A produção de leite nesta região em 2012, segundo o IBGE, foi 3,5 bilhões de litros, representando 10,9% da produção nacional, equivalente à produção do estado de Goiás.
O Nordeste do Brasil tem uma extensão territorial de 1.558.196km² (IBGE, 2013), equivalente ao estado do Amazonas, ocupando 18,3% do território brasileiro.
Com 53 milhões de habitantes, esta região é considerada o segundo maior mercado de lácteos do país. Perde apenas para o Sudeste. Quando se olha o comprometimento da renda mensal das famílias com leite e derivados o maior índice do país está no NE. Mesmo assim, o consumo per capta de leite e derivados só não é menor que o da região Norte.
A Bahia é o maior produtor com quase um terço da produção, que se concentra principalmente na região Sul do estado, onde os índices pluviométricos são elevados e historicamente com boa distribuição ao longo do ano. Na Zona da Mata nordestina, onde se concentra a cultura canavieira, as chuvas também são mais intensas. O mesmo não ocorre no restante da região NE, onde as chuvas são muito irregulares e o volume anual é baixo. A medida que se afasta do litoral para o interior, os índices de chuvas ficam menores. O gráfico abaixo apresenta a média histórica das chuvas ao longo do ano em Pernambuco.
Fonte: elaborado por Bezerra Alves, Merinaldo
Em Pernambuco, segundo maior produtor do NE, a produção se concentra no Agreste. O município de Garanhuns-PE e o seu em torno, tem uma condição muito especial de clima com boa adaptabilidade para as raças leiteiras européias e com elevada densidade na produção de leite.
Em Alagoas e Sergipe o leite se concentra nas regiões do Agreste e do Sertão. Em Batalha-AL e nos arredores, há também um micro-clima que diferencia e favorece a produção. Como exemplo, conheci em Batalha um grupo de apenas 7 produtores que se juntam para comercializar o leite, com volume próximo de 14.000 litros por dia com vacas holandesas apuradas. A produtivdade da vaca de Alagoas é a mais elevada do NE e superior à média nacional.
Até 2008, a produção tem crescido em todos os estados. Conforme a tabela abaixo, de 2008 a 2012 a produção de leite se manteve praticamente estável. No mesmo período Sergipe e Bahia cresceram 14,9% e 13,3%, respectivamente, enquanto Paraíba e Pernambuco decresceram 26,4% e 16,1%, respectivamente. Uma das maiores secas dos últimos anos se passou na região, neste período. O rebanho reduziu significativamente. O que não morreu foi vendido magro para outros estados.
Fonte: IBGE, 2012
Analisando as fortalezas da região para a cadeia do leite podemos relacionar os seguintes pontos:
- Mercado consumidor em plena expansão
- Condições de clima seco que favorece o estado sanitário dos animais com uma baixa incidência de ecto e endoparasitas e facilita a obtenção de um leite de boa qualidade, em função da menor multiplicação bacteriana;
- Tecnologia para produção de suplementos forrageiros (palma + silagem), já bastante dominada pela região;
- Baixo Custo da terra comparado aos demais estados da federação;
- Mão de obra disponível a custos inferiores ao de outros estados;
- Predomínio de solos com boa fertilidade;
- Existência de muitos programas de incentivo ao desenvolvimento.
Como pontos que prejudicam a cadeia do leite e que devem merecer atenção, enumeramos:
- Restrição de água nas fazendas;
- Prazos de pagamentos ao produtor praticados pelo mercado que são incompatíveis com os prazos de venda dos produtos terminados;
- Cultura das queijarias que capta 2/3 do leite produzido;
- Produção de leite com baixa tecnificação, especialmente no que se refere ao manejo do rebanho e controles zootécnicos;
Merece destaque a ousadia do produtor José Cassimiro de Freitas (conhecido por “José Camelo”) que visitei em Águas Belas-PE. Ele canalisou uma água de nascente por 12 km, passando por várias propriedades até chegar na sua.
Fazendo-se uma análise da realidade, anteriormente mencionada, é possível entender que a cadeia regional tem boas oportunidades otimizando as forças e mitigando as fraquezas.
É caro para o consumidor regional comprar o leite importado das regiões Sul e Sudeste, em especial, quando se trata de leite fluido. Aliás, o NE consome cerca de 50% de todo o leite em pó produzido no país.
A seca na região é uma realidade. Com exceção de parte do estado da Bahia, e da Mata nordestina, o volume de chuvas é baixo, mas pior do que isto, é a irregularidade das mesmas ao longo dos anos. De outro lado, o NE tem a “santa” palma forrageira, que regularmente está presente na região do agreste e do sertão nordestino. Um recente desastre, causado pela ocorrência da cochonilha de carmin e de escama, quase dizimou as “roças” desta cultura do NE. Mas com uma resposta rápida dos técnicos já foram encontradas variedades resistentes.
No período normal de chuvas é possível cultivar pastos tropicais, fazer reserva de alimentos, principalmente na forma de silagem de milho ou sorgo. A silagem corrige o baixo teor de matéria seca da palma. O bagaço de cana ou a mandioca desidratada também fazem esta “função”.
