizaram estudo para determinar a incidência de natimortos e de mortalidade e morbidade de bezerras, e sua relação com partos distócicos.

Material e Métodos

Foram acompanhadas três fazendas com tamanho de rebanho entre mil e cinco mil vacas. A maior parte (95%) das vacas incluídas no estudo foram Holandesas. O escore de distocia foi baseado no nível de assistência dado durante o parto, conforme Tabela 1. Entretanto, após a análise dos dados, os escores 4 e 5 foram associados ao escore 3 e considerados como distocia severa.

Tabela 1:

 


Adaptado de Lombard et al. (2007)

Os partos ocorreram em piquetes maternidade, sendo todas as vacas alimentadas com ração completa durante o estudo. Os bezerros recebiam 3,8 L de colostro dentro das 12 primeiras horas após o nascimento e leite até o desaleitamento. Durante a fase de aleitamento os bezerros foram alojados em casinhas individuais, sendo agrupados em piquetes com 10 a 15 animais após o desaleitamento.

Para cada parto ocorrido foram anotadas informações como: data do parto, incluindo estação; paridade da vaca; escore de distocia; sexo do bezerro; status do bezerro (vivo vs. morto, sendo que morte até 24h foi considerado natimorto); número de bezerros (1 vs. gêmeos); identificação do bezerro. Mortes de bezerras foram consideradas quando animal morreu até 120d de idade. O total de mortes inclui natimortos e mortes até 120 dias. Os machos e os gêmeos foram vendidos e, portanto não foram acompanhados até os 120 dias. Todos os problemas de saúde foram anotados.

Resultados

Um total de 7.788 bezerros, provenientes de 7.380 partos foram monitorados. A maioria dos bezerros (63,4%) nasceu sem necessidade de assistência, recebendo escore de distocia 1, enquanto 25,8% receberam escore 2 (Tabela 2). O escore de distocia foi fortemente associado com a fazenda, demonstrando que existem efeitos não relacionados aos animais que interferem na taxa de distocia.

Como esperado, os escores de distocia foram diferentes conforme a paridade da vaca. Aproximadamente metade dos bezerros nascidos de novilhas de primeira cria (48,8%) nasceram sem necessidade de assistência, enquanto 18,9% foram classificados como distocia severa. Por outro lado, em 70,6% dos partos de multíparas não houve necessidade de assistência, enquanto apenas 6,9% foram classificados como distocia severa.

Dos 7.788 bezerros nascidos, 11,1% foram gêmeos. Bezerros gêmeos foram mais propensos a ter intervenção durante seu nascimento. Mais da metade dos partos gemelares (56,7%) exigiu auxílio enquanto em somente 34,1% dos partos simples a assistência foi necessária.

O sexo dos bezerros também foi altamente associado com o escore de distocia, sendo os partos de machos mais propensos a exigir auxílio que os de fêmeas. Dos partos de fêmeas 67% ocorreram sem intervenção, comparado a 60% de partos de machos.

A incidência de natimortos para todos os bezerros foi de 8,2%, sendo esta taxa aumentada conforme se aumentou o escore de distocia. A paridade da vaca também foi associada à taxa de natimorto. O total de fêmeas e machos nascidos de primíparas apresentaram % de natimorto de 9,9 e 15,2%, respectivamente. Entretanto, multíparas tiveram menor chance de parir natimortos, apresentando uma taxa de 4,5 para fêmeas e 7,5% para machos. A taxa de natimorto foi maior para machos (10%) do que para fêmeas (6,3%).

Tabela 2. Porcentagem de bezerros por fazenda, paridade da vaca, sexo do bezerro e status ao nascimento de acordo com o escore de distocia.

 


A Tabela 2 apresenta para a % de natimortos, a taxa de mortalidade e de problemas de saúde dos bezerros de acordo com as variáveis estudadas e o grau de distocia observado durante o parto. A chance de ocorrer um natimorto aumentou com o escore de distocia. De maneira geral, bezerros provenientes de partos com grau 2 ou 3 de distocia tiveram 2,3 e 15,4 mais chance de ser um natimorto, respectivamente, quando comparados a bezerros nascidos de partos sem necessidade de assistência.

Vacas primíparas apresentaram chances de parir um natimorto 1,7 vezes maior que multíparas. Fêmeas provenientes de partos com escore de distocia 2 ou 3 tiveram 2 e 20,7 vezes maior chance de ser natimorto que fêmeas nascidas de parto sem necessidade de intervenção. Para partos com distocia severa, fêmeas tiveram maiores chances de ser natimorto que machos. Bezerros nascidos de multíparas e expostos a distocia severa tiveram maior chance de ser natimorto que aqueles nascidos de primíparas também expostos a distocia severa.

