Qual a diferença entre tecnologia e tecnificação?
O conceito de tecnologia, segundo alguns autores, está associado ao conjunto de medidas que resultam no aumento da produtividade com redução de custos. Muitos confundem tecnologia com tecnificação que, por sua vez está associada ao investimento em máquinas, sistemas automatizados ou todo e qualquer tipo de equipamento, em geral. Tecnificação nem sempre significa redução de custos e quase sempre implica em aumento de despesas. Tecnologia bem empregada resulta em bons resultados práticos. Nem sempre necessita de investimentos e muitas vezes está associada a adoção e adequação de uma técnica ou manejo adequado. A tecnificação sem critério pode ser o caminho mais curto para o fracasso.
E de que maneira tais conceitos estão associados à questão da mão de obra?Atualmente, com a "onda verde" e o "ecologicamente correto", ou seja, redução da emissão de gases, preservação da natureza, estímulo da produção de recursos renováveis, biocombustíveis, e demais temas associados ao futuro do meio ambiente global podem ser associados às práticas agropecuárias envolvendo tecnologia e tecnificação, sim. Colheita mecanizada de cana, uso adequado de defensivos, plantio direto, conservação do solo e da água, proteção de áreas de preservação permanente, biogás através do esterco armazenado, são conceitos ligados à sustentabilidade e adequação ambiental amplamente atuais. A modernização das operações agrícolas também tem demandado uma mão de obra mais qualificada, nem sempre disponível para os produtores rurais. Àmedida que aplicamos tecnologia (conceitos que aumentem a produção na prática, com redução de custos) e tecnificação, principalmente, estamos trocando: quantidade xs qualidade, em termos de mão de obra. Um bom exemplo é a introdução de um vagão total mix substituindo a mão de obra no trato de animais. Tal demanda, implicará em mudanças no segmento nos próximos anos.
Nos estados mais desenvolvidos da nação, a realidade do homem do campo, mudou. O acesso a educação é maior, o analfabetismo é menor e o nível de escolaridade é maior. São mudanças positivas, no entanto, o perfil da mão de obra daqueles que têm no campo (fazendas, empresas rurais, etc) uma opção de trabalho, também mudou. Infelizmente, o vínculo, hoje, de boa parte da mão de obra rural disponível é com o consumo, com a possibilidade de se comprar (em 5, 10, 15 parcelas) e não mais com o emprego, o patrão, a empresa, a propriedade. Atualmente, rotatividade nos empregos tem sido muito alta. O grau de insatisfação por parte dos empregados é relativamente alto e para que um cargo ou emprego seja considerado bom, além de salário em dia é necessário que o empregador ofereça vantagens como plano de saúde empresarial, carga horária fixa e pré-estabelecida, finais de semana de folga, carteira assinada (registro, claro), recolhimento de todos os deveres trabalhistas e, se possível, por que não, cesta básica. Este perfil de trabalhador hoje, "teoricamente" melhor qualificado, busca emprego nas cidades em empresas de maior porte, com infraestrutura trabalhista compatível com suas necessidades. Poucas propriedades rurais podem oferecer tais condições de trabalho, atualmente. Todos que trabalham com leite sabem que o fator: "mão de obra" é determinante para o sucesso da atividade. Logo, nosso setor está carente de pessoas que venham a se envolver com a dura e árdua rotina de tirar leite e alimentar animais todos os dias, sem exceção, faça chuva, faça sol, seja sábado domingo ou feriado. A consequência para o setor é a queda na qualidade da mão de obra disponível no campo.
Certa vez, numa viagem para a Itália, visitando a Provincia di Parma, tive a oportunidade de conversar e conhecer a rotina de um produtor italiano de médio porte. Numa outra viagem, aos Estados Unidos, também estive com um produtor americano também de médio porte (1000 a 2000 L/dia). Notei uma semelhança entre ambas as propriedades: reduzido nº de funcionários e a dedicação exclusiva da família na atividade. Sem exceção. Pai, filho(s), mulher, genros e noras, trabalhando. E no Brasil? Ainda encontramos médias propriedades dependentes de um grande nº de funcionários (8 a 12, para a mesma produção citada anteriormente). Quando conversamos com os proprietários, sempre a mesma reclamação: altos custos, baixa rentabilidade. Será que este modelo é viável?
Concluindo: o setor de mão de obra vem passando por uma transformação. O acesso ao crédito e melhoria das condições de vida e escolaridade da população criou um novo status quo envolvendo o atual trabalhador rural. Antes marginalizado e pouco instruído. Hoje, seu perfil é diferente. Por quê trabalhar na roça se pode trabalhar numa grande rede de supermercado, como empacotador, na sombra, no ar condicionado e com uma série de benefícios. Por quê ir carpir café, cortar cana, colher laranja se pode trabalhar num posto de gasolina, numa lan house, no comércio local? A dinâmica de mercado mesmo das pequenas cidades está mudando. Pet shops, lojas de conveniência, escritórios de contabilidade, advocacia, clínicas... No passado quantas haviam nas cidades do interior? E hoje? Quantas encontramos nas mesmas? O mercado de trabalho mudou. Apesar da relutância de algumas mentes menos providas de inteligência, mas o Brasil o mercado mudou e está mudando. Existem novas opções, novas oportunidades. Com raras exceções de grandes empresas agrícolas como algumas usinas de cana, ou indústrias ligadas a produção de laranja ou celulose, o setor agropecuário em termos de benefícios trabalhistas ainda está atrasado. E dentre as atividades rurais, a produção de leite, o trato diário, o retiro, talvez seja, senão a mais difícil, uma das mais árduas atividades para se envolver.
Creio que num futuro próximo teremos dois tipos de produtor (perfil) ou modelo de sucesso envolvendo a produção de leite: o "do it yourself", ou seja, o modelo mais próximo da agricultura familiar xs a pecuária empresarial, com elevado giro de capital, grandes investimentos, elevados custos, baixa margem e ganho através da escala. O que não podemos é ficar no meio do caminho, com custos operacionais elevados e quantidade de funcionários incompatíveis com o volume produzido. Eis o nosso desafio.