A metodologia se utiliza de uma chave analítica. Em cada seção, você identifica qual das opções se aplica ao seu caso e segue para a próxima consideração. Tenha em mente que o universo de propriedades é muito complexo. Tentamos aqui algo quase impossível, tratando todos os casos como se fossem simples. Mas funciona. Veja você mesmo.
Por experiência, escolhemos dois aspectos chaves que nos ajudarão, de forma rápida e simples, a lhe revelar como se encontram as coisas. São eles o custo operacional por litro produzido e a escala de produção.
Definições importantes
Antes de prosseguir você tem que entender os seguintes parâmetros que serão utilizados:
a) Custo operacional total sem mão-de-obra (COT s/MO): é o desembolso + depreciação. Do ponto de vista gerencial, o COT é tudo aquilo que se gasta, mais o que se desgasta no processo produtivo. Representa o mínimo que tem que ser coberto pela atividade para não haver descapitalização. O que sobra é o lucro operacional ou margem líquida, montante disponível para o desfrute do produtor e sua família. Para esta análise específica precisamos dele sem a MO (salários e encargos), porque a capacidade de remuneração desta nos será indicada por PMM/PCE, abaixo, e pelo que sobra para tal compromisso.
b) Proprietários e colaboradores efetivos (PCE): número de pessoas que precisam ser remuneradas pela atividade, direta ou indiretamente. Deve incluir proprietários, sócios, parceiros, funcionários e filhos atuantes. São todas as pessoas que efetivamente trabalhem na propriedade. Para filhos e funcionários podem ser adotados valores parciais para compensar quem trabalha menos tempo, ou com menos intensidade que o padrão. Os demais, considerar sempre 1 cada pessoa (mesmo no caso de proprietário/sócio que more na cidade).
c) Produção média mensal (PMM): volume anual vendido dividido por 12. Utilizamos aqui como uma medida absoluta de escala.
d) Produção por pessoa (PMM/PCE): obtido dividindo os parâmetros acima. É uma medida de escala relativa à mão-de-obra e à remuneração do produtor. Você pode pensar como "litros por pessoa por mês", mas lembre que pessoas são essas (PCE).
CHAVE ANALÍTICA
Vamos começar.
Seção A:
Identifique a opção que mais proximamente se aplica ao seu caso e siga as instruções.
A.1) "Conheço o COT do leite que produzo" >>> vá para Seção B
A.2) "Não conheço COT do leite que produzo" >>> vá para Seção D
Seção B:
Parabéns por conhecer seus custos! Você faz parte de uma minoria de produtores no Brasil (cerca de 1 a cada 1.000 produtores). Continue abaixo:
B.1) Seu COT s/MO é menor que R$0,80/L >>> vá para Seção C
B.2) Seu COT s/MO é igual ou maior que R$0,80/L >>> vá para Seção E
Seção C:
C.1) PMM/PCE é menor que 5.000 L >>> veja R.1 (Seção R)
C.2) PMM/PCE está entre 5.000 e 10.000 L >>> veja R.2 (Seção R)
C.3) PMM/PCE está entre 10.000 e 15.000 L >>> veja R.3 (Seção R)
C.4) PMM/PCE é maior que 15.000 L >>> veja R.4 (Seção R)
Seção D:
O que não se conhece, não se controla. Foi-se o tempo em que se podia tocar uma atividade produtiva sem conhecer seus custos. O descontrole dos custos faz com que haja um esbanjamento irresponsável nas altas de preços e um desespero desnecessário nas quedas. Convença-se disso e use o conhecimento a seu favor.
"Ah isso dá muito trabalho". Depende, há formas e formas. Recomendamos começar com a mais simples possível. Se você não acha isso importante ou não encontra tempo para tal controle, muito provavelmente você não está preparado para administrar um negócio.
No entanto, para que você não fique sem respostas neste exercício de autodiagnose, apresentamos abaixo sistemas e escalas contrastantes. Veja qual a opção que mais se aproxima de sua realidade (se D.1 ou D.2, com PMM/PCE acima ou abaixo de 5.000 L). A probabilidade de seu custo estar próximo ao indicado é muito alta. Escolha D.1 ou D.2 abaixo:
D.1) Seu sistema baseia-se na produção abundante de pasto e em seu uso eficiente colhido pelas vacas que saem do piquete com sobra de comida; utiliza suplementação de concentrado (ração), usando pouca ou nenhuma silagem no período de abundância de pastos (menos de 8 kg de matéria natural de silagem). Em sua propriedade sobra pasto quando chove e as vacas pastam dia e noite.
Resposta:
D.1.1) Sua PMM/PCE é menor que 5.000 L.