Uma dificuldade para suplementar os animais é o elevado custo dos concentrados que, em geral, agrega um frete caro , já que vem de regiões produtoras de grãos, muito distantes. Esta logísica pode ser otimizada com as produções de soja e milho, que se estabelecem, gradativamente, em algumas regiões do próprio NE.
A irrigação também é uma alternativa viável para muitas propriedades. No Oeste da Bahia (Jaborandi) e no leste do Ceará (Limoeiro do Norte) já foram implantados grandes projetos de produção intensiva de leite em sistemas de pastos irrigados.
O NE tem um rebanho cuja produtividade das vacas é bastante variável. Os dados da tabela abaixo, estimados pela Embrapa Gado de Leite com base no IBGE/PPM, 2012, apresentam a produtividade por vaca total e em lactação de cada estado.
Em Alagoas ela é superior à média nacional. Assim como em Pernambuco, o rebanho já é bastante apurado com predominância da raça holandesa. Rebanhos Jersey e um pouco de pardo suiço também estão presentes, além dos cruzamentos de raças européias com zebuinas, com prevalência do girolanda. Já na Bahia, o rebanho é muito pouco produtivo e ainda bastante azebuado.
O quadro permite ainda inferir que a eficiência reprodutiva é muito ruim, uma vez que ao se considerar o n° total de vacas, a produtividade é muito mais baixa, indicando que são muitas as vacas secas no rebanho.
Curiosamente, muitos laticínios do NE apresentam uma boa performance na captação do leite dado a concentração de algumas bacias leiteiras como é o caso da região de Garanhuns ou de Batalha, onde a densidade de coleta é tão boa quanto a do Paraná. Já na Bahia, em razão do tamanho do estado e da dispersão da produção, o custo logístico de captação é mais elevado.
Em algumas regiões, os tanques comunitários estão presentes, com todas as dificuldades que o modelo oferece. Faz-se necessário um melhor trabalho com o objetivo de, ao menos, reduzi-los com mais tanques de menor tamanho e com um menor n° de produtores por tanque.
O parque industrial do NE tem uma capacidade que suporta bem a atual produção. Há uma pequena ociosidade das plantas. Ao todo, são quatro plantas de pó, situadas na Bahia, Pernambuco, Maranhão e Sergipe.
Para envasar leite UHT já são sete as indústrias. No Piauí, Maranhão, Paraíba e Rio Grande do Norte não é produzido leite UHT.
O queijo coalho é o principal derivado lácteo produzido no NE. Ele absorve grande volume de leite. São muitas as queijarias em toda a região.
A qualidade do leite como em todo Brasil requer grandes mudanças. Os tanques coletivos devem ser trabalhados para que sejam menores e o mais próximo possível das propriedades.
Os tambores plásticos, que ainda se vê nos caminhões, precisam ser banidos e os produtroes/ordenhadores necessitam ser melhor preparados para reduzirem a contaminação inicial e a multiplicação dos microorganismos, com o objetivo de reduzir a contagem bacteriana total (CBT).
O teor de sólidos no leite, em geral é baixo, provavelmente em função da dieta que muitas vezes não é tecnicamente balanceada.
As fraudes com soro também tem sido um problema que incomoda a indústria local, particularmente para a produção de leite UHT.
Um dos laboratórios da Rede Brasileira de Qualidade do Leite, o Progene, está situado na Universidade Federal de Pernambuco em Recife.
A ordenha manual é predominante nos sistemas de produção. Há muito ainda que se fazer para introduzir a ordenha mecanizada.
A assistência técnica como em todo país é precária. São muitas as intenções e as iniciativas, mas falta ação organizada. O sistema público de assistência técnica está presente. Porém, falta recursos e uma política forte para o melhor desempenho. Há poucas inicitivas por parte das indúsrias. Todavia, encontramos bons exemplos promovidos pelo Sebrae, Senar e a Universidade. O programa Balde Cheio, da Embrapa Pecuária Sudeste, já tem uma atuação significativa, com muitos casos de sucesso.
A Embrapa Gado de Leite através das unidades “irmãs” no NE, tem procurado interagir com o setor produtivo de leite daquela região.
Segundo especialistas da região devem ser envidados esforços centrados em ações como a criação de grandes barragens no curso das principais bacias hidrográficas da região leiteira; o aumento dos reservatórios (barreiros), das fazendas leiteiras; a criação de adutoras e pontos de distribuição d'água, interligando as principais áreas da bacia leiteira, fornecendo assim água para consumo animal, higienização de equipamentos de ordenha, resfriador de expansão e utensílios, além do consumo doméstico; a criação de centros de produção de forragem, visando atender a demanda dos animais para o período seco, a exemplo do que já acontece no Ceará; a multiplicação das boas praticas de produção através conservação de forragem, colheita de pastos para fenação e/ou ensilagem; plantio de milho e sorgo nas áreas zoneadas (agreste); a intensificação das práticas de produção de palma forrageira redonda, miúda, gigante, orelha de elefante e Ipa Sertânia e a transferência de tecnologias para o controle da cochonilha do carmim e escamas.
A cadeia produtiva precisa e deve se organizar para fortalecer e obter ganhos de sinergia voltados para o desenvolvimento da cadeia do leite regional.