Em julho deste ano, representantes do projeto Start-Up Brasil e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI, por meio da Secretaria de Política de Software, SEPIN) tornaram pública a relação de projetos selecionados para a primeira turma. Dentre 908 inscrições, o projeto da empresa brasileira Chip Inside, com uma coleira que gerencia o comportamento de vacas leiteiras, foi aprovado e chamou a atenção do setor leiteiro.

A Chip Inside

Dentre os 45 projetos aprovados, está o da empresa Chip Inside, dos irmãos Leonardo e Thiago Guedes da Luz Martins. A empresa nasceu de um grupo de pesquisa da Universidade federal de Santa Maria (UFSM), que desde o início focou nos projetos voltados para a pecuária leiteira, setor onde se especializou. O desenvolvimento de projetos e produtos eletrônicos para a pecuária de precisão tornou-se o foco principal da empresa que tinha como objetivo a criação de produtos simples e inteligentes que gerassem impacto direto no negócio dos produtores de leite.

O projeto aprovado

A Chip Inside entrou com o projeto de uma coleira, que segundo os empresários, tem a função de monitorar padrões de atividades e ruminação das vacas que, quando comparados, torna possível identificar o momento do cio, um fator de extremo interesse aos produtores de leite.

Em busca de mais informações a respeito deste equipamento, o MilkPoint realizou uma entrevista com a empresa, que segue abaixo:

MilkPoint: Do que consiste a tecnologia que a Chip Inside lançou na Expointer, para os produtores de leite?

Chip Inside: A Chip Inside desenvolveu, ao longo de três anos de trabalho, uma coleira para monitoramento de comportamento de gado leiteiro. Através desta coleira, denominada C-TECH, o produtor consegue gerenciar todo o seu rebanho de maneira simples e eficaz. Este produto além de detectar cio e prevenir contra possíveis doenças, também detecta o nível de conforto e qualidade de vida do animal.


Imagem 1: Coleira C-TECH

A coleira C-TECH que a Chip Inside lançou é integrada a um sistema de três módulos, sendo eles, a própria coleira C-TECH, uma antena e um módulo leitor interativo.
A coleira é o "coração" do sistema. Ela é responsável por alimentar todo o resto. A principal funcionalidade deste módulo está em medir constantemente o comportamento bovino através de níveis de ruminação, atividade e ócio, além de também identificar individualmente os animais do rebanho. Estes dados são transmitidos para a antena, instalada estrategicamente na ordenha, toda vez que o animal aproximar-se da mesma. As transmissões dos dados são feitos no mínimo duas vezes ao dia atualizando em tempo real o comportamento animal.
O módulo antena tem a funcionalidade de comunicar o módulo coleira com o módulo leitor. Ela realiza a transmissão dos dados da coleira para o leitor.
Por fim, o sistema é composto por um módulo leitor de interface com o usuário/cliente final. Este leitor é o cérebro do sistema e é ele que irá analisar os dados de ruminação, atividade e ócio, processá-los e apresentá-los ao produtor de uma maneira clara e objetiva. Especificamente, este leitor, irá desenvolver padrões comportamentais, detectando as variações e gerando diagnósticos automáticos, ou seja, através do comportamento, o leitor saberá informar o período correto de cio, sintomas de possíveis doenças que poderão surgir, e principalmente qual é o nível de conforto e qualidade de vida individualmente de cada animal.


Imagem 2: Uma das telas do programa mostrando informações monitoradas

Este módulo é um "computador" remoto com interface amigável e interativa e será instalado junto da sala de ordenha. O mesmo se comunica com a coleira através da antena.

MilkPoint: Como ela pode beneficiar o produtor?

Chip Inside: A coleira C-TECH é capaz de "traduzir" o status comportamental do animal e, através do leitor, se comunicar de maneira simples e fácil com o produtor de leite. Através deste sistema é possível gerar padrões comportamentais individualizados para cada animal, como também de todo o rebanho.
Através da formação destes padrões comportamentais, o sistema consegue identificar as distorções associadas a pré-diagnósticos característicos, como é o caso da detecção do cio e de sintomas clínicos de algumas doenças.
Com este sistema, é possível detectar o período de cio, apresentando ao produtor o exato momento de inseminação, aumentando consideravelmente as probabilidades de concepção. É importante ressaltar que a reprodução é um dos maiores problemas enfrentados hoje pelos produtores devido às falhas na detecção de cio, muitas vezes potencializadas pelos curtíssimos períodos de manifestação, que podem ser de apenas 10 horas. A detecção de cio para uma inseminação confiável e uma concepção com maior probabilidade de concepção, refletem diretamente na economia do tambor de leite, reduzindo a distância entre partos, otimizando a produção, e gerando mais um animal para reposição de plantel ou para sua comercialização.


