Em razão do impacto econômico da mastite nos rebanhos leiteiros, seja pela diminuição da produção ou pela penalizações devido à baixa qualidade do leite, a correta identificação do patógeno é de extrema importância. Essa identificação auxilia o produtor na tomada de decisões, já que permite a conhecer a principal forma de transmissão (ambiental ou contagioso) e manifestação (casos clínicos ou subclínicos). A rápida identificação possibilita ainda sugerir prováveis fontes de infecção dentro do rebanho e focos de contaminação, direcionando o controle estratégico da doença e as medidas de tratamento aplicadas.
A identificação do patógeno da mastite pode ser feito pela cultura microbiológica convencional ou pelas ferramentas de rápido diagnóstico como a espectrometria de massas (MALDI-TOF) ou testes moleculares. Independentemente do método de escolha, é fundamental que a coleta de leite seja realizada de forma adequada, pois erros podem gerar diagnósticos sem validade. Vários são os pontos da coleta que merecem atenção, dentre eles a assepsia da extremidade dos tetos, a sequência de amostragem dos quartos mamários, a utilização de frascos e luvas estéreis e a identificação correta da amostra.
Os procedimentos de desinfecção dos tetos, no entanto, podem variar de acordo com as regiões, rebanhos e técnicos, porém sua aplicação é vital para minimizar resultados falso-positivos, causados por bactérias presentes na extremidade do teto. O Conselho Nacional de Mastite (NMC) recomenda a utilização de luvas, a aplicação de um desinfetante pré-ordenha, a secagem com toalha de uso único e a aplicação de álcool 70% na extremidade do teto. Para avaliar as diferenças de 4 protocolos de preparação dos tetos antes da coleta de leite, foi realizada recentemente uma pesquisa nos Estados Unidos com 168 vacas, totalizando 665 quartos mamários. As vacas foram distribuídas em 4 protocolos de assepsia antes das coletas de leite:
- sem nenhuma preparação;
- uso de solução desinfetante pré-dipping e secagem com toalha de uso único;
- uso de álcool 70% para limpeza da extremidade do teto;
- uso de pré-dipping, secagem com toalha e álcool 70% na extremidade do teto.
Após as coletas, o leite foi inoculado e, após 48 horas, avaliado o crescimento das colônias, sendo que aquelas morfologicamente diferentes com número igual ou maior do que 3 foram consideradas contaminadas e todas colônias foram identificadas por MALDI-TOF.
Os resultados desta pesquisa identificaram 29 gêneros e 81 espécies distintas, sendo os gêneros mais comuns Corynebacterium (25,5%), Staphylococcus (19,4%), Aerococcus (13,3%) e Bacillus (7,6%) (Figura 1). Dentre os protocolos de preparação de tetos, as vacas sem nenhuma preparação as somente com pré-dipping e secagem apresentaram mais amostras contaminadas (62 e 63%, respectivamente) em comparação aos protocolos 3 (19%) e 4 (10% de contaminação respectivamente). Também, observou-se a presença de 22 isolados de Pseudomonas somente nos grupos 2 (95%), que fizeram uso da solução desinfetante. Os autores enfatizam a importância da desinfecção do ambiente e cuidados com a descontaminação das toalhas, água de lavagem e sistema de ordenha, previamente reportados como fontes de algumas espécies de Pseudomonas.
Figura 1. Distribuição dos gêneros mais comumente isolados após diferentes protocolos de assepsia dos tetos
Fonte: Adaptado de Wattenburger et al., 2020.
Por fim, os microrganismos encontrados nas amostras contaminadas foram similares aos identificados em outros estudos, indicando que a extremidade do teto é principal fonte de contaminação de amostras de leite. Em relação aos grupos dos estafilococos não-aureus, as espécies de origem ambiental foram mais isoladas nas amostras contaminadas (protocolos 1 e 2), como por exemplo Staph. equorum, Staph. hominis, Staph. haemoliticus, Staph. xilosus, Staph. saprofiticus, enquanto as espécies mais adaptadas na glândula mamária e que causam mastite (Staph. chormogenes e Staph. epidermidis) foram isoladas principalmente nas amostras sem contaminação (protocolos 3 e 4). Os resultados desta pesquisa confirmam que protocolo completo de preparação dos tetos, com o uso de solução alcoólica (70%) após a desinfecção pré-dipping seguida de secagem reduz o risco de contaminação das amostras e garante resultados confiáveis de cultura microbiológica do leite.
Fonte: Wattenburger et al., J. Dairy Science, 2020. https://www.journalofdairyscience.org/article/S0022-0302(20)30182-X/fulltext