Este texto é parte da palestra apresentada por Joseph C. Dalton, no XIV Curso Novos Enfoques na Produção e Reprodução de Bovinos, realizado em Uberlândia em março de 2010.
Introdução
A seleção do sexo dos animais é possivelmente uma das técnicas de reprodução mais pesquisadas e mal compreendidas da história. Segundo Garner e Seidel (2008), Democratis (470-402 AC) havia sugerido que o testículo direito produzia machos e o esquerdo fêmeas. É claro que isso não é verdade, uma vez que existem duas populações de espermatozóides no ejaculado de mamíferos. Uma é portadora do cromossomo sexual X e a outra do Y. Já foram relatadas muitas diferenças entre os espermatozóides portadores dos cromossomos sexuais X ou Y, incluindo tamanho, peso, velocidade, cargas elétricas de superfície e proteínas macromoleculares de superfície (Garner, 1984; Garner and Seidel, 2008). Mesmo assim, essas diferenças são tão pequenas que não é possível medi-las com precisão em espermatozóides individuais (Garner and Seidel, 2008).
Garner et al. (1983) descreveram o uso de citometria de fluxo para tentar diferenciar a quantidade de DNA de espermatozóides X e Y de bovinos, ovinos, suínos e coelhos. Infelizmente o procedimento usado inicialmente por Garner et al. (1983) matava os espermatozóides. Foi apenas no final da década de 1980 que o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) refinou procedimentos para separar espermatozóides vivos por sexo usando citometria de fluxo (Johnson et al., 1987a; Johnson et al., 1987b; Johnson et al., 1989). O USDA patenteou essa tecnologia para separação de espermatozóides em 1991.
Em 1996, a XY Inc., uma empresa localizada em Fort Collins, Colorado, EUA se tornou a proprietária exclusiva da licença para a sexagem de espermatozóides de mamíferos não humanos usando a tecnologia desenvolvida pelo USDA. Também em 1996, a Cytomation, Inc. deu início à produção comercial de um citômetro de fluxo/separador de células chamado "Mo-Flo." Ao longo dos anos a XY Inc. trabalhando com o separador de células Mo-Flo e com pesquisadores da Colorado State University aprimorou a técnica e os procedimentos desenvolvidos inicialmente pelo USDA. Em 2003 a licença para sexagem de espermatozóides foi concedida à Sexing Technologies (Navasota, TX, EUA). Em 2007, a Sexing Technologies comprou a XY. A Sexing Technologies possui atualmente laboratórios em todos os principais centros de IA nos EUA e no Canadá, com operações adicionais no Brasil e na Holanda.
O interesse por sêmen sexado é grande em todo o mundo. Existem muitas oportunidades e desafios associados ao uso desse tipo de sêmen. Antes de descrever os resultados de pesquisas e oportunidades para sua utilização, é importante entender como os espermatozóides são separados e os desafios associados ao processo.
Como são separados os espermatozóides X e Y?
Como mencionado anteriormente, existem duas populações de espermatozóides no ejaculado de um touro, sendo uma portadora de cromossomos sexuais X e outra Y; os óvulos das vacas são todos portadores do X. Quando um espermatozóide X fertiliza um óvulo, desenvolve-se uma fêmea (XX) e quando um espermatozóide Y fertiliza o óvulo, desenvolve-se um macho (XY). As proporções de machos e fêmeas nascidos costuma ser muito próxima a 50:50. Para um produtor de leite isso significa a produção de poucas bezerras para reposição e um excesso de bezerros vendidos para abate. A possibilidade de selecionar o sexo das crias dos animais do rebanho pode ter impacto significativo sobre a genética e sobre a economia do rebanho leiteiro.
Imagine bezerras e bezerros misturados em um curral antes de entrar no brete. O brete dá para dois portões separados, um onde você coloca as bezerras e outro os bezerros. Quando os animais passam pelo brete você consegue ver quais são os machos e quais são as fêmeas e direcioná-los para o portão certo.
A separação dos espermatozóides X e Y usando o citômetro de fluxo/separador de células é bem parecida com a situação descrita acima. O cromossomo X é maior e contém aproximadamente 3,8% mais DNA do que o Y (Garner et al., 1983). Após o tratamento dos espermatozóides com um corante fluorescente, o espermatozóide contendo o cromossomo X brilha mais quando exposto a laser do que o Y devido a essa diferença na quantidade de DNA. Depois, à medida que os espermatozóides fluem em fila única pelo separador, uma carga elétrica positiva ou negativa é anexada dependendo da intensidade de fluorescência da célula. Os espermatozóides passam então por um campo elétrico e os espermatozóides X ou Y são separados para tubos de coleta diferentes. Segundo Schenk e Seidel (1999) e Johnson e Welch (1999), quanto maior a precisão da sexagem, menor o número de espermatozóides sexados por unidade de tempo. Para chegar a 90% de pureza para um determinado sexo, as taxas de separação mais comuns para sêmen bovino estão entre 3000 e 8000 células por segundo (Johnson and Welch, 1999; Seidel and Garner, 2002; Garner and Seidel, 2008; Sharpe and Evans, 2009). Conseqüentemente, o processo é considerado bastante lento, já que leva aproximadamente 1 a 2 horas para sexar o número de espermatozóides contido em uma dose de IA. (20 a 25 milhões de espermatozóides, ou seja, 20-25 × 106 espermatozóides).
Resultados de pesquisas com novilhas
Como não é economicamente viável produzir uma única palheta de sêmen sexado (com 20-25 × 106 espermatozóides) por hora, as pesquisas estão enfocando na maximização da fertilidade dos espermatozóides sexados, congelados e descongelados (1,5 × 106 a 3 × 106; Tabelas 1 e 2). Além disso, as pesquisas com sexagem foram conduzidas principalmente em novilhas, pois esses animais bem manejados tendem a apresentar taxas de concepção (resultante de IA com sêmen convencional congelado e descongelado) de até 70%, comparado a menos de 40% para vacas em lactação.
Quase todos os experimentos iniciais forneceram evidências de diminuição na taxa de concepção de novilhas leiteiras após a IA com sêmen sexado quando comparado ao sêmen convencional. Como apresentado nas Tabelas 1 e 2, a amplitude das taxas de concepção após IA com sêmen sexado, expressa como porcentagem da taxa de concepção obtida com sêmen não-sexado, foi de 44 a 100%. (Vale observar que o valor de 100% é uma anomalia, já que não há nenhum outro estudo documentado no qual a taxa de concepção após IA com sêmen sexado tenha sido igual à do sêmen não sexado). A taxa de concepção média com sêmen sexado, expressa como porcentagem da taxa de concepção obtida com sêmen não sexado, foi de aproximadamente 66% em todos os estudos apresentados nas Tabelas 1 e 2 . Finalmente, não há evidências de que depositar o sêmen no corno uterino melhora a taxa de concepção quando comparado com depositá-lo no corpo do útero. (Tabelas 1 e 2).
Tabela 1. Resumo de três estudos de campo realizados no Colorado, EUA, com sêmen sexado congelado-descongelado em novilhas Holandesas ┼.
Tabela 2. Resumo de três estudos de campo realizados com sêmen sexado congelado-descongelado em novilhas Holandesas ┼.