Marcelo Pereira de Carvalho

Intuitivamente, todos sabem que o tratamento gentil das vacas reduz o stress e tende a melhorar o desempenho. Pessoas que trabalham com vacas devem ter paciência, boa vontade e ser gentis ao lidar com os animais, evitando movimentos bruscos, gritos e violência. Dados de pesquisa indicam que dar choque ou bater em vacas pode reduzir a produção de maneira imediata em até 10%. O problema é que as vacas são extremamente habéis em guardar aspectos positivos e negativos na memória. Os aspectos relacionados à "memória do medo" são permanentes e devem ser evitados. Dentro disto, a primeira impressão do animal em cada situação é a mais importante. Se a experiência da novilha em sua primeira ordenha é negativa, por exemplo se ela apanhou ou tomou um choque, há a possibilidade de associação da ordenha com algo desagradável, o que evidentemente não é desejável.

Um trabalho realizado com ratos mostrou bem como os animais reagem ao primeiro contato. Em um primeiro grupo de ratos, foi permitido o acesso em um ambiente com alimento, mas os animais receberam um choque no primeiro contato. A partir daí, mesmo sabendo que havia alimento, os ratos não entraram mais no ambiente. Em outro grupo, o acesso foi liberado sem choques até o quinto acesso. A partir daí, foi dado o choque. Os animais continuaram a entrar mesmo após o choque, pois já tinham associado o ambiente ao alimento e não ao choque. Isto mostra bem o efeito memória que se desenvolve ao primeiro contato.

Os animais normalmente são arredios a novas instalações e mudanças no manejo. Desta forma, é preciso que haja cuidado ainda maior quando estas modificações são feitas, visto que a tendência natural por parte da vaca é demonstrar algum tipo de restrição. Se a mudança for traumática, os efeitos podem ser desastrosos. Uma das formas mais adequadas de fazer mudanças ou introduzir os animais a novos ambientes é deixá-los explorar voluntariamente estes ambientes. Isto pode ser feito facilmente em rebanhos menores, como por exemplo deixar novilhas entrarem na sala de ordenha antes da parição. Em rebanhos grandes, fica mais difícil.

Na ordenha, onde a tranquilidade da vaca é fundamental, uma vez que é o local de coleta da produção, é preciso redobrar as atenções. Os animais defecam muito na ordenha ? Há relutância em entrar nas contenções ? As vacas ficam palpando com as patas traseiras ? A ruminação cessa com freqüência ? O animal fica em posição de alerta ? Muitos animais tentam dar coices ? São todos sintomas de que algo não vai bem com o manejo, seja ele originado pelas pessoas, seja originado pela instalação.

Pesquisadores franceses demonstraram que bezerras e novilhas que são frequentemente manejadas com grande contato humano se tornarão vacas mais calmas e diminuirão a distância de fuga, aquela distância a partir da qual a vaca foge do contato humano.

As vacas não reconhecem rostos humanos, apenas lugares, odores, vozes, roupas e objetos. Os especialistas em comportamento animal recomendam que um ordenhador por exemplo nunca deve executar tarefas que podem ser associadas à dor, como vacinações, tratamento de casco, etc. Aproveitando, este tipo de tarefa não deve nunca ser feita durante à ordenha. Idealmente, deveria haver um local especial para tratamento veterinário; a vaca entenderia que o restante da fazenda é "seguro". Momentos e locais associados à alimentação também devem ser preservados em relação ao manejo.

Também, pessoas que lidam com as bezerras devem utilizar roupas com tonalidade semelhante aos ordenhadores, visando adptar os animais a estes últimos após a primeira parição. Ainda, os especialistas chegam a sugerir que pessoas responsáveis por tarefas associadas à dor devem usar roupas diferentes; se for a mesma pessoa que maneja os animais no dia-a-dia, é aconselhável utilizar uma vestimenta especial no momento de execução destas tarefas; deste modo, os animais associam o trauma à roupa e não à pessoa.

Porém, um trabalho realizado no Canadá mostrou que as vacas associam a memória mais às pessoas do que às vestimentas. Um rebanho foi ordenhado por 2 pessoas, sendo uma hostil e outra gentil. As roupas utilizadas pelos 2 ordenhadores também foram diferentes. As vacas claramente evitaram o ordenhador hostil, mesmo quando as roupas foram trocadas entre eles. Ainda, as vacas submetidas ao tratamento hostil tiveram 70% a mais de leite residual após as ordenhas, o que resultou não só em menor produção de leite, mas também maior risco de mastite. É fundamental que todos aqueles que lidam com as vacas gostem do que fazem e sejam gentis.

Um outro trabalho avaliou o efeito de vários tratamentos cujo objetivo era verificar o efeito destes no tempo que os animais levavam para percorrer determinada distância, no caso um corredor de 10 m. A tabela abaixo mostra o tratamento e o tempo médio decorrido. Quanto mais demorado, mais negativo era o efeito do tratamento. Nota-se que o pior manejo foi o que submeteu as vacas a gritos por parte do tocador e o melhor foi simplesmente deixar as vacas caminhar sem estressá-las.



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fonte: MilkPoint