Seu COT s/MO gira entre R.$0,75 e R$0,85/L quando há pasto e R$0,85 e R$1,00 quando não há. Nas condições atuais seu negócio só é viável em períodos de muito bons preços (1 ano a cada 3). Seu principal problema é escala de produção. >>> Vá para a Seção Final.
D.1.2) Sua PMM/PCE é maior que 5.000 L.
Seu COT s/MO gira entre R.$0,60 e R$0,75/L quando há pasto e R$0,75 e R$0,85 quando não há. Você está no caminho certo e faz parte de um grupo seleto de produtores. Parabéns!!! Mas não se acomode, pois é possível e necessário melhorar ainda mais. Contabilize seus custos e comprove se estamos certos. Busque um COT médio anual de no máximo R$0,75 onde a depreciação não passe de R$0,10/L. >>> Vá para a Seção Final.
D.2) Seu sistema baseia-se principalmente em silagem e concentrado (ração), com ou sem algum pastejo. Se houver pastejo, este é por curto período do dia ou, se for por mais tempo, as vacas não têm abundância de pasto. Se qualquer uma dessas afirmações se aplica a sua propriedade, siga abaixo (D.2.1 ou D.2.2).
Resposta:
D.2.1) Sua PMM/PCE é menor que 5.000 L.
Seu COT s/MO gira entre R$0,85 e R$1,10 como média anual. Você tem um grave problema de escala combinado com ineficiência. O volume de leite produzido não é capaz de sustentar, satisfatoriamente, as pessoas que dele dependem. É a típica situação onde alguém está se sacrificando em excesso para poder contar com outros. É um empreendimento que poderá sobreviver por algum tempo, mas mais cedo ou mais tarde a pessoa mais sacrificada desistirá, colocando em risco todo o negócio.
Embora possa lhe soar estranho, há uma participação muito pequena da alimentação no seu COT (menos de 50%). Sua "máquina produtiva" é pesada demais para o leite que produz. A alimentação deve representar próximo a 60% do COT, pois é ela que se converte em leite.
Não se desespere. O setor que você escolheu é viável e promissor. Seu futuro depende de você adquirir mais conhecimento, se cercar de boas orientações e tomar as decisões corretas. "Mais leite de forma mais inteligente" é o que você deve buscar. >>> Vá para a Seção Final.
D.2.2) Sua PMM/PCE é maior que 5.000 L.
Seu COT s/MO gira entre R$0,75 e R$0,85 como média anual. Você certamente sabe o que está fazendo, mas tem em mãos um sistema que não lhe fará justiça, por ser pesado demais para lhe permitir margens melhores.
Seu custo atual lhe permite sobreviver e se a PMM/PCE está acima de 10.000 L, este negócio pode lhe proporcionar boa qualidade de vida. No entanto, o capital que você tem imobilizado nesse negócio é alto demais para o resultado que está obtendo. De qualquer forma você merece os parabéns por saber trabalhar e por ter vocação para a produção de leite! Precisa agora ter mais controle sobre ele para seguir fazendo ajustes e melhorar ainda mais a margem operacional. >>> Vá para a Seção Final.
Seção E:
Seu COT s/MO é inaceitavelmente alto para a realidade média do mercado de leite. No momento em que o governo decida remover as barreiras tarifárias de importação nossos preços domésticos tenderão a cair muito e seu negócio não sobreviverá. Isso pode ser amargo de engolir, mas não adianta fugir e o momento de agir é agora. Siga abaixo:
E.1) Se sua PMM/PCE é menor que 5.000 L >>> suba para D.2.1 (Seção D).
E.2) Se sua PMM/PCE é maior que 5.000 L >>> suba para D.2.2 (Seção D).
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Seção R:
R.1) Você tem um problema de escala. O volume de leite produzido não é capaz de sustentar, satisfatoriamente, as pessoas que dele dependem. É a típica situação onde alguém está se sacrificando em excesso para poder contar com outros. É um empreendimento que poderá sobreviver por algum tempo, mas mais cedo ou mais tarde a pessoa mais sacrificada desistirá, colocando em risco todo o negócio.
O único cenário onde esta propriedade é capaz de atender satisfatoriamente as expectativas das pessoas é se for tocada por um casal na terceira idade, sem ninguém mais envolvido (nem filhos, nem funcionários) e algum deles com uma pequena aposentadoria. Se este é o seu caso, parabéns ao casal!
Se não for este o caso, alerta! Sua escala (volume) precisa ser aumentada urgentemente, mantendo seu custo por litro baixo. >>> Vá para a Seção Final.
R.2) Para a realidade atual sua escala é pequena, mas para uma família sem empregados e sem grandes ambições, ela é viável. Para contar com empregados que durem no emprego e ter um mínimo de qualidade de vida para sua família, você precisará de uma PMM/PCE de pelo menos 10.000 L.
