O primeiro dia do tour leiteiro reservou duas fazendas para visita: os estábulos, ou establos como são chamados por aqui, Desarrollo Lácteo e La Luna. Ambas na região de Torreón, zona semi-árida e seca, que possui entre 300 a 350 mil vacas distribuídas nos 240 produtores.
A seca, as altas temperaturas - no verão variam de 28 a 42ºC durante o dia e entre 28-30ºC à noite - e a concentração da pluviosidade - chove cerca de 250 mm por ano entre julho a setembro, caracterizam o maior problema da região, a falta de água, e por consequência, o sistema de produção de leite. Os animais são alocados em currais abertos onde se preconiza extensas áreas de sombra, em média 12m2 de sombra por vaca, para reduzir o estresse calórico.
O alimento é produzido a partir de irrigação por inundação, proveniente de poços com 300 a 400m de profundidade (80% da irrigação) e de canais ligados a uma represa (20% restantes). A água é escassa e cara. O que torna o futuro em longo prazo de sistemas de produção como esses, considerando as implicações do aquecimento global na disponibilidade de água, duvidoso. Para a abertura de um poço custa algo próximo de US$ 120 mil, mais custo da água e energia para bombeamento. Além de um controle rigoroso que proíbe a abertura de novos poços artesianos caso outro não seja fechado.
Dentre os alimentos que compõe uma dieta estão: alfafa, aveia, silagem de milho e sorgo, pasta de soja, e milho floculado (99% importado dos EUA).
Desarrollo Lácteo
A Desarrollo Lácteo conta com 3.000 animais em lactação de um total de 6.000 animais (incluindo vacas secas, novilhas e bezerras). A produção média diária por animal nessa época do ano está em 37 litros, mas entre novembro a abril chega a 38,5-39 litros, em razão dos benefícios do abaixamento da temperatura. A produção diária da fazenda varia de 104 mil litros a 120 mil.
Cada animal recebe 25 kg de matéria seca (MS) por dia, fornecidos em 6 porções. O fornecimento se dá nas linhas de alimentação, de 600m, onde um trator com um equipamento adaptado agrupa a ração minimizando as perdas. A ração é composta por 4 kg de alfafa, 20 kg de silagem de milho, 6,5 kg de milho floculado, 4,5 kg de um mix (soja, vitaminas, sal mineral e resíduo de destilaria) e 2 kg de caroço de algodão. Essa ração, que possui 17,5% de proteína, tem um custo de 92 pesos mexicanos (US$ 7,41) por vaca x dia.
i) Equipamento adaptada agrupando a ração; ii) um dos 3 estábulos da propriedade.
O leite é vendido por 4,30-4,50 pesos mexicanos (US$ 0,3464-0,3625) o litro, e o custo total representa entre 75 a 80% desse valor. Toda produção da Desarrollo Lácteo é comercializada para a Cooperativa Al Purina, que capta diariamente 1 milhão de litros, e é uma das maiores cooperativas do México. O pagamento, porém, para produtores com produção dentro da cota chega a mais de 5 pesos (US$ 0,4028).
As vacas são separadas nos 3 estábulos por parição (primíparas e vacas de 2ª e 3ª lactação). A área de sombra por animal é de 17m2, em razão da fazenda não trabalhar com lotação máxima dos estábulos. As vacas secas, em pré-parto e novilhas ficam em locais separados, com estrutura semelhante, porém, com menor área de sombra. A "cama" dos estábulos é de areia e parte de dejetos, que por serem muito secos não causam grandes problemas, e a manutenção é feita com o pisoteio dos animais. Contudo, de 3 a 4 vezes ao ano, todo essa parte do estábulo é reformada. Com o restante dos dejetos se fazem compostos e utiliza-se da água para irrigação das culturas produzidas na fazenda.
