Tais números evidenciam que muitos produtores deixaram a atividade leiteira, porém, os que permaneceram aumentaram suas produções. Este fenômeno não é uma particularidade brasileira, mas sim mundial. Nos Estados Unidos, maior produtor de leite mundial, o número de produtores de leite reduziu de 5.514.000 em 1910 para 68.500 fazendas em 2010. Uma reflexão a ser feita é, se muitos deixaram a atividade, porque outros permanecem produzindo e quais as razões para o sucesso ou insucesso na atividade?
Nas últimas décadas, as fazendas leiteiras têm aumentado em tamanho e o foco da gestão mudou de curativa para preventiva. Embora seja um aspecto multifatorial, o aumento da competitividade dos sistemas de produção de leite pode depender do aumento da escala de produção e do sistema de produção utilizado.
Pesquisas mostram que há uma diferença significativa entre as percepções de técnicos e produtores de leite, quanto ao processo administrativo nas áreas de produção, finanças, comercialização e recursos humanos dos sistemas de produção de leite. Esta diferença de percepção, a começar pelos objetivos que os produtores vislumbram para seus sistemas de produção, podem levar à distorções na atuação dos técnicos nos sistemas assistidos por eles, e consequentemente o comprometimento dos resultados possíveis de serem alcançados.
Avaliando resultados de propriedades leiteiras nos estados de Minas Gerais e São Paulo, os números mostram que a alta produtividade não significa sempre maior benefício econômico, que a produção de escala de leite tem influência no custo total do litro de leite, e que as análises de viabilidade produtiva de sistemas de produção, necessariamente, devem compor análises de custos e receitas. Há ainda trabalhos que mostram que a rentabilidade do capital imobilizado foi menor que o rendimento da caderneta de poupança, demonstrando que o retorno de investimento está abaixo do desejado.
Outras pesquisas realizadas com o objetivo de avaliar diferentes sistemas de produção e níveis tecnológicos, apresentam em comum a conclusão preocupante de que a atividade leiteira tem condições de produzir a médio prazo, mas a longo prazo constatou-se que os produtores se descapitalizam.
De modo geral, pode-se afirmar que a baixa produtividade da pecuária leiteira e os elevados custos de produção, evidenciam a necessidade de se modernizar e profissionalizar a administração do empreendimento, com vistas à melhor alocação e combinação dos recursos produtivos. É preciso , que os produtores de leite adotem práticas de gestão fundamentadas no planejamento da produção, organização rural e controle de atividades e processos, notadamente controles zootécnicos e administrativos. Além disso, é necessário que a tecnologia disponível seja plenamente compreendida e utilizada de forma eficiente, garantindo a alimentação e o manejo adequado do rebanho, assim como o uso da capacidade máxima instalada e obtenção de uma melhor rentabilidade na atividade leiteira.
O sucesso da atividade leiteira não está associado ao tamanho da propriedade ou volume de produção, embora estes aspectos influenciem nos resultados, mas o mais importante é "como" a propriedade é conduzida. Administrar é decidir o que fazer e o que não fazer, tomar as decisões adequadas quanto à tecnologia a ser adotada, mudanças no sistema produtivo, correr riscos.
Como regra, pode-se afirmar que o caminho para viabilizar a atividade no campo é a qualidade gerencial. Com ela, o empreendimento se profissionaliza, moderniza e começa a ser encarado como empresa de fato, que busca obter conhecimentos acerca dos mercados em que opera e procura estreitar seus relacionamentos. Antes a preocupação era apenas com o que acontecia dentro dos limites de sua propriedade, mas hoje se tornou uma questão de sobrevivência obter informações sobre a dinâmica mercadológica e utilizá-las na gestão da propriedade.
A melhoria na gestão se efetiva por meio de um processo educacional contínuo e principalmente de querer. Isso demanda tempo, energia, esforço, paciência, perseverança e novas competências por parte de todos, em especial do proprietário, do administrador e da assistência técnica. O êxito ou o fracasso deste processo de mudança em busca de uma nova forma de se ver e fazer as coisas está intimamente ligado ao maior ou menor esforço do produtor e administrador, além do comprometimento, em fazer as coisas acontecerem na propriedade rural.
O êxito na atividade no passado, não garante o mesmo resultado agora ou no futuro, basta olhar a sua volta e em sua rede de contatos para constatar a saída de muitos produtores da atividade leiteira. Aos produtores, administradores e técnicos de campo, cabem a reflexão sobre esta mudança com foco na gestão por resultados, pois ela pode ser decisiva para a sobrevivência ou não na atividade.
No próximo artigo abordaremos o conceito de gestão, suas limitações no meio rural, e a importância do empresário enquanto líder.
Referências
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Ricardo Ferreira Godinho é Zootecnista, Mestre em Produção Animal, e fez Especializações em Administração Rural, Consultoria Organizacional, Gestão Empresarial.
Iniciou sua atividade profissional como técnico de campo da Casmil/Passos, onde atuou por 9 anos. Experiência como consultor por 16 anos pelo SEBRAE Minas e de outros estados em programas de capacitação em gestão empresarial, liderança, empreendedorismo, Programa de Gestão da Qualidade (urbana e rural), atuando na capacitação de consultores e desenvolvimento de metodologias. Já atuou também para o Centro CAPE, Rehagro e como autônomo.
Experiência de 10 anos como Professor Universitário (UEMG Unidade de Passos) em cursos de graduação e pós graduação.
Produtor Rural, sócio da Agropecuária Tucaninha, a qual destaca-se pelo Prêmio de Excelência Empresarial (2007) e participação no TOP 100 desde 2003.