Marcelo Pereira de Carvalho
Cientistas canadenses compararam a incidência de lesões no jarrete de vacas alojadas em free stall contendo 3 tipos de cama: areia, colchão de borracha e maravalha/serragem. Os dados foram obtidos em 20 fazendas da província de British Columbia. O colchão de borracha era constituído por uma capa de poliéster recheada com borracha picada prensada (3 cm de espessura), subproduto da vulcanização de pneus (ver desenho abaixo). Cerca de 6 fazendas usavam este tipo de cama, sendo 4 permeáveis e 2 impermeáveis. Todas utilizavam pelo menos uma camada de 1 cm de serragem ou palha para aumentar o conforto das vacas sobre a cama de borracha. Os autores ponderaram que evidentemente esta camada de 1 cm não era uniforme e havia vários pontos sem cobertura.
Foram caracterizadas 2 classes de lesões em relação à severidade: lesão tipo 1, quando a área de perda de pelo era menor do que 10cm2 e não havia evidência de feridas na pele, e lesão tipo 2, com pele ferida, jarrete inchado ou área de perda de pelo maior do que 10cm2.
Das 1752 vacas avaliadas, nada menos do que 1267 (73%) tinham pelo menos uma lesão no jarrete, indicando que, no geral, o conforto estava deixando a desejar.
Das vacas com lesões, 87% tinham lesões nas 2 pernas, 76% tinham lesões em mais de um local no jarrete e 78% tinham lesão com grau no mínimo moderado de severidade, definido pela ocorrência de lesões de pele ou perda de pelo em área acima de 10cm2.
As lesões foram mais prevalentes em fazendas que usavam colchões de borracha como cama, com 92% das vacas apresentando lesões, e menos prevalentes em fazendas utilizando areia, com 24% das vacas. Além disto, as lesões de vacas alojadas sobre colchões de borracha eram mais numerosas e mais severas do que vacas que tinham areia como cama, com média de escore 1,7 contra 1,1 das lesões em areia. As fazendas que utilizavam maravalha ou serragem como cama obtiveram resultados intermediários, com escore de 1,4 e 70% de vacas com lesões. Estatisticamente (P < 0,05), os 3 tipos de cama diferiram entre si em relação à % de vacas com lesões e número de lesões/animal. Já o escore de severidade foi estatisticamente inferior para as vacas em areia, mas não diferiu entre os demais tratamentos.
Entre as 10 fazendas que usavam maravalha, os pesquisadores detectaram uma relação significativa e inversa entre o comprimento das camas e a severidade das lesões: quanto menor a cama, maior a severidade. Nos demais tipos de cama, o espaço amostral foi pequeno para permitir análise similar.
Nas vacas alojadas em areia, além da baixa incidência e severidade do problema, verificou-se que as lesões geralmente ocorriam em apenas 1 local. Em uma das fazendas, a espessura da areia em uma seção do free stall era de apenas 5 cm, contra 15 cm nas demais seções e demais fazendas. Esta fazenda foi justamente a que apresentou maior incidência de lesões no jarrete (60% das vacas) com este tipo de cama. Duas das fazendas com areia tiveram ao redor de apenas 6% de lesões.
Ainda, os autores verificaram que as vacas sobre o colchão de borracha tiveram lesões predominantemente na superfície lateral do jarrete, talvez em função do atrito da perna com a cama. Nas vacas sobre a serragem, as lesões predominantes eram no dorso do jarrete, em função do atrito com a mureta traseira da baia. Na areia, com exceção da fazenda com cama fina citada acima, as demais praticamente não apresentaram lesões.
Por fim, os autores detectaram que o número e a severidade de lesões aumentaram com a idade das vacas.
Comentário Milkpoint: a utilização de free stall como forma de alojamento de vacas implica em investimentos significativos em instalações e no próprio sistema de produção que o acompanha (confinamento total). Desta forma, deve-se buscar a máxima produção individual por vaca como forma de viabilizar o sistema (claro que sem forçar sem ter ambiente ou manejo para tal). A manutenção de camas que não machuquem as vacas e estimule-as a deitar é aspecto fundamental para garantir conforto na instalação. Sem isto, com certeza a produção não estará sendo otimizada, embora os custos (alimentação, medicamentos, pessoal, depreciação, etc) existam da mesma forma.
Em relação ao trabalho acima, temos verificado várias fazendas utilizando colchão de borracha sem a ocorrência de lesões e com alta ocupação de camas. Detalhe importante: todas as fazendas empregam uma camada de pelo menos 3 a 5 cm de serragem, reposta diariamente ou a cada 3 dias, como forma de aumentar o conforto. Com esta medida (que sem dúvida tem um custo e dá trabalho), consegue-se tornar o colchão uma cama adequada e viável para locais onde a areia é cara ou há problemas de manipulação de esterco.
A correlação entre tamanho da baia e incidência de problemas é importante. A recomendação atual é trabalhar com comprimento total de 2,40 m a 2,50 m, sendo 1,70 a 1,80 m para deposição do corpo do animal (vacas de 550 a 650 kg) e o restante para o movimento frontal da cabeça.
Abaixo, vacas confortavelmente instaladas em colchão de polipropileno no Paraná
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fonte: MilkPoint