Autores*
Luiza de Ávila Sphor - Engenheira agrônoma, Doutoranda, UFRGS;
Mylena Taborda Peres - Graduanda em Zootecnia, UFPR;
Alda Lucia Gomes Monteiro - Professora, Depto. de Zootecnia, LAPOC/UFPR;
César Henrique Poli - Professor, Depto Zootecnia, UFRGS.
A produção ovina ocorre predominantemente em sistemas de criação extensiva no Sul do Brasil, e não são todos os ovinocultores que dispõem de oferta de pastagem e/ou reserva forrageira para satisfazer de forma correta a demanda nutricional dos animais nos meses de outono-inverno, quando a quantidade e qualidade do pasto, muitas vezes, pode estar comprometida devido às influências climáticas. Entre os meses de maio e agosto é o período em que a quase totalidade das ovelhas está gestando e é neste momento, de alta demanda, que muitas vezes elas estão sofrendo menor disponibilidade alimentar.
Nos primeiros 90 a 100 dias de gestação a ovelha não apresenta grande incremento das necessidades energéticas e protéicas, suas exigências nutricionais são levemente superiores a de ovelhas não gestantes, e neste período se faz necessário apenas evitar a perda de peso e de escore de condição corporal. Entretanto, com a proximidade do terço final da gestação, inicia-se a fase de maior atenção e preocupação com a nutrição materna, pois nestes últimos 50 a 60 dias de gestação o cordeiro irá crescer o equivalente a aproximadamente 70% do seu peso total ao nascimento. É também neste momento que haverá desenvolvimento da glândula mamária e formação do colostro, aumentando ainda mais as exigências nutricionais da gestante.
Embora a maior demanda energética por parte do cordeiro ocorra nos meses prévios ao parto, um adequado suprimento nutricional para a ovelha deve ocorrer durante todas as fases da gestação.
Ente os dias 30 e 80 pós-concepção, a placenta está em formação e é ela a responsável por controlar majoritariamente a oferta de nutrientes para o feto em ovelhas gestantes e o tamanho placentário está correlacionado fortemente com o peso do cordeiro ao nascimento (KELLY e NEWHAM, 1990). Alexander (1964) descreveu correlação positiva entre o peso ao nascer de cordeiros e o peso de cotilédones placentários. Desta forma, o manejo e a nutrição durante a gestação podem afetar o número e o tamanho dos cotilédones placentários, consequentemente afetando o fluxo nutricional e o peso do futuro cordeiro.
Portanto, mesmo não existindo grande demanda direta de nutrientes por parte do cordeiro antes dos 100 dias de gestação, a nutrição que a gestante está recebendo será responsável pelo potencial produtivo da prole. Há demanda de nutrientes para a formação correta da placenta, e esta não pode ser desconsiderada no momento de programarmos o manejo nutricional das gestantes. Ovelhas com nutrição restrita durante o terço médio da gestação (50 a 100 dias pós-concepção) poderão apresentar desenvolvimento placentário deficitário ocasionando menor peso da prole no nascimento, menor vigor e diminuição dos níveis de sobrevivência, comprometendo os índices zootécnicos da propriedade.
Vários trabalhos vêm demonstrando a importância da nutrição materna não somente no peso ao nascimento de cordeiros. Mellor e Murray (1985) avaliando ovelhas com três níveis nutricionais durante a gestação concluíram que o peso do úbere foi significativamente inferior e a produção de colostro foi quatro vezes menor em fêmeas com baixos níveis nutricionais na gestação. Igualmente, Banchero et al. (2006) observaram que o acúmulo de colostro no momento do parto foi aproximadamente 62% inferior em ovelhas com restrição alimentar, e concluíram que, o regime hormonal é inadequado para o desenvolvimento correto do úbere e para a boa síntese de colostro em ovelhas com déficit alimentar na prenhez.
Já Dwyer et al. (2003), observando o comportamento pós-parto de ovelhas, constataram que fêmeas que sofreram restrição alimentar na gestação dedicam menos tempo para lamber seus cordeiros, são mais agressivas para com estes e possuem menor vínculo mãe-filhote.
Conseguir mamar nos primeiros minutos após o nascimento, tendo acesso a uma fonte energética que irá auxiliar na manutenção da temperatura corporal, assim como conseguir firmar vínculo com a mãe é o principal fator para a sobrevivência do cordeiro após o parto. Em regiões onde a estação de parição ocorre em períodos frios do ano e os animais encontram-se sem abrigos e expostos a possíveis predadores, a proximidade com a mãe e a ação desta como protetora é imprescindível para a sobrevivência do cordeiro.