A ordenha, realizada 3 vezes ao dia, ocorre em duas salas com capacidade para mais de 1.000 vacas. Uma das salas é do tipo carrossel com capacidade para 32 vacas. Na sala pré-ordenha os animais são aclimatizados por ventiladores de teto e "empurrados" por um portão para o carrossel. Dentro do carrossel, eles são limpos por jato d´água, secos e são colocadas as teteiras. Depois de uma volta eles saem com o desprendimento automático das teteiras e a "força" de um jato da água. O custo estimado de um equipamento desses é da ordem de US$ 1 milhão.
i)Sala pré-ordenha; ii) ordenha tipo carrossel.
Por fim, visitamos o local onde ficam as bezerras. A alimentação desses animais é feita com 6 litros de colostro nos quatro primeiros dias de vida; dos 4 a 35 dias são fornecidos 4 litros de leite (pasteurizado mais sucedâneo) mais 2-3 kg de concentrado; dos 35 a 42 são fornecidos 2 litros mais concentrado livremente; e dos 42 a 60 dias os animais são desmamados. A estrutura onde ficam as bezerras, além da casinha (foto abaixo), tem um telhado com um sombrite protegendo-as de elevadas temperaturas e sol. Foi notável o cuidado com esses animais, e talvez por essa razão, a taxa de mortalidade é menor que 1%.
La Luna
A La Luna faz parte de um grupo de 4 fazendas (La Glória, La Flor e El Sol) controladas pela Cooperativa Lala, que capta entre 6 a 7,5 milhões de litros diariamente no verão e inverno, respectivamente. Por esse volume é considerada a maior cooperativa do México, além de ser proprietária do grupo norte-americano Dairy Farms, o segundo maior grupo do país.
Ao entrar na La Luna ("A Lua") nos deparamos com uma ordenhadeira tipo carrossel com capacidade para 80 animais ao som de música clássica (veja vídeo abaixo), com um sistema automatizado que ordenha 480 animais/hora. Em seguida, fomos recepcionados por Javier Tricio Haro, coordenador do complexo, que nos falou sobre o grupo de 4 fazendas e como era produzido o leite na La Luna. De primeira impressão ficou o grande controle de dados e conhecimento dos custos - haviam enormes cadernos com uma infinidade de dados para cada mês.
Carrossel na Fazenda La Luna - México from AgriPoint Portais on Vimeo.
Ele nos falou que as 4 fazendas juntas possuem cerca de 17 estábulos onde são ordenhadas cerca de 35 mil vacas, com uma produção média de 32-35 litros diários, por 685 empregados. A La Luna é um complexo a parte: são 4 estábulos ordenhando 13 mil animais com média de produção diária atual de 30 litros (no inverno chega até 37-38), 245 empregados no total dos quais 184 trabalham exclusivamente com as vacas. Esses números garantem que a Lala receba, em média, 420 mil litros diários. Outro fator que chamou a atenção na fazenda foi o controle de custos e a rentabilidade do empreendimento. O custo total de um litro de leite tinha variado no ano entre 2,70-2,90 pesos (US$ 0,2366-0,2541) por litro, dos quais 48-56%, dependendo da época do ano, são gastos com alimentação. O valor recebido pelo leite é de 4,50 pesos (US$ 0,3943) por litro, indicando um excelente retorno.
Outros dois fatores chamaram atenção na La Luna: i) o tratamento dos dejetos; ii) a ausência de veterinários. Os dejetos são recolhidos dos estábulos com o emprego do flush, uma espécie de "descarga" e após a separação em porção sólida e líquida e tratamento em lagoa de oxidação, são utilizados como fertilizantes e reutilizados para irrigação ou outros usos da água. Em relação à ausência de veterinários no complexo, Haro explicou que "o trabalho de veterinário como uma espécie de técnico tende a terminar em Laguna - região onde se situa a fazenda. Os funcionários fazem a apalpação e a inseminação com a mesma eficiência dos veterinários. O trabalho deles (veterinários) agora é na forma de consultores". É essa uma das razões que o gasto com mão-de-obra em sua propriedade seja menor que 6,5% do custo do litro do leite.
i) Flush em funcionamento; ii) grande lagoa de oxidação.
Alltech
A participação do MilkPoint no tour foi possibilitada devido ao convite da Alltech, umas das líderes mundiais em nutrição e saúde animal, e organizadora do Global Dairy 500.