Capins do gênero Cynodon no Brasil
Os capins do Gênero Cynodon, vem ganhando expressão crescente no setor pecuário nacional nos últimos 15-20 anos, mais notadamente a partir da introdução do Tifton-85 no Brasil. Apesar desse renovado interesse, não existem registros precisos da introdução dos Cynodons no Brasil, e o que se acredita é que a “grama seda” ou “grama bermuda comum” (Cynodon dactylon var. dactylon) tenha chegado às Américas junto com os colonizadores, na forma de feno ou de “cama” para escravos nos navios, e a partir daí se disseminado em função de sua alta agressividade e facilidade de produção de sementes.
Principais espécies de capim do gênero Cynodon
Atualmente, as principais espécies desse gênero empregadas como forrageiras são Cynodon dactylon (L.) Pers, denominadas de gramas-bermuda, e o Cynodon nlemfuensis Vanderyst e Cynodon plectostachyus (K. Schum.) Pilg. conhecidas coletivamente como gramas-estrela, e seus híbridos. Entre cultivares puros e híbridos dessas três espécies, existem hoje cerca de dez cultivares de maior emprego como material forrageiro no Brasil.
Produtividade dos capins do gênero Cynodon
Em áreas tropicais, os capins do gênero Cynodon apresentam elevado potencial de produção por animal e por área, e grande flexibilidade de uso, podendo ser empregados para pastejo ou conservação de forragem (feno, silagem ou pré-secado). Com boa fertilidade de solo e manejo adequado, os Cynodons comumente proporcionam produção de matéria seca superior a 20 t de MS/ha/ano, com valor nutritivo que pode ser considerado bom, ao redor de 11 a 13% de PB e 58 a 65% de digestibilidade. Apresentam ainda distribuições estacionais de crescimento mais uniformes (proporção relativa da produção total no “inverno” e no “verão”) quando comparados a outros capins.
Em função de sua exigência por solos férteis, e de características ligadas à sua propagação, que quase sempre é vegetativa (por mudas), os capins Cynodon têm sido empregados principalmente em explorações leiteiras e para a produção de forragem conservada, marcadamente feno.
Histórico de uso
O emprego dos Cynodons no Brasil, durante décadas foi pequeno, sendo Coastcross e Estrela Africana os únicos cultivares amplamente disponíveis aos produtores e destinados a equinos. Nos anos 1980-90, com o lançamento de novos cultivares advindos dos programas americanos de melhoramento genético, essa realidade mudou.
Nesse período, em um intervalo de 5 ou 6 anos vários cultivares como Tifton 68, Tifton 78, Tifton 85, Florico, Florona e Florakirk, foram lançados. Com a chegada de alguns desses materiais ao Brasil os Cynodons logo se transformaram nos “capins da moda” com a disseminação do gênero entre um grande número de produtores.
No ímpeto do modismo, a expansão da área ocupada por Cynodons foi grande, com Tifton 85, o cultivar de maior aceitação ocupando mais de 500.000 ha. No final da década de 1990, seguiu-se o processo comum do ciclo de modismo dos capins. A expansão foi indiscriminada, com pouco ou nenhum critério técnico, acompanhada de mau manejo, culminando com o fraco desempenho das pastagens, e dos sistemas produtivos em que estavam inseridas.
Como conseqüência, houve descontentamento com os capins Cynodon e um certo esquecimento pelos produtores. Mais recentemente, em função de uma série de bons resultados obtidos com os capins do gênero pelas universidades e centros de pesquisa do país, e o surgimento de novos materiais como o capim Jiggs, a adoção dos Cynodons antes baseada em critérios subjetivos, passa a ser feita de forma mais profissional, pautada por objetivos claros e embasada em critérios técnicos e econômicos.
Manejo dos capins Cynodon
O manejo da pastagem se configura em um conjunto de ações relativas ao solo, a planta e ao meio ambiente, englobando práticas ligadas à conservação do solo relativas a sua correção e fertilização, como calagem, gessagem e adubação, ligadas às plantas, como combate a pragas e doenças e ao ambiente oferecido ao animal, como tamanho dos pastos, número de subdivisões, dimensionamento de aguadas e pontos de fornecimento de suplementos minerais, etc.
Em relação aos capins Cynodon, um dos principais pontos a serem considerados em relação ao manejo é o fato de que todos os cultivares apresentam hábito de crescimento prostrado, estolonífero, e algumas também rizomatoso (as gramas-bermuda, mas não as gramas-estrela), o que de certa forma lhes confere a capacidade de formarem estandes densos, com poucos espaços de solo descoberto.
