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Os índices de produtividade rural e a reforma agrária

ESPAÇO ABERTO

EM 15/04/2005

5 MIN DE LEITURA

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Por Helton Perillo Ferreira Leite1

Há um projeto em andamento no Governo Federal brasileiro propondo o aumento dos índices mínimos de produtividade rural para fins de reforma agrária. Em decorrência desta elevação, deve aumentar o estoque de propriedades rurais passíveis de serem desapropriadas por não atingirem tais mínimos. A justificativa seria ajustar os novos índices de produtividade às novas tecnologias de produção.

A produtividade é encontrada dividindo a produção pela área ocupada. É uma conta fácil; seria adequada? Esta deve ser uma análise técnica, objetiva, livre de ideologias e crenças. Vou tentar fazer assim. Em primeiro lugar devemos lembrar que estamos todos no mesmo barco, grandes e pequenos agricultores, grandes e pequenos pecuaristas, agricultura empresarial e familiar, plantadores de soja e alface, criadores de frango ou de nelore, veterinários e agrônomos, vendedores de adubos e tratores, beneficiadores de arroz e fabricantes de queijo, padeiros e açougueiros, feirantes e donos de supermercados.

Estamos todos no mesmo barco, produzimos comida, madeira, combustíveis, fibras, couro e até flores. Somos os responsáveis por cerca de 40 % das exportações, do PIB e dos empregos brasileiros. Em 2004 o saldo líquido do comércio exterior brasileiro foi de R$ 36,6 bilhões, sendo R$ 34 bilhões o saldo do agronegócio (R$ 39 bi exportados menos R$ 4,8 bi importados) ou 93% do saldo comercial líquido. Isto mesmo, 93% do saldo comercial brasileiro em 2004 foi decorrente do nosso trabalho e apenas 7% (R$ 2,6 bilhões) foi originário daquela parte da economia brasileira que está fora do agronegócio. Estamos ou não no mesmo barco?

Questiona-se nossa eficiência, mas a produção rural cresceu mais que a população, embora proporcionalmente a população rural tenha diminuído muito: nos anos 70 produzíamos cerca de 611 kg de grãos para cada brasileiro, hoje são 661 kg; antes criávamos 0,67 bovino para cada habitante, hoje já criamos 1,08; nem vamos falar dos frangos, suínos, flores, combustíveis, papéis, etc.

Fala-se em adotar índices que reflitam a incorporação da moderna tecnologia de produção rural. Seria a agricultura de precisão com uso de GPS, plantio direto, colheita mecanizada, adubação química, calagem, sementes mais produtivas, rações de alto potencial, animais de melhor carga genética, máquinas e equipamentos mais eficientes, etc? Quanto custam tais tecnologias? Todos têm acesso a elas? Elas são adequadas a qualquer local? Não dependem do solo? Do clima? Do produtor?

Não existe mais no país um sistema eficiente de divulgação da tecnologia rural. O simples conhecimento da tecnologia não está disponível para todos, O acesso é caro, é preciso pagar. Todos podem? O projeto, da forma como está sendo divulgado, fará um nivelamento "por cima" dos produtores. Deverão ser exigidas metas mínimas elevadas, algumas muito elevadas, outras muito acima da média regional. Pergunta-se: o produtor rural não tem o direito de não ser tão capaz quanto os melhores da região? Não pode ele ser menos eficiente? O industrial pode, o comerciante pode, o professor pode, o político pode, o médico pode. O produtor rural não? Será que o produtor menos eficiente sobreviverá às exigências atuais do mercado? Não seria aceitável que o próprio mercado decidisse sobre sua permanência? Porque empurrá-lo para fora?

Grande parte da tecnologia que permite altas produtividades só é viável para produções em larga escala, criticadas como antiecológicas ou antinaturais. Aquelas exigências prejudicarão os pequenos produtores, a produção familiar e até os assentados de programas da reforma agrária. Argumentarão que para os pequenos basta o associativismo, o cooperativismo, em grupo eles terão acesso a máquinas mais produtivas (leia-se mais caras) que se tornarão viáveis com seu uso intensivo. Mas deve-se lembrar que as primeiras cooperativas criadas no Brasil foram as de leite, mesmo assim apenas 40 % do leite produzido aqui é processado por elas, enquanto que no resto do mundo isto gira entre 80 e 90%.

Lá fora, o sistema protege o cooperado e sua cooperativa, aqui ninguém liga. Seria diferente amanhã? Alta produtividade geralmente implica em alto índice de mecanização, que estimula o desemprego rural. Quanto maior a máquina, menor o uso de mão de obra. Quanto mais sofisticada a tecnologia, maior a exigência em escolaridade. Como estão nossas escolas rurais? Vamos importar mão de obra?

Não basta atingir índice de produtividade, é necessário saber sobre lucratividade, sobre viabilidade financeira. Teoricamente é possível obter altíssimas produtividades do milho, da soja ou da vaca. Será isto economicamente interessante? É preciso buscar rentabilidade, lucro. De nada adianta 10 bois por hectare, ou 5.000 kg/ha de soja se não der lucro. E isto é variável ao longo do tempo, os insumos tem seus preços alterados em taxas diferentes dos produtos. Assim, é possível que uma certa produtividade seja interessante em 2004 e não o seja em 2005. Tudo depende do quanto ela é rentável. Altíssima produtividade não significa alto lucro, em geral muito pelo contrário.

No Brasil existe um sistema de classificação do solo baseado em sua capacidade de uso sustentável. Não se trata de modismo ecológico, é um conceito antigo, na agronomia sempre se pensou em conservação do solo. A exigência de altos níveis produtivos nem sempre respeita a capacidade produtiva do solo, ou do ambiente. Para garantir alta produtividade é esperável o uso de mais adubos químicos, de mais agrotóxicos, etc. Seria isto interessante para o ambiente? Seria sustentável para todos os solos? Erosão, assoreamento dos rios e enchentes são sintomas do uso intensivo e inadequado do solo. O solo é uma entidade viva, formado a partir da decomposição das rochas. Incrivelmente velho, é comum solo com alguns milhões de anos. Parte do cerrado brasileiro tem cerca de um bilhão de anos, sim um bilhão, com B de bola. Merece mais respeito, não pode o bicho homem que vive menos de 100 anos decidir sobre a vida desta entidade. Como ficarão os produtores orgânicos (aqueles que não usam química artificial)? Eles não estão buscando alta produtividade, mas sim alta qualidade do produto e sustentabilidade da produção.

Serão eles prejudicados? O boi orgânico ou o boi verde, alimentados a pasto, deverão ter sua alimentação alterada e ficarem suscetíveis à "vaca louca"? (vaca louca é uma doença que atinge bovinos alimentados com rações com resíduos animais). As aves e suínos em alto índice de confinamento também podem ser vulneráveis a novas doenças como a "gripe do frango". O mesmo se dá com as plantas; quanto maior a exigência em produtividade maior o risco sanitário e maior a necessidade por artificialidades. Transgênicos e clones são tecnologias modernas que tentam aumentar a produtividade. O caminho correto seria mesmo exigir alta produtividade para todos? A qualquer custo? Ambiental? Sanitário? Econômico? Não haveria outras opções mais adequadas? Alega-se que os índices são antigos, tem cerca de 30 anos, estariam defasados. Será que o método de aferição baseado em rendimento em peso por área também não estaria defasado? Pouco abrangente, não seria por demais simplista?

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1Helton Perillo Ferreira Leite é Eng. Agrônomo

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