Imagem 3: Vaca usando a coleira C-TECH

Com a coleira C-TECH também é possível gerar, através dos desvios comportamentais, pré-diagnosticos de possíveis doenças que irão se manifestar nos próximos dias. Deste modo o produtor consegue atuar preventivamente, antes que alguma doença se manifeste em um estado clínico mais avançado, o que se traduz diretamente em queda de produção do animal ou até mesmo em um possível descarte.
Este sistema vem ao mercado como uma poderosa ferramenta de auxilio ao produtor na gestão do rebanho de gado de leite, possibilitando ao mesmo monitorar o nível de conforto de cada bovino. Através deste controle é possível aumentar o rendimento, a produtividade e a longevidade produtiva dos animais assim como reduzir a taxa de descarte da cabanha. A coleira também realiza a identificação eletrônica individualizada, possibilitando uma rastreabilidade adequada.

MilkPoint: Como surgiu a ideia de desenvolvê-la?

Chip Inside: É impossível falar do surgimento da ideia sem associar diretamente ao surgimento da empresa. A ideia surgiu dentro de um grupo de pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria, o G-Micro (grupo de microeletrônica) onde eu (Thiago) e meus outros dois sócios (Leonardo e João Baptista) enxergamos a possibilidade de realizar, no primeiro momento, uma transferência de tecnologia, desenvolvendo um detector de cio para o gado de leite, produto já existente no mercado. O espírito empreendedor aliado ao grande desafio e a forte vontade de transformar a pesquisa em um negócio de destaque global, nós três fundamos a Chip Inside em 05/08/2010 e começamos a desenvolver já no primeiro ano o detector de cio.
Entretanto, após sete meses de desenvolvimento, a companhia ainda sentia a necessidade de desenvolver um produto com inovação de caráter internacional, ou seja, um sistema que não existisse no mercado. Neste momento a empresa buscou uma parceria junto a Universidade Federal de Santa Maria e ao Laboratório de Ruminantes da mesma, no momento coordenado pelo prof. Dr. Marcelo Cecim, um especialista em gado leiteiro. Após este contato, e através de diversas reuniões e conversas, idealizou-se o projeto de detectar o conforto e a qualidade de vida do animal, o que obviamente, é extremamente importante para aperfeiçoar o rendimento do rebanho do produtor.
A companhia, a partir deste momento, percebeu que poderia desenvolver um produto extremamente completo, podendo inserir nele as mesmas características já existente em outros produtos no mercado, mas também inserir novas e diferenciadas funcionalidades, permitindo uma quantidade de informações muito maior para o produtor de leite em relação ao seu rebanho, de uma maneira fácil e simples.
Desde então, a empresa possui um equipe especializada em diferentes qualificações buscando desenvolver um produto totalmente único e com o perfil do produtor.

MilkPoint: Olhando a equipe de vocês, chama a atenção o fato de que todos são da área de engenharia e computação. Porque o leite? Em outras palavras, qual é a ligação da empresa com a pecuária leiteira?

Chip Inside: A Chip Inside possui sim uma forte equipe técnica de engenheiros e programadores e isto ocorre porque a empresa sempre buscou investir pesado no setor de Pesquisa e Desenvolvimento.
Entretanto, criar e desenvolver novas tecnologias e produtos inovadores não é o suficiente para a Chip Inside, e a empresa também se preocupa muito em que suas criações realmente transformem o mundo do cliente, ou seja, o produtor de leite. Sendo assim, a companhia conta com uma equipe qualificada de veterinários, através de parcerias com o Laboratório de Ruminantes (LABRUMEN) da Universidade Federal de Santa Maria e a empresa júnior TechVet. Estes profissionais atuam junto no desenvolvimento do produto, analisando e validando os dados do sistema, propondo soluções e trazendo a realidade do produtor para dentro da empresa.
Atualmente o leite é um produto fundamental na economia nacional e regional. Só no Rio Grande do Sul, o leite representa 8% do PIB, e a tendência é que esse número continue crescendo ainda mais. Este mercado, hoje, também possui um apelo muito grande no que diz respeito ao aumento de sua qualidade assim como a produtividade que deve subir nos próximos anos devido às necessidades de demanda do mercado. Complementar a tudo isto, analisando o processo de produção deste alimento tão importante, percebemos que existe uma carência muito grande de tecnologias neste segmento, que poderiam facilitar a vida do produtor.
Hoje, existe um grande número de empresas e pessoas desenvolvendo tecnologia para a agricultura, entretanto a pecuária está um pouco "esquecida". A carência da mão-de-obra e a falta de informações, atreladas as fortes exigências do mercado dificultam cada vez mais o gerenciamento do tambo de leite e do seu rebanho. Muitos produtores não conseguem mais atender as necessidades do mercado e alguns têm que sacrificar bons anos de vida para conseguir gerenciar seu tambo e seu rebanho, apenas para manter o seu negócio. Aperfeiçoar a produção e melhorar o rendimento do rebanho, em alguns casos torna-se inviável, independente do tempo dedicado pelo produtor, isto que ainda existam algumas tecnologias, apesar de caras, já desenvolvidas para este nicho.
A Chip Inside compreendeu a necessidade deste produtor, e especializou-se neste mercado, buscando sempre facilitar e melhorar a vida dele e a saúde do seu negócio. Desenvolver tecnologia para um mercado tão importante na economia mundial é um desafio e uma responsabilidade que a empresa assumiu desde o começo.