As chances de fêmeas apresentarem qualquer evento relacionado à morbidade foram significativamente maiores para escore de distocia 2 e 3. Bezerras nascidas de primíparas tiveram menor chance de apresentar morbidade comparada a bezerras nascidas de multíparas. A estação de nascimento também foi altamente correlacionada com a morbidade: nascidas no inverno e primavera tiveram maior risco de apresentar morbidade quando comparadas àquelas nascidas no outono; e aquelas nascidas no verão tiveram menor risco que aquelas nascidas no outono.

Tabela 3. Número e porcentagem de bezerros de acordo com o escore de distocia, paridade da mãe, estação de nascimento e sexo do bezerro para cada variável resposta.

 


Discussão

As três principais causas de distocia são a inadequada relação de tamanho materno-fetal, o mau posicionamento do bezerro e causas relacionadas especificamente a mãe. A incidência de distocia em primíparas é mais comumente devido ao tamanho inadequado do bezerro, enquanto em multíparas está mais relacionada ao mau posicionamento do bezerro e problemas com a vaca.

A observação de que 24,5% dos natimortos ocorreram após partos sem assistência pode sugerir que a freqüência de observação do piquete maternidade e a aplicação de estratégias de intervenção durante os partos podem ser inadequados. Os funcionários das fazendas foram orientados e treinados por veterinários, mas é difícil saber se as intervenções foram necessárias e se foram realizadas de forma adequada.

O grande efeito negativo que os partos distócicos têm na saúde e na sobrevivência de bezerros, associado ao efeito na vida produtiva futura destes animais, deveria fazer com que o manejo de vacas pré-parto e do parto propriamente dito fosse uma das prioridades em fazendas leiteiras. Os resultados observados por um levantamento americano mostram taxas de distocia muito menores do que as observadas no presente estudo demonstrando que muitas vezes a ocorrência não é sequer anotada. Parece plausível afirmar que se a distocia não é monitorada por fazendas leiteiras, também não é considerada uma prioridade de manejo.

A redução no número de animais que exigem auxílio durante o parto e métodos que reduzam distocia devem ser objetivos em sistemas de produção de leite. Para alcançar estes objetivos, alguns aspectos precisam ser implementados. Uma vez que primíparas têm maior freqüência de distocia, deve-se assegurar que estes animais sejam inseminados em idade e peso apropriados, considerando também a escolha de sêmen com adequada facilidade de parto (calving ease). O melhor treinamento de pessoal a respeito do momento certo para a intervenção, além de cuidados adequados com o bezerro proveniente destes partos, deve reduzir os efeitos da distocia.

Uma interação significativa foi observada entre paridade e bezerros expostos a severa distocia de modo que distocia severa em multíparas resultou mais facilmente em natimorto do que primíparas. Isso pode ser um efeito do mau posicionamento do bezerro em multíparas como causa mais freqüente de distocia em comparação ao inadequado tamanho do bezerro como causa freqüente em primíparas. O mau posicionamento do bezerro é tecnicamente de difícil solução podendo aumentar as chances de natimorto.

O sexo do bezerro também teve grande efeito na taxa de natimorto. A proporção de machos natimortos foi 2 vezes maior que a de fêmeas. Embora o peso ao nascer dos bezerros não tenha sido monitorado, é sabido que machos têm maior peso ao nascer que fêmeas. Maior peso ao nascer pode significar tamanho inadequado, resultando em aumento na chance de distocia, principalmente em primíparas.

Entretanto, neste estudo não foi possível determinar se os machos considerados como natimortos nasceram mortos, morreram logo após o nascimento ou dentro do período de 24h. Uma vez que machos tem menor valor em fazendas leiteiras é possível que estes animais não tenham recebido cuidados adequados logo após o nascimento, o que também pode aumentar a taxa de natimorto.

Uma vez que a distocia tem efeitos negativos na adaptação do bezerro à vida extra-uterina, bezerros provenientes de partos distócicos requerem cuidados adicionais. Os principais problemas observados nestes animais são trauma e asfixia, o que pode resultar em acidose respiratória e metabólica, hipoxemia, falha na transferência passiva e hipotermia. O treinamento de funcionários deve objetivar a redução dos impactos da distocia com métodos apropriados para intervenção ou não nos partos, identificação de bezerros comprometidos, administração de fluídos e oxigênio para bezerros com acidose, aquecimento de bezerros com hipotermia e fornecimento imediato de colostro de boa qualidade. É possível que parte dos animais provenientes de partos distócicos possam ser salvos pela implementação destas práticas de manejo.

