A divulgação no final de junho da Pesquisa Trimestral do Leite do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), com dados da captação formal de leite no 1º semestre, explicou o comportamento do mercado e dos preços ao produtor ao longo de 2010. O acréscimo de quase 10% frente ao mesmo período no ano anterior, aliado possivelmente a significativos estoques de passagem de 2009 para 2010, ocasionou a queda antecipada nos preços do leite, como havíamos projetado em "Uma tentativa de explicar o mercado em 2010". Mas o que acontecerá nos próximos meses?
Essa resposta será em grande parte influenciada pelo início da safra nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, pela queda de produção na região Sul após pico, e como se comportarão as vendas de lácteos em curto prazo. Em setembro, o mercado se estabilizou e a previsão até o final de outubro é que continue "andando de lado". O cenário interno, portanto, permanece amparado pela redução dos investimentos na produção e incertezas climáticas - se o início das chuvas no Sudeste e no Centro-Oeste será responsável pela retomada na oferta em início de novembro.
A redução na oferta se intensificou nos últimos meses em razão da piora da relação de troca, tanto pela redução do preço ao produtor, quanto pela recente alta dos insumos, e da estiagem na região central do país. O preço ao produtor apontou redução desde maio e somente em setembro parou de cair, segundo o Cepea. Nesse período houve uma redução de 13,3% no preço médio ao produtor, saindo de R$ 0,7984 para R$ 0,6923/litro.
A piora da relação de troca pode ser observada na tendência baixista do nosso cálculo de "Receita Menos Custo da Ração", em que estimamos a receita obtida proveniente da produção diária de uma vaca 20 kg menos o custo de uma dieta contendo soja, milho e sal mineral. Como se pode observar no Gráfico 1, apesar de estar acima da média histórica, o valor de RMCR tem decrescido e a tendência é de piorar ainda mais.
Gráfico 1. Receita Menos Custo da Ração (vaca de 20kg/dia), deflacionada.
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No caso da soja, houve acréscimo de 16,5% no preço médio de maio a setembro e a previsão no mercado futuro da BM&FBOVESPA é de que esse valor ainda aumente aproximadamente 17% para o próximo ano. No caso do milho, o acréscimo no mesmo período foi de 30,5% e no mercado futuro a projeção é de uma valorização de 21%.
Entretanto, nesse momento a principal variável que afeta a oferta é mesmo o clima. A safra no Sul já se encontra em declínio e, portanto, todos os olhos estão voltados para quando terá início a safra na região central do país.
Alguma quantidade de chuva já foi observada nessa região, porém, ainda insuficiente para o desenvolvimento das pastagens. Chuvas intensas e generalizadas devem ocorrer somente a partir da primeira semana de novembro e mesmo assim, até o fim do verão, espera-se alternância entre meses chuvosos com períodos mais secos, sem caracterizar obrigatoriamente período de estiagem.
Existem algumas exceções. No norte do Paraná e no oeste de São Paulo, por exemplo, o efeito La Niña será mais sentido e a irregularidade na distribuição da precipitação será maior. Tanto que em novembro, o acumulado não chegará aos 100 mm nas duas áreas, com expectativa de ausência de chuvas até meados do mês, segundo consultor da Somar Meteorologia.
A safra no Sudeste demorará ainda entre 15 a 30 dias e com pouco estímulo para grandes aumentos.
Em termos de vendas, o mercado apresentou leve recuperação na segunda quinzena de setembro e estabilidade já no início de outubro. Segundo agentes de mercado consultados pelo MilkPoint, tratou-se mais de um reajuste de preços do que uma reação propriamente dita.
O mercado de queijos é o que se apresenta em melhor situação, com valores no atacado entre R$ 9,80 a 12,30/kg e sem estoques. O leite UHT teve uma leve recuperação no final de setembro, mas não conseguiu manter seu preço, ficando entre R$ 1,30 a 1,60/litro, dependendo do estado/fabricante. Em São Paulo, o UHT chegou até a R$ 1,70/litro no atacado, mas voltou. No caso do leite em pó, que se encontrava na entressafra em situação bastante desfavorável, o mercado se firmou, com valores no atacado entre R$ 6,60 a 7,50/kg e algumas marcas chegando até a R$ 8,70/kg. Apesar de não ter apresentado recuperação nos preços, segundo agentes de mercado, as vendas melhoraram girando os estoques e reequilibrando-os.
O leite spot (comercializado entre indústrias) subiu e depois se manteve no período que compreende a segunda quinzena de setembro e primeira de outubro. Os valores observados na região Sul foram de R$ 0,65 a R$ 0,70/kg até R$ 0,74/kg. Na região central, onde houve maior demanda pelo produto, os valores médios passaram de R$ 0,72-75/kg para R$ 0,80 (acréscimos entre 5 até 9 centavos de real).
Por essas razões, acreditamos em uma nova manutenção do preço ao produtor em outubro, exceto nos casos em que os preços estão muito baixos, quando pode ocorrer algum repasse.
Se a previsão de oferta atrasar, esse cenário pode mudar. Mesmo assim, a partir de uma estimativa de déficit ou excesso de consumo mensal, projetamos que outubro será outro setembro. Como se pode observar no Gráfico 2, uma simulação de consumo e oferta ao longo dos meses, outubro deve apresentar equilíbrio entre estoques, oferta e consumo.
Gráfico 2. Déficit ou excesso de consumo mensal acumulado (em milhões de litros) - Supondo estoques iniciais de 600 milhões de litros.
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De positivo, fica a previsão de que entraremos em 2011 com um mercado mais ajustado em termos de oferta do que foi 2010, com estoques de passagem menores e menor crescimento da oferta.