A partir desta agenda de futuro e com a presença de especialistas e empresários do Brasil e de fora, o 1º Latin America Dairy Congress, uma parceira da Zenith com a AgriPoint, discutiu os principais gargalos, oportunidades e insights do setor no Continente e no mundo. Abaixo, confira as palestras do painel “Dimensão global, oportunidades e tendências de mercado”.
Michael Mischchenko, especialista russo, colocou que “a Rússia não deverá remover o atual embargo às importações de alimentos ocidentais até pelo menos 2018”. Segundo ele, é improvável que a Rússia remova o embargo até depois das eleições de março de 2018. “Isso é devido a diferentes razões, mas a principal razão é a política, porque temos uma eleição nesse ano. Com a perda dos produtos importados, principalmente iogurtes, queijos e manteiga, a Rússia está estimulando a produção interna e os países ao redor estão buscando aumentar as exportações para nós”.
Michael Mischchenko: “a Rússia não deverá remover o atual embargo às importações de alimentos ocidentais até pelo menos 2018”
Ele destacou que a Rússia vem apresentando redução no consumo. “O consumo de produtos lácteos está diminuindo devido a uma insegurança dos consumidores, pois hoje há no mercado muitos produtos adulterados, como por exemplo, com acréscimo de gorduras vegetais. O governo está tentando tomar algumas providências, pois estima-se que aproximadamente 85% dos produtos hoje estão adulterados, não sendo o que deveriam ser”, concluiu ele. A queda no consumo, também causada pela perda de poder aquisitivo, aliada ao aumento da produção interna, faz com que a quantidade de leite importada seja bem menor do que já foi: dos 8,8 bilhões de kg importados em 2012/13, o volume para 2015/16 será de aproximadamente 2,6 bilhões.
Marcelo Pereira de Carvalho, CEO da AgriPoint, que moderou o evento junto com Richard Hall, Chairman da Zenith International, disse que o fato do mercado russo ser potencialmente menor do que já foi, com o mesmo ocorrendo com a China, coloca dúvidas sobre o consenso geral de que o mundo terá um déficit de leite nas próximas décadas: “De um lado, vemos vários países e continentes se estruturando para exportar. De outro, temos uma perspectiva de aumento do consumo no mundo, mas o fato é que sempre que há um aumento na produção, os impactos nos preços têm sido rápidos e intensos”, constatou.
Evento reuniu cerca de 200 líderes do setor lácteo de 10 países
Na sequência, Marc Beck, vice-presidente executivo de estratégia e visão do USDEC (Conselho de Exportação de Lácteos dos Estados Unidos), falou sobre como os Estados Unidos se tornaram um exportador estrutural de lácteos. “Os EUA não foi um país constituído para ser um exportador. Em 1995, por exemplo, estávamos voltados para o mercado interno, quase totalmente isolados dos mercados mundiais. Começamos a perceber uma mudança mundial, oportunidade de demanda e oportunidade de crescimento. Houve um aumento da demanda principalmente pelos países emergentes, aumento populacional, aumento de renda e ocidentalização das dietas e então, passamos a expandir nosso mercado”.
Ele citou que a rodada GATT do Uruguai limitou as distorções comerciais e os fornecedores tradicionais começaram a ter dificuldades para atender a demanda, então, surgiu uma proposta competitiva para os EUA de captar essa oportunidade de crescimento de forma madura. “Para obter vantagem nesse cenário, algumas coisas precisaram ser implementadas e adaptadas, houve mudança na cultura dos fornecedores que passaram de oportunistas para fornecedores consistentes, entre outros. Além disso, o foco do programa é dar às empresas norte-americanas as ferramentas para encontrar clientes e competir por eles”. Para finalizar, ele ressaltou que os EUA tem uma grande oferta de leite a custo “baixo o suficiente” e precisam das exportações para crescer. Hoje, cerca de 15% da produção norte-americana precisa ser exportada.
Abordando o assunto “Embalagens inteligentes: o que o futuro nos reserva?”, Gail Barnes, Sócia da empresa de consultoria Personify LLC dos Estados Unidos, apresentou ideias futuras sobre como podemos aumentar a vida de prateleira dos produtos lácteos. “Hoje temos muito desperdício na indústria láctea e essas possibilidades de embalagens futuras vêm para auxiliar esse problema. Destaco três opções: tintas termocrômicas, biossensores e RFID. As tintas já são comercializadas há alguns anos. Em temperatura ambiente não há cores visíveis, mas, quando coloca-se o produto na geladeira, uma figura aparece na embalagem com um recado dizendo “pronto para beber”. Isso é muito atraente para os consumidores, pois eles acham a ideia simpática. Os biossensores também detectam temperaturas e poderiam ser utilizados pelas indústrias com o intuito de analisar se os varejistas estão refrigerando adequadamente os produtos e se os produtos sofreram abusos de temperatura”.
Carlos Ramirez, CEO e fundador da Powerful Yogurt, questionou até que ponto o consumidor está preparado para lidar com embalagens inteligentes. “Temos QR codes nas nossas embalagens e inclusive fazemos promoções oferecendo produto a quem acessar, mas o fato é que ninguém acessa”, admitiu o empresário radicado nos Estados Unidos.