Em função dessa característica são indicados para a formação de pastagens em áreas de maior declividade ou em solos de estruturação fraca, colaborando para a diminuição de problemas com erosão. Por outro lado, necessitam de áreas bem drenadas, não tolerando encharcamento prolongado. A textura do solo não se configura em um fator limitante para os Cynodons.
Preferencialmente, os Cynodons devem ser cultivados em solos profundos e bem drenados, pois como a grande maioria das plantas forrageiras, as únicas limitações em termos de textura são solos muito argilosos em que ocorre grande compactação ou solos muito arenosos em que há baixa retenção de água.
No que diz respeito à fertilidade do solo, os Cynodons podem ser considerados plantas exigentes. Essa exigência, quando comparada, à de outros capins, pode ser percebida na necessidade de calagem, que, tendo por base o método de saturação por bases (V%) como referência, coloca os Cynodons no grupo de maior exigência com valores de V recomendados de 55 a 70%.
Para os outros parâmetros de fertilidade do solo como exigência de P, K, Ca, Mg e S os capins Cynodon situam-se numa faixa semelhante à dos Panicum e Pennisetum produzindo quantidades semelhantes de forragem, na faixa de 20 a 25 t MS/ha/ano. Capins Cynodon respondem bem à aplicação de N, e quando corretamente manejados requerem maior reposição de N para a manutenção de sua produtividade, principalmente em explorações mais intensivas. Melhores resultados tem sido obtidos empregando-se doses de 200 a 300 kg de N/ha ano nessas condições.
Os capins Cynodon são adaptados a uma gama de condições climáticas, fruto da diversidade genética e dos centros de origem desses capins, o que permite que vegetem bem sob as temperaturas de verão do Brasil Central. Uma das maiores limitações em termos climáticos são as baixas temperaturas, o que pode ser percebido pelos valores de temperatura-base para crescimento (Tb), que se encontram na faixa de 15 e 17°C . Isso significa que sob temperaturas médias inferiores a essa faixa, o crescimento é limitado, o que pode ocorrer com certa freqüência no sul do Estado de São Paulo e em toda a região Sul do Brasil, mas raramente em outras regiões do país.
Essa boa adaptação a climas subtropicais deve-se ao fato de boa parte dos cultivares atualmente em uso terem sido selecionados nos EUA, para condições de invernos mais rigorosos, sendo o frequentemente objetivo dos programas de seleção a obtenção de plantas que sobrevivessem ao inverno e voltassem a vegetar na primavera com estandes robustos e produtivos, ao invés de plantas que vegetem no inverno, ainda que irrigadas. Assim, no Brasil é comum que os Cynodons híbridos cessem o seu crescimento no outono (Abril-Maio) e direcionem fotoassimilados para os órgãos de reserva, normalmente rizomas, usando essas reservas na primavera (Setembro-Outubro).
Atualmente, não existem informações detalhadas a respeito das exigências hídricas dos Cynodons, mas de maneira geral as do grupo “bermuda” são relativamente adaptadas a condições de certa restrição hídrica, ao passo que as do grupo “estrela” se adaptam melhor a locais com mais de 800 mm anuais de precipitação. Diferentes cultivares apresentam diferentes níveis de adaptação ao excesso ou ao déficit hídrico, sendo os valores mencionados apenas um indicativo.
De forma geral, para produções na ordem de 15 a 20 t MS/ha/ano seriam necessários de 500 a 700 mm/ano, o que, em função das perdas evaporativas levariam a uma necessidade hídrica da ordem de 1000 a 1200 mm/ano efetivamente aplicados.
Manejo da desfolhação: corte ou pastejo
O manejo da desfolhação consiste no monitoramento e condução do processo de colheita da forragem produzida, buscando alta produção e utilização da forragem por unidade de área, ou da produção animal, otimizando o uso do trabalho, dos recursos e do capital.
Para que o manejo garanta produtividade e longevidade do sistema é necessário conhecer a planta forrageira, suas exigências edafoclimáticas, e seus limites de tolerância à desfolhação (intensidade e freqüência), para que práticas de manejo adequadas possam ser planejadas e a produtividade e sustentabilidade do sistema alcançadas.
Como variáveis de manejo passíveis de controle pelo manejador, a intensidade e a freqüência de desfolhação podem são as principais, pois determinam a composição e a estrutura do dossel forrageiro antes e após a colheita, condicionando o novo crescimento.
A freqüência é o parâmetro que expressa o intervalo de tempo entre os pastejos ao passo que a intensidade determina a severidade (proporção do todo) com que a forragem será colhida.
