A criação de animais a pasto nas regiões semiáridas é limitada a poucas opções de gramíneas forrageiras que suportem os longos períodos de estiagem e forneçam aos animais alimento adequado ao seu desempenho. Na região semiárida, o período seco é de até oito meses ao ano e o período chuvoso é marcado por chuvas irregulares e veranicos cada vez mais frequentes. Manter um pasto cultivado nesse cenário exige do produtor estratégias que minimizem as perdas. Se os animais atravessarem o período seco sem perder peso, o produtor já obteve ganho, porque a vegetação é escassa e a qualidade do alimento nesta época é bastante reduzida, dificultando o ganho de peso dos animais.
Para os pequenos produtores a situação é ainda mais alarmante, porque eles não possuem recursos suficientes para comprar suplemento alimentar para o animal nos períodos mais críticos e ficam na dependência da vegetação nativa. Para os criadores de caprinos e ovinos, a vegetação nativa da Caatinga consegue suprir grande parte da exigência nutricional dos animais, mas para o criador de bovinos a dependência do pasto cultivado é maior. Por esse motivo, a Embrapa pesquisa gramíneas forrageiras buscando adaptação às condições de semiárido para a melhoria da oferta de forragens.
No município de Tauá, na região dos Inhamus do Ceará (Figura 1), mesmo após três anos com chuvas abaixo da média, é possível encontrar pastos formados de capim corrente (Urochloa mosambicensis) rebrotando no período seco. Essa resistência do capim ao extremo déficit hídrico indica que a Embrapa está no caminho certo ao pesquisar novas cultivares para disponibilizar ao mercado, por meio de parcerias com empresas privadas e programas de governo, sementes registradas e com qualidade física e fisiológica para a implementação de novos campos de pastagens cultivadas.
Figura 1. Pasto de capim corrente no mês de julho no município de Tauá, CE. (Autoria: Juliana Evangelista).
O capim corrente é originário da África, mas a Austrália é pioneira em selecionar e avaliar os materiais coletados no centro de origem. O Brasil já introduziu outras gramíneas forrageiras provenientes da África e da Austrália com grande impacto na bovinocultura principalmente na região do Cerrado, onde os materiais se adaptaram bem como a Brachiaria decumbens var. Basilisk e a Brachiaria brizantha cv. Marandú. Mas, para a região semiárida o desafio a ser enfrentado pela seca exige gêneros de forrageiras mais rústicos, com características de tolerância ao estresse hídrico.
Na década de 1980, a Embrapa Caprinos e Ovinos (Sobral, CE) e a Embrapa Semiárido (Petrolina, PE) já haviam avaliado o capim corrente, com bons resultados sobre digestibilidade e produção de matéria seca. Mas nenhum programa de melhoramento foi estabelecido para o gênero. Por esse motivo, a Embrapa Caprinos e Ovinos, em parceria com a Embrapa Gado de Corte (Campo Grande – MS), iniciou avaliações preliminares de acessos de capim corrente intercambiados com a Austrália. O objetivo é identificar materiais mais adaptados às condições de cultivo em regiões semiáridas, subsidiando o melhoramento genético de forrageiras, na busca pela melhoria da oferta de forragem e consequentemente, beneficiar a produção animal e a segurança alimentar.
Um programa de melhoramento de gramínea forrageira pode ser compreendido por três fases: 1) avaliação da planta em casa de vegetação; 2) avaliação da planta em campo; 3) avaliação da planta sob pastejo animal. As avaliações do capim corrente em casa de vegetação tiveram início em 2013, sendo realizadas avaliações de produção e desempenho morfológico dos acessos intercambiados (Figura 2). A primeira fase da avaliação em casa de vegetação é importante para que as variações encontradas sejam essencialmente devidas às diferenças genéticas entre os acessos, uma vez que o ambiente é mantido em condições controladas.
Figura 2. Avaliação de capim corrente em casa de vegetação na Embrapa Caprinos e Ovinos (Sobral-CE). (Autoria: Juliana Evangelista).
A próxima etapa é a implementação de ensaios a campo com os genótipos que se destacaram durantes as avaliações em casa de vegetação, considerando-se a possibilidade de incluir caracteres genéticos relacionados a produtividade, qualidade da forragem, tolerância a pragas e doenças etc. Com estas avaliações a campo poderão ser identificados materiais com adaptações mais próximas e adequadas à realidade das condições de cultivo, e assim os mais promissores serão avaliados sob pastejo animal em etapa final para avaliar persistência e desempenho animal.
Da introdução de um acesso ao lançamento de um cultivar são muitos anos de pesquisa para efetivamente identificar um capim que seja distinguível, isto é, diferentes dos existentes no mercado por alguma característica, que no caso da região semiárida é a tolerância à seca. Mas, por ser uma planta forrageira, outras características são determinantes como aceitabilidade do animal, palatabilidade, quantidade de proteína, taxa de rebrota e persistência.
Para os próximos anos, com a estruturação e consolidação de programas de melhoramento de gramíneas forrageiras para o semiárido, espera-se disponibilizar ao mercado forragens mais resistentes às secas e adaptadas às condições de cultivo também nesta região para atender não só às regiões semiáridas existentes, mas também àquelas que estão previstas surgirem com o cenário global de mudanças climáticas.