Para finalizar, ela citou que o RFID (radiofrequência) é uma opção para pallets e containers. “Todos eles são utilizados em produtos premium por enquanto e temos que pensar se esses custos valem a pena, pois esse é apenas um início daquilo que podemos ter daqui uns anos”.
Discorrendo sobre “Tendências de Food Services”, Roberto Denuzzo, da RDC Consultoria, iniciou a palestra frisando que o food service ainda vai gerar muitas oportunidades. “Após décadas de crescimento contínuo, o food service está sofrendo em 2015, com impactos negativos na rentabilidade devido ao aumento do custo da mão de obra, aumentos nos custos de energia, contratos de aluguel fixados em valores elevados e aumento dos custos logísticos, além uma redução de 10 a 30% nas vendas. “As empresas nunca estiveram tão atentas aos custos e a pedra de toque nesse momento é como conseguir oferecer aos clientes uma solução atrativa em termos de custos”, sintetizou. Ainda, devido ao aumento dos custos, a necessidade de escala ficou maior e, para atingir custos operacionais mais interessantes, devem haver novas fusões e aquisições no setor.
De acordo com Denuzzo, há muitas oportunidades para a indústria atuar no food service. “Estamos agora, por exemplo, em um grande hotel, de luxo. O iogurte que tem no café da manhã é genérico, com o produto em uma jarra. Seria uma ótima oportunidade para uma empresa oferecer o produto em uma máquina automática, com vários sabores e com marca. Porque não temos isso? Faltam equipamentos e falta atenção a essas oportunidades”, exemplifica.
Além disso, o food service, para se manter, precisa estar por dentro das tendências, como por exemplo, o aumento do hábito gourmet e maior demanda por produtos glúten free, lactose free, vegan e natural”. “É interessante acompanhar redes como a Shake Shack, dos EUA, que vende também biscoitos para animais de estimação. “A rede percebeu que criar um ambiente favorável aos animais de estimação atraía clientes para a loja, Hoje, 9 entre cada 10 adolescentes preferem a Shake Shack em relação ao McDonald’s”.
Denuzzo falou ainda sobre a regionalização. Apesar do eixo Rio-SP continuar dominando, há muita coisa ocorrendo fora dele. Ele trouxe o exemplo da Redeaçaí, que tem 40 lojas no interior, tendo sede em Divinópolis, MG. “Quem não for ver o que está acontecendo em locais como esse, só vai vender para eles quando chegarem a São Paulo, muitos anos à frente”.
Piercristiano Brazzale, sócio da Brazzale Company, empresa de lácteos mais antiga da Itália, questionou até que ponto é bom para o setor ficar lançando produtos sem isso ou sem aquilo. “Estamos dizendo que os lácteos, para serem saudáveis, precisam perder ingredientes que são parte do produto?”, provocou.
Julian Mellentin, Fundador da New Nutrition Business, falou na sequência sobre o “Consumo de queijos e oportunidades de mercado. O que há de novo?”. O destaque de sua apresentação foi mostrar que há uma mudança em curso a respeito dos lácteos como produtos saudáveis. Na década de 90, os lácteos eram recipientes para ingredientes que eram tidos como responsáveis por fazer bem à saúde, como probióticos, infoesterois, CLA, e outros. Agora, surge o conceito dos lácteos como produtos saudáveis em si, embasados por pesquisas que mostram não haver evidências do consumo de lácteos estar associado a obesidade e problemas cardiovasculares.
Dentro disso, Mellentin comentou que houve uma fase na qual a gordura do leite e dos lácteos foi discriminada e ganhou a fama de fazer mal para a saúde, resultando em um aumento de consumo de produtos com baixa gordura (desnatados), bem como produtos substitutos. “Não há provas concretas para essa afirmação e estamos desmitificando isso. Com relação ao queijo, algumas pesquisas mostram que devemos analisar a tabela nutricional do produto como um todo, pois além das gorduras, ele possui outros nutrientes que o torna um alimento balanceado e não um vilão para a saúde”. Para ilustrar, ele compartilhou o caso dos franceses, que são os maiores consumidores de queijos e têm os menores índices de problemas cardiológicos do mundo. “É importante que as indústrias lancem opções de produtos que se encaixem no dia a dia dos consumidores, como snacks, lanches rápidos e produtos casados com outros ingredientes. Se a indústria láctea não fizer isso, outras indústrias farão”, alertou.
Finalizando o painel, Marcelo Ermini, Diretor da Titanium Trade Marketing, apresentou algumas tendências e oportunidades para o varejo de lácteos no mundo. “Nós temos que saber quais são as expectativas dos consumidores. Devemos estar prontos para atender o cliente do jeito que ele quiser. Eles estão cada vez mais em busca de informações e compartilhando experiências nas redes sociais”. Ermini relatou que as indústrias precisam interagir com os seus clientes e ter engajamento social, engajamento político, buscando comprometimento e sustentabilidade. “As indústrias devem estar mais próximas dos canais de vendas, focar seus esforços em marcas regionais e nichos do mercado local e descobrir quem são os seus clientes”.
Ermini comentou também a busca crescente por produtos naturais e o efeito “Master Chef”: com a proliferação de programas de culinária nas TVs, o consumidor tem buscado aprender a cozinhar, mudando a sua relação com a alimentação. Para Marcelo Pereira de Carvalho, trata-se de uma boa plataforma para os lácteos, que são ingredientes relevantes e essenciais em cozinhas como a italiana e a francesa.
