Se observarmos os valores pagos em janeiro em comparação com o valor de pico no ano anterior (Gráfico 1), é possível verificar que, neste ano, assim como já havia ocorrido no ano passado, o preço recebido pelo produtor, em média, pouco se alterou. Antes do início da safra, os agentes de mercado apostavam em reduções médias entre R$ 0,10 e R$ 0,15/litro, o que não se confirmou: a queda ficou restrita à metade deste valor, se considerado o valor de pico menos o preço de janeiro.
Aliás, abrindo um parênteses, é interessante notar que, nos últimos 8 anos, em quatro deles a queda na chamada safra foi modesta, indicando que o comportamento histórico de preços pode não ser mais a referência para o comportamento atual e futuro, ainda que seja cedo para falarmos em uma tendência.
Gráfico 1: Valor pago em janeiro em relação ao valor mais alto pago no ano anterior (Fonte: MilkPoint, a partir de dados do Cepea/USP)
Mesmo que alguma redução nos preços do leite ainda apareça, as baixas serão discretas. Os Conseleites dos três estados do Sul, por exemplo, projetaram reduções no preço de janeiro de apenas 3% (Paraná) e 1% (Santa Catarina e Rio Grande do Sul) - leia matéria relacionada.
Considerando ainda que o pior já passou (férias escolares e o pico de produção que via de regra cai nos meses de dezembro e janeiro), pode-se afirmar que a safra transcorreu sem sobressaltos, com preços historicamente elevados, como pode ser observado no gráfico 2, que traz os valores já corrigidos para a inflação.
Gráfico 2. Preços ao produtor, corrigidos pela inflação (Fonte: MilkPoint, a partir dos dados do Cepea/USP).
A principal explicação para esse comportamento reside na oferta de leite em 2011, principalmente no quarto trimestre. Embora não tenhamos os dados oficiais do IBGE para a captação formal, se utilizarmos os valores conhecidos até setembro e aplicarmos a variação nos meses seguintes estimada pelo Cepea, chegaremos a um modesto aumento de 1,7% na produção inspecionada de 2011 (Gráfico 3), um aumento de menos de 300 milhões de litros. Isso ocorre porque, no último trimestre, o Cepea captou um aumento modesto na oferta, abaixo das médias históricas. De fato, considerando 2011 como um todo, o Cepea apontou queda de 2,2% na captação.
Ainda que o IBGE traga números mais altos e que a curva do final de 2011 não seja tão baixa quanto a apresentada pelo gráfico 3, parece claro que a razão para a manutenção dos preços é a baixa oferta de leite no mercado.
Gráfico 3. Oferta inspecionada de leite em 2010 e 2011 (Fonte: IBGE, exceto último trimestre de 2011 - estimativa MilkPoint)
É importante lembrar que o crescimento do mercado de consumo tem girado em torno de 3 a 7% ao ano, dependendo da situação econômica do país, de forma que uma produção apenas 1,7% maior não seria suficiente para manter o mercado equilibrado.
Há que se considerar, evidentemente, o aumento das importações, contribuindo para equilibrar essa conta. Porém, mesmo nesse item, deve ser observado que os valores em equivalente leite importados (a quantidade de leite utilizada para produzir um quilo de determinado produto) nos últimos dois meses do ano de 2011 apresentaram uma redução frente ao ritmo crescente que se iniciou mais acentuadamente no segundo semestre do ano passado (Gráfico 4). Portanto, se a importação foi menor em novembro e dezembro e a oferta interna também não respondeu à demanda, tudo indica que o mercado ficou com pouca disponibilidade de leite.
Gráfico 4: Importação em equivalente leite em 2011 (Fonte: MilkPoint, a partir dos dados do MDIC).
Os altos valores dos preços pagos no campo fizeram com que as margens das indústrias ficassem mais apertadas, uma vez que as vendas de UHT no atacado vinham enfraquecendo desde o final de setembro. O artigo de Paulo do Carmo Martins, avaliando a evolução relativa dos preços de vários derivados ao longo de 2011 mostra que, no geral, o produtor é quem vem ganhando, traduzindo em números o raciocínio desenvolvido ao longo desse artigo (leia mais).
Quais as tendências para os próximos meses?
Um primeiro aspecto é que, a partir de meados de janeiro, agentes do mercado têm reportado alguma reação nos preços do UHT no atacado, provavelmente pela demanda estar sendo normalizada com o retorno das aulas escolares ou até por algum movimento das empresasque estão buscando uma alternativa de alcançar preços mais elevados em um futuro próximo.
Os preços do UHT no atacado têm forte correlação com os preços do leite ao produtor, sendo esta uma sinalização potencialmente interessante.
Além disso, o primeiro mês do ano foi marcado com diversas notícias sobre a estiagem que provocou alguns impactos, com perdas consideráveis nas lavouras, principalmente no milho no Sul do país. Algumas regiões como Vale do Taquari e o sul do Rio Grande do Sul foram os locais mais afetados pela seca. O noroeste do Estado gaúcho e oeste de Santa Catarina ainda não apresentam grandes perdas de produção, mas os produtores aproveitaram o milho que estava sendo perdido para suprir a falta dos pastos, segurando dessa forma o impacto na oferta. Contrariando alguns índices anunciados que relatavam perdas na produção de leite de até 10%, informações de agentes de mercado pronunciaram que o reflexo ainda não foi sentido de forma representativa e as perdas na produção de leite nessas regiões giram de 5% para menos. O Paraná teve apenas algumas áreas localmente afetadas, assim como os prejuízos na agropecuária. O impacto na oferta provavelmente será sentido nos meses seguintes, quando será preciso suplementar os animais. Ao que tudo indica, a produção de silagem produzida será de baixa qualidade, pois as plantas processadas apresentam pouca massa verde e espigas pequenas, com pouca quantidade de grãos. Assim, para os próximos meses, é possível que a produção do Sul venha mais tímida, por reflexo das intempéries climáticas de janeiro. Os acordos de importação com a Argentina, a possibilidade do Uruguai não ter o mesmo desempenho do ano que passou e uma possível melhoria da situação cambial podem contribuir para uma disponibilidade de leite mais ajustada no primeiro semestre, elevando os preços, que também podem ser puxados pela demanda, que poderá ser impactada positivamente pelo aumento do salário mínimo.
Por outro lado, os principais lácteos têm subido mais do que a inflação e, dentro deles, os preços ao produtor foram os que mais destacaram, apertando as margens da indústria. Sob o aspecto da produção, o produtor está estimulado pelos longos meses de relativa estabilidade de preços em 2011, em patamares interessantes.
Ainda é cedo para tecermos comentários mais definitivos sobre o comportamento do ano. O cenário mais provável continua sendo de um ano de relativa estabilidade, sempre lembrando que há diversos fatores que definem o mercado. Um destes fatores é a política de preços nos próximos meses: se houver forte estímulo a produção, ainda mais em um cenário de custos controlados, o resultado poderá ser o de forte elevação na oferta e consequente redução de preços, fazendo com que os preços em janeiro de 2013 se assemelhem mais ao comportamento verificado em anos como 2008/07, 2009/08 e 2010/09 do que nos últimos dois anos.