MilkPoint: Há outros produtos para o setor que vocês estão avaliando?

Chip Inside: Sim, a empresa hoje já possui projetos para novos produtos neste segmento, sempre buscando agregar valor ao processo de produção de leite e melhorar a vida do produtor.
A empresa busca sempre trazer soluções que disponibilizem novas informações e que atuem junto do produtor, de maneira que o mesmo possa utilizar as ferramentas adequadas para atender as demandas de produtividade e qualidade do mercado.

MilkPoint: O ambiente de investimentos para uma startup de tecnologia é favorável no Brasil de hoje?

Chip Inside: Sim, o momento é extremamente favorável às Startups, principalmente para o desenvolvimento de tecnologia e inovação voltadas ao agronegócio. A economia está em forte crescimento e o agronegócio é um dos mercados que esteve bem aquecido nos últimos anos. Entretanto, o crescimento tecnológico deste mercado não tem acompanhado o crescimento econômico e a carência por inovações segue cada vez maior. Sendo assim, algumas empresas e principalmente os governos estadual e federal estão desenvolvendo fortes planos de incentivo para o desenvolvimento tecnológico do setor agropecuário. Subvenções, financiamentos e até mesmo investidores anjos/ aceleradoras despertam cada vez mais interesse e são algumas das reais possibilidades de investimento em startups que desenvolvam tecnologia, principalmente para o mercado do agronegócio.

Sobre a Start-Up

A Start-Up Brasil é uma iniciativa de fomento do Governo Federal, através do Ministério da Ciência e tecnologia e Inovação, e parte do Programa TI Maior, um macroprograma para incentivar o setor de Tecnologia da Informação do país.

Segundo o secretário Virgílio Almeida, titular da Secretaria de Política de Informática (Sepin), “o Start-Up Brasil visa criar no Brasil um espaço especial para o surgimento de empresas com produtos e serviços de TI inovadores. O Start-Up Brasil tem dois grandes componentes: as aceleradoras qualificadas e as empresas nascentes selecionadas pelo Programa, que juntos visam a criar um ambiente competitivo e inovador para ideias vindas das universidades, para projetos vindos de empreendedores e para investidores em busca de produtos e serviços de sucesso. O Start-Up Brasil atrai os talentos tanto do Brasil como do exterior. Trata-se de um programa moderno, ágil e bem estruturado, que combina os interesses das empresas com os objetivos estratégicos do governo. É uma parceria público-privada que tem todas as condições de apoiar as empresas startups de TI”.

A seleção de 2013

Foram analisadas 908 inscrições (672 brasileiras e 236 estrangeiras) por representantes do mercado, da academia e do governo, os quais aprovaram 56 projetos, sendo 45 nacionais e 11 estrangeiros, que farão parte de um programa de aceleração, a ser desempenhado por uma das nove empresas aceleradoras (entidades especializadas na preparação de companhias iniciantes para enfrentar o mercado) habilitadas ao Start-Up Brasil, e que foram escolhidas no início de 2013.

Dentre os projetos nacionais, 12 Estados foram representados, sendo que São Paulo obteve o maior número de aprovados, que totalizaram 13. Minas gerais e Pernambuco ficaram em segundo lugar com 6 projetos cada e os Estados do Rio de Janeiro e Mato grosso do Sul ocuparam a terceira posição com 5 projetos cada. Os projetos internacionais aprovados vieram de 6 países, sendo 5 dos EUA, 2 da Irlanda, e a Argentina, Colômbia e Irsrael tiveram 1 projeto aprovado cada.

 Esta matéria é do MilkPoint com informações da Start-Up do Brasil e da Chip Inside.