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Como abordar a resolução de problemas: um exemplo prático

POR MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

PRODUÇÃO DE LEITE

EM 26/05/2000

7 MIN DE LEITURA

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Marcelo Pereira de Carvalho

O trabalho com organismos vivos (plantas, animais, humanos) tem como uma de suas características principais uma certa dose de impresivibilidade. Esta incerteza é causada principalmente pela complexidade das relações que envolvem o ser e o meio ao seu redor. O resultado final é que, em biologia, 2+2 nem sempre é igual a 4. Esta característica complica a vida de quem atua na área, pois os procedimentos adotados podem gerar resultados inesperados, exigindo um enfoque abrangente para compreender as diversas interrelações, além de muita disposição para o aprendizado contínuo.

Para ter algum sucesso profissional, é necessário minimizar o imponderável, procurando controlar aquilo que está ao nosso alcance. Este controle tem como base o conhecimento técnico, mas como ponto de diferenciação o processo investigativo que deverá nortear a ação técnica.

Este artigo exemplifica o correto diagnóstico técnico de problemas e a avaliação das prováveis causas destes. Simulamos uma situação relativamente simples, na qual um rebanho de leite apresentava incidência elevada de retenção de placenta (RP), desordem que abre caminho para infecções uterinas e pode reduzir a eficiência reprodutiva. Dados dos EUA indicam custo de US$ 319 para cada caso de RP, de modo que o fato não deve passar despercebido do técnico ou produtor. Mais importante do que o exemplo em si é a metodologia de abordagem investigativa, cujos princípios são de aplicação generalizada.


1. Caracterização do problema

Geralmente, alguém da fazenda levanta a lebre: a incidência de RP neste mês foi alta. Devemos começar levantando as seguintes questões:

a) Qual a incidência em % dos partos ? Assume-se que quando a incidência de RP passa de 10% dos partos no período, considera-se que o problema de fato existe.

b) Como está sendo feito o diagnóstico ? O correto é definir RP como a retenção das membranas fetais a partir de 12 horas após o parto. Se não for este o critério (ex: 6 horas), o dado é duvidoso.

c) Com base em quantos animais a avaliação foi feita ? Se tivermos 2 partos em 1 mês e 1 destas vacas teve retenção, a incidência é de 50% ! Sempre que avaliarmos índices, devemos ter à mão o número de animais que compuseram a média. Em rebanhos pequenos, médias mensais são suspeitas, sendo mais interessante trabalhar com médias trimestrais, por exemplo.

d) Como está a flutuação ao longo dos meses ? Um gráfico ajuda muito, trazendo pelo menos os últimos 12 meses. Será que o aumento foi mesmo neste mês, ou já vinha alto antes ? A importância desta análise resulta da tentativa de correlação com clima, nutrição, problemas sanitários, mudança de manejo, etc.


2. Avaliando melhor os animais

Vamos considerar que o diagnóstico está certo, o número de animais é significativo e o problema ocorreu mesmo neste mês. O passo seguinte é avaliar mais de perto o histórico dos animais. Deve-se avaliar os seguintes aspectos:

a) Condição corporal (CC): vacas com CC acima de 4 (em escala de 1 a 5) tendem a ter maior incidência de RP. Também, vacas com CC abaixo de 3,0 tem sistema imunológico deprimido e também tendem a ter mais RP. Se uma destas situações estiver ocorrendo, é importante avaliar o porquê:

- alta CC: vacas com atraso reprodutivo, genética inferior ou dieta muito energética em final de lactação ou no período seco.

- baixa CC: baixo teor de energia em final de lactação e no período seco, falta de conforto para estas categorias, problemas de casco.

b) Como foram os partos ? Partos distócicos ou abortos apresentam chances muito maiores de reter placentas. Logo, se vários dos animais que tiveram RP caírem nesta categoria, avaliar:

- partos distócicos: CC excessiva, matrizes pequenas demais (principalmente animais de 1ª cria), interferência humana no parto, falta de conforto, stress térmico, dificuldade de parto dos touros utilizados na inseminação, gêmeos.

- abortos: doenças (IBR, lepto, brucelose), stress térmico, micotoxinas.

c) Em que animais o problema se concentra, novilhas ou vacas ? Vale a pena ver a % de incidência em cada categoria. Em novilhas, deve ser checado o tamanho e condição corporal ao parto, a nutrição no terço final de gestação e a dificuldade de parto dos touros usados na inseminação artificial. Em vacas, avaliar se o animal apresentava histórico de RP no parto anterior, como foi a lactação passada e o último período seco.