Além do peso ao nascimento e sobrevivência, outros fatores podem ser influenciados pelos níveis nutricionais da ovelha no momento da gestação. Estes incluem: composição de carcaça, produção de lã, desempenho reprodutivo, comportamento e a susceptibilidade a doenças e estresse (ASHWORTH, 2009).
Em ovinos, o potencial produtivo de carne é, em parte, fixado no período embrionário-fetal. As células que darão origem aos músculos do cordeiro iniciam sua formação ainda no primeiro terço da gestação, e a baixa nutrição da ovelha poderá gerar diminuição do número total de células musculares nos cordeiros comprometendo desta maneira seu potencial produtivo de carne, variando a conformação da carcaça e modificando a composição da mesma.
Aproximadamente aos 50 dias de gestação inicia-se a formação das estruturas que darão origem aos folículos formadores de lã do cordeiro. No momento do nascimento, este já possui fixado a quase totalidade do seu número total de folículos lanares, não havendo expressivo desenvolvimento destas estruturas no pós-parto. Este fator nos remete, mais uma vez, à grande importância que existe na contemplação dos requerimentos nutricionais das ovelhas gestantes.
Alcançar bons índices zootécnicos em um rebanho ovino exige atenção e empenho em diversos aspectos. Entre eles, como é sabido, a sanidade e a nutrição são fundamentais. O requerimento nutricional para cada uma das categorias e fase fisiológica em que esta se encontra é diferenciado. Acompanhar periodicamente o rebanho de cria, observar a condição corporal das fêmeas e certificar-se de que as mesmas possuem correta disponibilidade de alimentos é imprescindível para o sucesso da produção pecuária. O descuido com a nutrição das matrizes pode gerar perdas econômicas e diminuição do potencial produtivo. A utilização de reprodutores de alto valor genético pode não ser satisfatória se o feto não possuir suficiente condição de expressar todo o seu potencial.
Contudo, dentro dos rebanhos comerciais e para um sistema produtivo rentável, muitas vezes o fornecimento de concentrado ou a implantação de pastagens pode não ser viável. Conhecer qual o melhor momento para suplementar as ovelhas gestantes, tentando minimizar os efeitos da subnutrição sobre os cordeiros se faz necessário na busca por melhor manejo do rebanho.
Visando aprofundar o conhecimento sobre o tema, foi realizado no primeiro semestre de 2013, um experimento em conjunto entre a Universidade Federal do Paraná e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no qual se buscou determinar qual o efeito da restrição nutricional em cada uma das fases da gestação em ovinos. O experimento foi conduzido no Laboratório de Produção e Pesquisa em Ovinos e Caprinos (LAPOC) da Fazenda Experimental da UFPR, com ovelhas cruza White Dorper x Suffolk, com dieta a base de pastagem de Tifton e diferentes momentos de suplementação concentrada. Avaliou-se o perfil metabólico das gestantes e de seus cordeiros, assim como a produção e composição de colostro e leite, sobrevivência, vigor e ganho de peso dos cordeiros. A proposta principal é localizar em qual das fases gestacionais (terço inicial, mediano ou final) as restrições nutricionais poderão causar mais impacto nos resultados produtivos da criação de cordeiros para carne, a fim de contribuir com o conjunto de informações já existentes quanto ao manejo nutricional de ovelhas gestantes.
Referências bibliográficas ALEXANDER, G.; Studies on the placenta of the sheep (Ovis aries) placental size, Journal of Reproduction and Fertility, v.7, p.289-05, 1964.
ASHWORTH, C.J.; DWYER, C.M.; MCEVOY, T.G.; ROOKE, J.A.; ROBINSON, J.J; The impact of in utero nutritional programming on small ruminant performances Options Méditerranéennes, v. 85, 2009.
BANCHERO, G.; PERES, R.;BENCINI, R.; LINDSAY, D.; JOHN, T.B.; GRAEME, B.; Endocrine and metabolic factors involved in the effect of nutrition on the production of colostrum in female sheep, Reproduction Nutrition Development, v.46, p.447–460, 2006.
DWYER, C.; LAWRENCE, A.; BISHOP, S.; LEWIS, M.; Ewe–lamb bonding behaviours at birth are affected by maternal undernutrition in pregnancy British Journal of Nutrition, v.89, p.123–136, 2003.
KELLY, R.W.; NEWHAM, J.P. Nutrition of the pregnant ewe. Reproductive Physiology of Merino Sheep: Concepts and Consequences. Australia. The University of Western Australia. 1990. 327p.
MELLOR, D.J.; MURRAY, L.; Effects of maternal nutrition on udder development during late pregnancy and on colostrum production in Scottish Blackface ewes with twin lambs. Veterinary Science, v.39 p.230–234, 1985.