Desde seu lançamento em 2003, o a2 Milk tem desafiado o senso comum no setor de varejo de lácteos, abocanhando quase 10% do mercado de leite fresco na Austrália com um produto vendido a cerca de A$ 2,80 (US$ 1,99) por litro, mais que o dobro do preço do leite comum. No mês passado, a companhia aumentou sua previsão de lucros e disse que as receitas podem aumentar 126%, para US$ 230 milhões no ano que termina em 30 de junho.
A1 versus A2
O ponto de diferença é que os produtos a2 Milk são obtidos de vacas leiteiras que produzem somente o tipo A2 da proteína beta-caseína, enquanto a maioria dos leites contém os dois tipos, A1 e A2. As vendas do leite fresco, leite em pó, sorvete e outros lácteos sem A1 da companhia direcionaram um aumento de 80 vezes nos lucros e permitiram que a a2 Milk financiasse sua entrada no mercado da China, de US$ 19,9 bilhões, para fórmulas infantis.
Fundada em 2000 pelo cientista neozelandês, Corran McLachlan, e pelo fazendeiro multimilionário, Howard Peterson, o valor de mercado do a2 Milk mais que triplicou, para NZ$ 1,2 bilhão (US$ 790,83 milhões) durante o ano passado. A companhia, que ainda tem um escritório em Auckland, entrou no Reino Unido em 2012 e expandiu para os Estados Unidos no ano passado.
Na Austrália, onde os produtos a2 Milk são vendidos em quase todas as principais lojas de alimentos e em mais de 140 cafés, as ações aumentaram 189%, para A$ 1,635 (US$ 1,166) desde que começaram a ser comercializados em Sydney há menos de um ano. Até agora o produto ultrapassou muitas importantes companhias globais de lácteos.
“Na Austrália, o a2 se tornou mainstream”, disse o analista de pesquisas do Harbour Asset Management Ltd. em Wellington, Oyvinn Rimer, que possui pouco menos de 5% das ações da a2 Milk. “Consumidores muito sofisticados estão comprando esse produto. Eles acreditam que é melhor para eles e estão dispostos a pagar mais”. O a2 Milk ultrapassou as vendas de leite orgânico na Austrália, disse o analista sênior do setor de lácteos do Rabobank International em Melbourne, Michael Harvey. Sua expansão tem sido particularmente notável dada a resposta competitiva de companhias de lácteos estabelecidas, disse ele.
Um competidor, Lion Dairy & Drinks, que pertence à Kirin Holdings Co., do Japão, adicionou a frase “contém naturalmente proteína A2” no rótulo de seu leite regular, contendo proteínas A1 e A2. O diretor executivo da Parmalat SpA, da Austrália, Craig Garvin, disse que o a2 Milk pode prejudicar a indústria de lácteos com uma campanha de medo, que pode passar informações incorretas aos consumidores. Nessa linha, o diretor executivo da Fonterra, Theo Spierings, disse em uma entrevista que o leite A2 era apenas um “conceito de marketing”. Companhias rivais estão buscando formas de desacelerar o crescimento do a2 Milk, disse Geoff Babidge, diretor gerente da companhia desde 2010.
Para entender como o leite A2 se tornou uma sensação no departamento de lácteos, é necessário voltar cerca de 5.000 anos atrás, quando os cientistas disseram que uma mutação genética ocorreu nas vacas do norte da Europa e que a proteína A1 começou a aparecer no leite que até então continha somente a proteína A2, disse o professor da Universidade Lincoln da Nova Zelândia e ocasional consultor do leite a2, Keith Woodford.
As vacas Holstein-Friesians, as famosas vacas brancas e pretas das fazendas modernas que se originaram nos campos do norte da Alemanha e da Holanda, tipicamente produzem leite que tem cerca de 50% de proteína A1, de acordo com Woodford.
A teoria do a2 Milk, apoiada por cientistas como Woodford, que publicou um livro em 2007 sobre o debate da A1 versus A2 chamado “Devil in the milk” (“Diabo no leite”), é de que a A1 forma um fragmento quando digerido que pode desencadear inflamação no corpo, potencialmente elevando a doenças de síndrome do intestino irritável, eczema, esquizofrenia e autismo.
Uma revisão de 2005 publicada no European Journal of Clinical Nutrition não encontrou evidências convincentes de que a proteína A1 tem efeitos adversos nos humanos e a Associação de Nutricionistas da Austrália disse que a maioria das afirmações feitas sobre os benefícios da A2 são anedóticas e não são baseadas em evidências.
“Conceitualmente, parece um tiro no escuro”, disse o epidemiologista de nutrição da Commonwealth Scientific and Industrial Research Organisation (CSIRO) da Austrália, Malcolm Riley. “O número de impactos que tem sido sugerido à A1, ou o corolário de não haver impacto pela A2, são tão importantes que me parece que vale a pena investigar”.
A A2 Milk fez uma pesquisa sobre os supostos efeitos deletérios da A1 e promoveu a ideia de que as pessoas que bebem o leite da companhia “apenas se sentem melhor”. A companhia disse que um quarto dos consumidores nos países ocidentais reportaram algum tipo de desconforto após beber leite comum, citando um documento de 2010 do Innovation Center para U.S. Dairy, um grupo de pesquisa da indústria.
Quando se fala da China, esse número é de quase 85%, disse Andrew Clarke, diretor científico da a2 Milk, citando pesquisas da companhia. Isso torna a China um mercado particularmente atraente para o a2 Platinum, marca de fórmula infantil cujas vendas na primeira metade aumentaram 340%, para NZ$ 73,9 milhões (US$ 48,70 milhões). O diretor gerente Babidge também está mirando os Estados Unidos, pois de acordo com ele, o país pode ultrapassar a Austrália como o maior mercado dentro de quatro anos.
A companhia obtém seu leite americano de quatro fazendas leiteiras dos Estados Unidos, a maioria delas em Nebraska, e vende a lojas que pertencem ao Whole Foods Market Inc., Sprouts Farmers Market Inc., Albertsons Cos., bem como na Kroger Co., maior rede de varejo dos Estados Unidos.
Na Austrália, o a2 Milk tem sido uma benção para Paula e Michael Gray, cuja fazenda em Rollands Plains, a cerca de 400 quilômetros ao norte de Sydney, vende quase 2 milhões de litros/ano de leite sem a proteína A1. Para garantir que não contêm a proteína A1, análises são feitas e amostras de tecidos de cada vaca também são enviadas à companhia para testes.
O maior preço do leite é apenas um dos benefícios que os Grays obtêm fornecendo à a2 Milk disse Paula. O eczema de seu filho de 8 anos curou-se desde que a família começou a produzir e a beber esse leite. O outro filho, de 10 anos, tinha inchaço e diarreia após consumir leite comum, mas não sofreu mais com o sintomas quando bebeu o leite A2, disse ela.
Em 01/03/16 – 1 Dólar Australiano = US$ 0,71349
1 Dólar Neozelandês = US$ 0,65903 (Fonte: Oanda.com)
As informações são do Bloomberg.
