Apesar desse quadro positivo, muitos produtores se mostraram insatisfeitos. Basicamente, dois fatores contribuíram para essa insatisfação. Primeiro, apesar da elevação de preços ao produtor, a fatia porcentual que fica com o setor primário encolheu, principalmente ao se comparar com o leite UHT, que foi o produto que mais subiu. No entanto, há que se considerar que o preço pago pelo leite destinado à produção de UHT provavelmente foi superior à média nacional. O gráfico abaixo mostra, até maio, a distribuição porcentual entre os elos considerando-se o leite UHT. É importante lembrar que o mix dos principais produtos lácteos inclui também leite em pó e queijos, que subiram bem menos, de forma que a comparação com o UHT não é de todo correta. Contudo, como é o produto que mais varia e que puxa o mercado, a comparação é imediata.
Gráfico 1. % do valor do leite UHT distribuída entre produtor, indústria e varejo.

Outro fator que condiciona essa insatisfação relativa do produtor é que agosto começou sob boatos de que os preços cairiam em um espaço de tempo mais curto do que o normal. A razão disso foi o retrocesso nas cotações do UHT no atacado e no varejo, o que já era previsto: preços muito altos desestimulam o consumo e estimulam a oferta desse produto.
Mesmo assim, segundo enquete feita pelo MilkPoint, as expectativas para agosto variaram muito dependendo da região e das estratégias específicas de laticínios, de forma que 40% dos consultados apostavam em estabilidade, 36% em queda e 32% em aumento das cotações para o leite pago em agosto.
Quando os preços pagos aos produtores são analisados descontando-se o efeito da inflação (utilizando para isso o IGP-DI), observa-se que, em julho, os valores praticados em 2007 e 2009 são muito próximos. Nesta mesma comparação, os custos de produção em julho, também deflacionados, estão abaixo dos custos evidenciados no mesmo período de 2008, e próximos aos aplicados em 2007. O índice Receita menos custo da ração (RMCR), elaborado pelo MilkPoint (considerando uma vaca com produção média de 20Kg de leite/dia), mostra-se desde janeiro, e de forma crescente, mais favorável aos produtores.
Gráfico 2. Preços ao produtor (R$/litro), corrigidos pelo efeito da inflação.

Gráfico 3. Receita menos custo de ração (R$/vaca/dia, corrigidos pelo efeito da inflação).

A oferta de leite está abaixo do verificado em 2008. Segundo o Cepea, em junho se produziu 4,9% menos leite do que no mesmo mês de 2008. Até o fechamento deste artigo, não tínhamos os dados de julho, mas é provável que a diferença tenha diminuído. O início da safra no sul do país não veio com a intensidade que normalmente é esperada. Chuvas e frio intenso prejudicaram o desenvolvimento das pastagens, refletindo no atraso da retomada da produção. Em contato com o MilkPoint, o Coordenador de Produção Pecuária da Castrolanda, (Castro-PR, sistema pertinente às Cooperativas Castrolanda e Batavo), Rogério Marcus Wolf, informou que a produção de leite na região de captação do Pool de Leite ABC, em julho de 2009, foi 2,5% menor do que julho de 2008, tendo como fatores o desestímulo por parte dos produtores (em razão dos custos altos desde o início de 2008 e preços baixos), seca no início do inverno, com redução da disponibilidade de forragens, e fortes chuvas no decorrer do inverno, comprometendo o pastejo e o corte das forragens. Na opinião de Wolf, a produção não deverá aumentar mais que 5% até o pico da safra, em setembro.
Nesse contexto, justifica-se a opinião dos leitores participantes da enquete em relação à estabilidade de preços para o pagamento do mês de agosto. Contudo, para o pagamento de setembro (referente ao leite entregue em agosto), a maioria dos leitores fala em queda de preços. É importante salientar que a enquete MilkPoint não tem o objetivo de quantificar opiniões com rigor estatístico, apenas mostra a opinião dos leitores sobre o assunto.
O recuo dos preços do leite longa vida no varejo é visto como principal motivo da estabilidade e até leve queda de preços para este pagamento, na opinião dos leitores. De acordo com o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, elaborado pelo IBGE), houve redução no ritmo de alta do leite pasteurizado (onde o IBGE inclui o leite UHT), que caiu de 12,1%, em junho, para 4,02% no mês passado. No mês de agosto, já são reportados valores bem abaixo dos praticados em julho. De acordo com agentes consultados pelo MilkPoint, os preços no atacado no mês de agosto devem ficar entre R$ 1,40 e R$ 1,60/litro. No varejo, em pesquisa realizada pelo MilkPoint em Piracicaba-SP, a média de preços do leite longa vida na 1ª quinzena de agosto ficou em R$ 2,15/litro, queda de 6,8% em relação ao preço médio de julho. Os preços dos queijos também sinalizaram queda - no atacado, os preços da mussarela estão entre R$ 8,00 e R$ 9,50/Kg, de acordo com as fontes consultadas. Vale a consideração que, com o prolongamento do período de férias - em função das medidas preventivas contra a nova gripe, H1N1 - o consumo do leite UHT foi mais baixo, segundo informações do setor, o que pode resultar no menor giro do produto no varejo e, consequentemente, redução dos preços.
No cenário internacional, agosto iniciou com sinal positivo no leilão da Fonterra. Após 3 meses consecutivos de queda, o preço médio para todos os produtos e períodos contratuais para o leite em pó (WMP) foi de US$ 2.301 por tonelada, valor 25,8% superior ao do leilão anterior, realizado em 1º de julho. Apesar da reação positiva do mercado, o panorama ainda é de instabilidade no cenário mundial, com opiniões divergentes sobre os preços nos meses seguintes. Na Oceania e na União Europeia, os preços de exportação mostraram leve alta, sendo o leite em pó integral negociado, em média, a US$ 2.700/ton no Oeste da Europa.
A intensidade da produção de leite no Sul, o comportamento do mercado do leite longa vida e a manutenção do controle sobre as importações de leite da Argentina e Uruguai (além das licenças não automáticas que freiam a entrada de leite de outros países) serão os balizadores de preço para o próximo mês. Se o mercado do leite UHT permanecer ajustado e a produção do Sul realmente não alcançar o pico de produção previsto, preços estáveis ainda poderão ser praticados em algumas regiões no próximo mês, ajustando os custos e receita dos produtores. Vale lembrar, finalmente, que algumas regiões do Centro-Oeste e Sudeste já reportam aumento da produção, esperado em função da melhoria de preços.