Conferir se algum animal com RP teve problemas significativos nos últimos 2 meses (ex: um problema de casco, uma intoxicação, um acidente), etc. Neste item, o objetivo é ver se o problema é individual ou do rebanho como um todo. Avaliar ainda se o problema se concentra em animais adquiridos de fora recentemente.

d) Como está a incidência de outras desordens metabólicas, especialmente hipocalcemia ? Sabe-se que hipocalcemia reduz a quantidade de cálcio disponível e, com isto, deprime o tônus muscular, dificultando a expulsão da placenta. Logo, esta desordem predispõe o animal à RP, sendo necessário avaliar teor de Ca, P, K e o balanço câtion-aniônico entre outros itens.

3. Avaliando o ambiente e o nível de estresse

Paralelamente à avaliação acima, deve-se checar o ambiente, uma vez que a retenção de placenta é conhecida como a "desordem do estresse". Qualquer aspecto que estresse os animais, seja de manejo, nutrição ou clima, contribui para o aumento da incidência. São comuns casos que, com a mesma dieta e manejo, a RP triplica ou quadruplica nos meses de verão.

Desta forma, é necessário considerar:

- Em que mês o problema ocorreu ? Qual a incidência de chuvas e a temperatura ? Deve-se aceitar valores mais altos no verão, sendo normal atingir 15 a 20% sem que isto seja alarmante.

- Os animais têm abrigo adequado ou ficam sujeitos às intempéries climáticas ?

- Qual era a incidência na mesma época do ano passado ? E do retrasado ? E dos últimos 5 anos ?

- O número de animais parece excessivo no lote pré-parto para esta época do ano ?

- O rebanho está em franca expansão ?

- Houve aumento de produção nos últimos tempos, de forma a exigir mais das vacas?

Pesquisas recentes têm levantado cada vez mais a relação entre perda da função imune e incidência de RP. A chave é o estresse afetando a resposta imunológica dos animais. Observe que todos os itens acima contribuem para o aumento do estresse e lembre-se que o momento mais estressante na vida de uma vaca é o parto.

4. Nutrição

Ao falarmos de nutrição, é importante separar a ingestão total de nutrientes da composição nutricional em si. Vimos que a RP é geralmente causada por estresses variados. Para combater o estresse e se preparar para a lactação, que exigirá muito de suas reservas, a vaca precisa ingerir nutrientes. Desta maneira, além do balanceamento correto da dieta pré-parto, que deve ser feito por um técnico especializado na área, é fundamental que o animal se alimente sem restrições. Assim, checar cada um dos seguintes pontos antes de buscar as causas no balanceamento nutricional:

- Há espaço de cocho suficiente, este está limpo ? Há água de boa qualidade e em quantidade ? Há sombra perto do cocho ?

- Quando há mudança no número de animais no lote o tratador ajusta imediatamente a quantidade ?

- Os animais estão visivelmente perdendo peso no período seco ou no pré-parto ?

- Há como medir o consumo médio de MS no pré-parto (rebanhos confinados) ? Qual é este valor ?

- A dieta está sendo misturada e fornecida corretamente ?

- Há ingredientes com fermentação secundária ou de baixa palatabilidade ?


Em relação à nutrição especificamente, considerando-se que não há erros grosseiros como falta ou excesso de proteína, déficit energético ou falta de fibra, os efeitos nutricionais na incidência de RP residem mais em microminerais e vitaminas. Os níveis de Se, Zn, Cu e vitamina E estão relacionados à incidência de RP. Selênio e vitamina E são anti-oxidantes e, portanto, têm papel fundamental na inativação de radicais livres acumulados em momentos de estresse. Aliás, a RP pode ser tratada como um distúrbio oxidativo, no qual a produção de radicais livres é maior do que sua eliminação. Recomenda-se um mínimo de 0,3 ppm de selênio e 1.000 UI/dia de vitamina E. Também é aconselhável fornecer cerca de 150.000 UI/dia de vitamina A.

5. Sanidade

Por fim, checar a prevalência de doenças infecciosas como IBR, BVD, lepto e brucelose. Avaliar novamente as condições do local de parto. Tem sido feito vazio sanitário ? Há lotação excessiva ? Ainda em relação à sanidade, verificar como está a higiene ao parto quando há necessidade de intervenção.

Em resumo, a avaliação de problemas em rebanhos leiteiros exige uma certa ordenação de idéias, além do conhecimento técnico específico. É muito comum diagnósticos errados levando a atitudes impróprias, ou diagnósticos certos mas avaliação equivocada das causas. A tendência humana é buscar as causas de solução mais fácil ou mais barata, o que nem sempre resolve o problema. Para errar menos e acertar mais, é preciso ter um enfoque abrangente, muitas vezes exigindo um grupo multidisciplinar (nutricionista, veterinário, funcionários, proprietário).

 

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fonte: MilkPoint

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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