Seu custo de produção está numa faixa que mostra que você sabe o que faz, mas sempre há onde melhorar a eficiência.
Concentre-se em aumentar sua escala, começando pelo aumento da produção por vaca, hoje! >>> Vá para a Seção Final.
R.3) Você se encontra numa situação de transição entre os que acham muita dificuldade na atividade e os que constantemente ganham dinheiro com o leite. Você ainda fica reticente quando o preço do leite baixa, mas tende a olhar à frente pois seu negócio sobrevive a crises.
Com seu resultado operacional e sua escala de produção é viável contratar funcionário, mas ainda tem que fazer sacrifícios para paga-los em consonância com o mercado de trabalho e a legislação trabalhista.
Em resumo, você está no caminho certo, sabe o que está fazendo, mas precisa melhorar sua escala e eficiência se quiser contar com funcionários. De qualquer forma, parabéns pelo que já alcançou! >>> Vá para a Seção Final.
R.4) Espetáculo! Você está entre os mais eficientes produtores de leite do mundo. No Brasil estimo que exista um produtor como você a cada 10.000 produtores: você tem eficiência, conhece e controla custos e tem grande escala relativa à mão-de-obra.
Ao longo dos anos temos conseguido descobrir algumas cabeças raras como a sua e é maravilhoso poder ajudar gente assim a crescer e a mostrar o caminho aos demais. Deveria haver uma medalha de honra concedida a produtores com seu perfil. Parabéns mesmo!
Não deixe que isso suba à cabeça. Certamente você não se acha bom assim, mas se não está vendo a cor do dinheiro é porque assumiu dívidas ou está misturando as contas do negócio com as contas da família ou de outra atividade. Siga em frente, pois sempre há o que melhorar. >>> Siga para a Seção Final, abaixo.
Seção Final
Método TRP para cálculo rápido da depreciação
Cada caminhão-tanque que sai de sua propriedade com leite leva consigo parte de seus bens que se desgastam no processo produtivo. Um pedacinho de sua cerca, de seu trator, de sua ordenhadeira vão junto em cada carga. Por esse motivo, você precisa conhecer esse custo para que possa descontá-lo do faturamento e separá-lo mensalmente na forma de uma poupança qualquer que possa ser acessada na hora de repor seus bens.
A depreciação anual de um bem é seu valor atual dividido por sua vida útil futura. O ideal é obtê-la individualmente para cada bem, mas para a finalidade acima propomos um método simplificado, que funciona:
1) Estime e some o valor atual de todos os bens fixos sobre a terra (não incluir os animais) utilizados direta ou indiretamente na produção de leite (cercas, construções, instalações, máquinas, implementos, equipamentos, etc.). Este é o VAe (valor atual estimado).
2) Obtenha a vida útil futura média destes bens conforme o padrão abaixo. Esta será a VUFe (VUF estimada):
- Tudo novo: 20 anos
- Predominam bens novos: 18 anos
- Meia-vida (há tanto bens novos, como velhos e intermediários): 15 anos
- Predominam bens velhos (mas há exceções): 10 anos
- Só bens bastante velhos (situação rara): 5 anos
DEP (TRP) = VAe/VUFe
Este valor é anual (R$/ano). Divida ele por 12 para conhecer a depreciação mensal ou pelo volume de leite vendido anualmente para a depreciação por litro. A depreciação não deve ultrapassar R$0,10/L. Se passar disso você tem um descompasso entre "maquina produtiva" e escala de produção, provavelmente causado por um sistema ineficiente ou mal manejado, ou ainda por haver investido muito em ferro e cimento e pouco em sistema de alimentação.
A grande armadilha que todos caem
Diferentemente das contas pagas (custo direto) a depreciação sobra na mão (é um custo indireto, oculto). Por isso é consumido, desfrutado como se fosse "lucro". Não computá-lo e não poupá-lo leva a uma grande dificuldade de se repor os bens quando eles se terminam.
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Bem, esperamos que este breve exercício tenha lançado mais luz sobre seu negócio. Em momentos de preços baixos, quando as contas apertam, as pessoas tem mais propensão para atentarem à importância do controle. Infelizmente, quando a coisa folga, todos se esquecem novamente.
Um dia a queda de preços se dá de forma intensa ou prolongada demais e, quando isso ocorre, são os que tem as rédeas na mão que sobrevivem, não os que fogem da realidade.
Quando interessados no setor me perguntam "leite dá dinheiro?" eu lhes pergunto: vender sapatos dá dinheiro? A pessoa normalmente responde: "acho que sim, mas depende"... Bem, por que leite deveria ser diferente?
Wagner Beskow
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