Os efeitos da distocia foram observados até 30 dias após o nascimento dos bezerros. Entretanto, é possível que nem todos os animais tratados estivessem realmente doentes uma vez que funcionários das fazendas realizavam o diagnóstico. Outros fatores além da distocia também podem ter afetado a saúde dos animais como falha na transferência de imunidade passiva, programa de alimentação e tipo de instalações.

Conclusões

A ocorrência de distocia nas três fazendas foi fortemente associada com o aumento na morbidade e na mortalidade de bezerros recém nascidos. Programas de treinamento para funcionários no que se refere ao manejo e estratégias para redução de distocia e de seus efeitos na saúde de bezerros devem ser priorizados. O ganho financeiro da redução dos efeitos de distocia versus o custo da implementação destas práticas deve ser avaliado. Intervenções relativamente simples, utilizando-se tecnologia já existente, têm grande potencial para a redução significativa dos impactos da distocia em sistemas de produção de leite.

Referências

Lombard, J. E.; Garry, F. B.; Tomlinson, S. M.; Garber, L. P. Impacts of Dystocia on Health and Survival of Dairy Calves J. Dairy Sci. v.90, p.1751-1760, 2007.

Meyer, C. L.; Berger, P. J.; Koehler, K. J.; Thompson, J. R. ; Sattler, C.G. Phenotypic trends in incidence of stillbirth for Holsteins in the United States. J. Dairy Sci. v.84, p.515-523, 2001.

Meyer, C. L.; Berger, P. J.; Koehler, K. J. Interactions among factors affecting stillbirths in Holstein cattle in the United States. J. Dairy Sci. v.83, p.2657-2663, 2000.

Comentários

De maneira geral, o acompanhamento de partos deve ser realizado com cautela, evitando-se tracionar o bezerro em ocasiões desnecessárias. O acompanhamento do parto deve ser feito com visitas freqüentes ao piquete maternidade, monitorando-se o rompimento da primeira e segunda bolsa e o aparecimento das patas dianteiras e do focinho do bezerro. O não aparecimento destas estruturas pode refletir o mau posicionamento do bezerro, o que então exige intervenção. Entretanto, o momento adequado para a intervenção no parto dos animais deve ser definido pelo veterinário do rebanho, o qual deverá treinar funcionários para a realização do tracionamento e dos cuidados com os bezerros provenientes dos partos distócicos.

Além de reduzir intervenções desnecessárias, práticas de manejo como inseminação de novilhas em peso e idade adequada, utilização de sêmen com adequados valores de facilidade de parto, adequado manejo de vacas e novilhas pré-parto no que se refere principalmente aos programas de alimentação, devem reduzir as taxas e o grau de distocia.

Mesmo frente a importância e o impacto negativo dos partos distócicos, as intervenções desnecessárias durante o parto de animais leiteiros são muito comuns. O tracionamento dos animais utilizando-se material não higienizado e sem técnica adequada resulta em efeitos negativos na saúde e na sobrevida de bezerros neonatos, como demonstrou o trabalho. O grau de distocia está fortemente associado a taxa de natimorto, representando grande perda econômica para o rebanho não só devido a morte do bezerro mas também por que invariavelmente resultará em menor produção de leite da vaca em início de lactação e maior gasto com medicamentos.

CARLA MARIS MACHADO BITTAR

Prof. Do Depto. de Zootecnia, ESALQ/USP

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ANA CAROLINA DE ARRUDA CAMARGO

RIO DE JANEIRO - RIO DE JANEIRO - PRODUÇÃO DE LEITE

EM 02/01/2015

Olá Carla. Muito bom este artigo. Você saberia indicar algum profissional que trabalha com capacitação de funcionários para diminuir os partos distócicos? Sei que a recomendação é para que o veterinário da propriedade o faça, mas gostaria de alguém especializado, já que este é um tema bastante delicado. Trabalho em uma propriedade leiteira que faz muitas intervenções em partos, por ter um histórico de perda de bezerras em partos não assistidos. Porém, acredito que pelo medo de perder novas bezerras, muitas intervenções são feitas e acredito que, em algumas vezes, sem necessidade. Fico no aguardo da sua resposta, obrigada, Ana.

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