Momentos difíceis: quem nunca passou por eles? Nas propriedades leiteiras, isso não é diferente. Às vezes o bolso aperta, o pasto não vai bem, alguma doença acomete o rebanho ou perdemos algum funcionário que sempre foi nosso braço direito. Em outras, o planejado não sai como o esperado e aquela velha frase 'épocas de vacas magras' passa a fazer um baita sentido.
Mas...de repente, depois da tempestade aparece um arco-íris e a 'roda volta a girar' com fluidez e eficiência. É assim que se desenrolam as histórias de superação, cujas cicatrizes ficam marcadas em nós e são revertidas em amadurecimento e resiliência.
Localizada em Picada Evaristo, interior de São Lourenço do Sul/RS, a propriedade familiar Peglow conta com uma extensão de terras de 39 hectares. Destes, apenas 16 são utilizados para a agropecuária já que os demais são destinados para área de preservação permanente devido às condições do terreno, que é muito íngreme e pedregoso. Na 2ª edição do Especial Coração do Leite, a Equipe MilkPoint conversou com Tobias Peglow, que nos contou com detalhes sobre uma das histórias de superação vivenciadas pela família.
Após o casamento, Ronei Peglow e Luciara Maria Heller Peglow, pais de Tobias, iniciaram no leite com duas vacas: uma comprada do vizinho e a outra, trazida da casa dos pais de Luciara. “Como todo início, as coisas não foram fáceis. Doenças, falta de conhecimento e de assistência técnica resultaram em um alto índice de mortalidade das vacas, porém, com insistência e sempre pensando na reposição dos animais do plantel, a produção foi crescendo e os desafios também”, disse Tobias. Segundo ele, com a utilização da inseminação artificial, foi possível aumentar o número de cabeças e a qualidade produtiva e genética.
Com a ordenha realizada manualmente por muitos anos em um antigo galpão adaptado para estábulo, os indicadores de qualidade não eram nada bons, chegando a CBT (Contagem Bacteriana Total) em até 2.000.000 UFC/ml e CCS (Contagem de Células Somáticas) em torno de 1.000.000 cél/ml. Na época, o leite precisava ser levado em tarros para a estrada pois o caminhão não o recolhia na propriedade.
Em 2009, as coisas começaram a melhorar na propriedade quando ela aderiu a linhas de créditos acessíveis que possibilitaram a compra de um trator maior, resfriador a granel e a construção de uma sala de ordenha com transferência de leite automática. Também, atenção especial foi dada ao canzil para a alimentação das vacas e com a maior facilidade da ordenha, inclusive em um local mais limpo e adequado, os indicadores de qualidade logo melhoraram, chegando a CCS em torno de 400.000 cél/ml e CBT em torno de 6.000 UFC/ml. Junto com essas facilidades, o tempo de ordenha foi reduzido pela metade, o rebanho cresceu mais ainda e a produção diária quadruplicou.
Mas vieram os ventos contrários...
Em 2016, tudo ia muito bem: a família estava construindo uma casa nova, a produção estava expandindo consideravelmente, assim como a quantidade de novilhas prenhas. Mas, para a infelicidade dos Peglow, um ‘vento soprou’ na direção contrária: diversas vacas abortaram, outras não emprenhavam – mesmo após 5 ou 6 tentativas – e parte delas, passaram a apresentar cios silenciosos.
“O espaço aberto no tanque começou a aumentar bruscamente e todas as expectativas até ali planejadas não se concretizaram. Em busca de respostas, algumas atitudes investigativas tiveram que ser tomadas, e foi então, que chegamos a uma conclusão preocupante: a presença de neospora no rebanho. O baque foi gigante e o desânimo tomou conta de todos os envolvidos, até porque, nunca ninguém havia escutado falar sobre essa doença”, contou Tobias.
Ele relatou que era como se os dias tivessem escurecido e o futuro passou a ser visto com outros olhos. “Pensamos até em trocar de profissão, mas aos poucos, como a força do nosso empenho, dedicação e assistência veterinária, as coisas foram mudando. Aprendemos a conviver com a enfermidade, passamos a tomar mais cuidado com a ração e a silagem e - passo a passo – fomos observando os resultados positivos da ‘camisa suada’. Nos últimos dois anos a produção voltou a crescer e a média por animal também. Os partos estão ocorrendo normalmente, abortos não são mais observados e a taxa de prenhez está em um bom patamar”.
Atualmente a produção diária varia de 380 a 600 litros, dependendo da estação do ano, e a média diária geral por animal é 26 litros/leite/vaca em um sistema de produção a pasto complementado com ração e silagem de milho. O rebanho é composto por 42 cabeças, dessas, 4 Jersey e as demais, Holandesas.
“Já vencemos muitos desafios e compreendo que teremos outros pela frente. Olhando agora, parece que nem tivemos problemas grandes e que todos eles poderiam ter sido facilmente evitados, mas estamos falando de uma pequena propriedade rural sem incentivo governamental e sem condições de pagar assistência veterinária. No momento que mais precisamos, a empresa para o qual vendemos nossa produção iniciou um projeto de assistência veterinária gratuito e nossa propriedade foi escolhida, o que possibilitou vencer os obstáculos daquele momento. Hoje estamos recebendo visitas veterinárias pagas pela indústria e recentemente fomos convidados a participar de um grupo de produtores organizado pelo Sebrae chamado ‘Juntos para competir’ que visa qualificar produtores e propriedades. Além disso, estou fazendo um curso de inseminação artificial, algo fundamental para nós hoje”, comentou o produtor.
No momento atual, a propriedade enfrenta um desafio relacionado a disponibilidade de água para as vacas. Eles possuem fontes próprias do recurso mais a maior dele vem de um açude cedido pelo vizinho que fica a mais ou menos 1 km de distância.
E finalizando a história contada na entrevista, deixou a todos uma mensagem inspiradora:
“Para alguns, as pedras no caminho serão sempre pedras no caminho, para mim, elas podem ser a solução. As pedras que espalhadas me atrapalhavam e machucavam as vacas, recolhi com a força dos meus braços e fiz uma contenção para segurar a terra no seu devido lugar e garantir que aqui se possa produzir por muito tempo. Em um local íngreme, como o da propriedade Família Peglow, nasceu uma iniciativa exemplar”.
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