Capins do gênero Cynodon apresentam grande flexibilidade de manejo, adaptando-se bem a diferentes intensidades e frequências de desfolhação. Isso se deve à combinação de características como porte baixo e crescimento rasteiro (estolonífero) e à preservação dos principais pontos de crescimento dos perfilhos (meristemas apicais), além de área foliar próxima ao nível do solo no decorrer de quase todo o ciclo de crescimento da planta.
Além disso, essas plantas têm alta capacidade de gerar novos perfilhos, o que evidencia sua tolerância à desfolhação drástica (baixa e mais freqüente). Adicionalmente, a variação na relação folha:colmo no decorrer do ciclo de crescimento não é grande, e consequentemente ocorre menor acúmulo de componentes estruturais (celulose, hemicelulose e lignina) mesmo em pastos relativamente mais maduros. Assim sendo, as gramíneas do gênero podem ser usadas de formas diversas, como para pastejo, corte mecânico (fenação, ensilagem, pré-secado) ou diferimento.
De forma geral, trabalhos enfocando o manejo de Cynodons no Brasil e no exterior indicam que para todas as espécies e cultivares do gênero, o intervalo de descanso deve ser próximo dos 28 dias (4 semanas) no “verão” e ao redor dos 42 dias (6 semanas) no “inverno”, sob pena de ocorrer queda na qualidade da forragem acima desse intervalo.
No que diz respeito à altura, a saída deve ocorrer quando o resíduo estiver na faixa de 10 a 15 cm. Em algumas condições especiais, como a produção de feno ou o manejo de uma área de Cynodon para sobreplantio de gramíneas de inverno como aveia ou azevém por exemplo, a altura de resíduo poderia ser um pouco mais drástica, na faixa entre 5 e 7 cm do nível do solo.
Em anos recentes, a pesquisa tem abordado o uso de pastagens sob um novo enfoque, não apenas baseado na combinação entre produção e qualidade do material produzido, mas sim em estudos que tentam entender os diversos processos ligados ao crescimento e desenvolvimento das plantas.
Novos enfoques para o uso de capins do gênero Cynodon
Diversos desses estudos de ecofisiologia, foram conduzidos no Brasil na tentativa de otimizar o manejo de pastagens do gênero Cynodon, e tem obtido resultados mais refinados, específicos para cada cultivar. Tais estudos ecofisiológicos se baseiam no princípio de que as plantas se desenvolvem com base na oferta de fatores de crescimento, principalmente luz, e que dessa forma não crescem de maneira igual ao longo do ano, e portanto, devem ser manejadas de maneira a adequar a estratégia de uso à oferta de fatores ambientais e sua variação ao longo do ano.
De acordo com esse novo enfoque um novo parâmetro deve ser usado como referência de manejo, e este seria a altura do dossel, já que essa é uma característica ligada à capacidade da comunidade de plantas em captar a luz e à eficiência com que essa luz é usada, possibilitando a maximização da produtividade. Assim sendo, o manejo passa a ser um processo dinâmico, já que os intervalos de crescimento se tornam-se variáveis a cada novo crescimento, sendo fixados agora a altura de realização da colheita e de resíduo deixado na área.
Em função do grau de detalhamento necessário para a realização desses estudos, os resultados até agora existentes são limitados a três cultivares de Cynodon, Tifton 85, Florakirk e Coastcross. Para Tifton 85 a altura de dossel para realização da colheita seria ao redor de 25 cm, e de saída por volta dos 15 cm, ao passo que para Florakirk e Coastcross a colheita se realizaria em alturas na faixa de 30 a 35 cm, e um resíduo semelhante ao do Tifton 85.
É fundamental, portanto, entender que as gramíneas do gênero Cynodon são uma boa opção para a formação de áreas de pastagem, mas que são exigentes em fertilidade e condições climáticas para que sua exploração seja economicamente viável, apesar de serem flexíveis e relativamente tolerantes a “erros” de manejo.
Em função da combinação da exigência em fertilidade com o fato de serem estabelecidas vegetativamente, sua implantação é cara, exigindo uma exploração intensiva para que o investimento inicial seja amortizado num prazo adequado. Essa perspectiva é viável, pois os resultados de pesquisa sobre os Cynodons indicam que a produção de forragem e valor nutritivo desses capins quando devidamente manejados, são altos e compatíveis com níveis de ganho de peso na faixa de 0,35 a 0,75 kg/cabeça/dia, e produtividade animal entre 550 a 1.200 kg de ganho de PV/ha/ano.