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O que sabemos sobre a mastite? Estratégias de prevenção

POR MARCOS VEIGA SANTOS

E TIAGO TOMAZI

MARCOS VEIGA DOS SANTOS

EM 28/06/2018

9 MIN DE LEITURA

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Este é o último de três artigos sobre o tema “O que sabemos sobre a mastite”. Nos artigos anteriores, abordamos sobre a detecção e diagnóstico e sobre o controle e tratamento da mastite. Neste artigo, serão revisados os conceitos e os avanços ocorridos no último século em relação a estratégias de prevenção da mastite, em especial ao que se refere ao equipamento e manejo de ordenha, e outras estratégias diretamente associadas com a vaca, como a seleção genética, a suplementação nutricional e a vacinação.

Durante o último século, os equipamentos de ordenha e o manejo de ordenha passaram por mudanças revolucionárias. Durante este período, a maioria dos rebanhos migrou de um sistema de ordenha essencialmente manual em rebanhos pequenos (<10 vacas em lactação) para sistemas mecanizados e automatizados que possibilitaram a ordenha de um número muito maior de vacas. Porém, ainda nos primórdios da implantação de sistemas de ordenha mecanizada (início dos anos 1940), houve grande preocupação com o fato de que os equipamentos de ordenha poderiam causar lesões nos tetos e funcionarem como fômites para transmissão de mastite entre as vacas. A partir de então, vários estudos foram conduzidos para avaliar o funcionamento de ordenhadeiras em relação à sanidade do úbere e sua influência sobre o risco de mastite.

Em um estudo de 1942, pesquisadores injetaram bário na cisterna do teto de vacas seguido de uma série de radiografias para avaliar a fisiologia do esfíncter do canal do teto. Esta pesquisa teve grande contribuição para a compreensão da biomecânica do teto, o que facilitou o entendimento do mecanismo de penetração das bactérias na glândula mamária. À medida que as pesquisas progrediram, entre os anos 50 e 80, conclui-se que tanto as flutuações de vácuo quanto o tempo de ordenha da vaca deveriam ser minimizados para reduzir o risco de novas infecções intramamárias (IIM).

Em 1981, uma revisão apontou os avanços tecnológicos dos equipamentos de ordenha e destacou a importante associação entre o nível de vácuo e a mastite. A mesma revisão apontou o crescente papel da automação no processo de ordenha, destacando que os extratores automáticos de teteiras foram a tecnologia mais importante da época em relação aos equipamentos de ordenha. Este estudo previu ainda que no futuro seriam desenvolvidos sensores que resultariam em maior automação não apenas dos procedimentos de ordenha, mas também de registro e análise de dados para gerenciamento do rebanho. Nas décadas que sucederam esta revisão, sistemas de ordenha automatizados (ou robotizados) tornaram-se comuns em diversas regiões do mundo, porém, o uso efetivo dos dados gerados por esses sistemas ainda possui algumas limitações. Por exemplo, a detecção de mastite em sistemas automatizados de ordenha continua a ser um desafio, e o papel de um funcionário “competente” para detecção e manejo desta doença continua tão importante hoje quanto foi nas décadas anteriores.

A medida que os equipamentos de ordenha se tornaram populares, definir os procedimentos adequados de ordenha passou a ser uma prioridade. As primeiras pesquisas sobre esse assunto (em 1918) avaliaram os mecanismos fisiológicos de secreção e ejeção de leite, e a ocitocina foi identificada como um composto fisiológico que poderia estimular positivamente o fluxo de leite. A partir de então, fatores que poderiam influenciar a ejeção do leite passaram a ser mais estudados. Estudos confirmaram que o medo e situações de estresse aumentavam o leite residual. Além disso, um estudo relatou que a ordenha incompleta de vacas cronicamente infectadas com Strep. agalactiae resultou em aumento dos casos de mastite clínica. Posteriormente, o receio de que o leite residual aumentava o risco de mastite foi adotado como regra em rebanhos leiteiros, encorajando a permanência do conjunto de ordenha acoplado na vaca por tempos excessivamente longos durante. Nas décadas seguintes foram identificados os problemas associados com a sobreordenha de vacas, como o aumento das lesões de ápice de tetos e sua associação com o aumento no risco de IIM.

Além da evolução dos equipamentos de ordenha, práticas de manejo que reduzem a contaminação bacteriana dos tetos foram fundamentais no controle da mastite. Estudos realizados na década de 1960 estabeleceram a importância da desinfecção de tetos após a ordenha para o controle de patógenos contagiosos (Staph. aureus e Strep. agalactiae). A imersão dos tetos em solução desinfetante após a ordenha foi considerada na época como a prática mais eficaz para a prevenção de IIM de vacas em lactação, porém, os estudos advertiram que esta prática não era igualmente eficaz contra coliformes e estreptococos ambientais como era para patógenos contagiosos.

Com o aumento da frequência de mastite causada por patógenos ambientais, os pesquisadores passaram a estudar outras estratégias para prevenir a mastite. De forma geral, a preparação das vacas antes da ordenha era geralmente realizada pela lavagem de úberes e tetos com água ou desinfetantes. Porém, estudos realizados na década de 1980 demonstraram que a desinfecção prévia dos tetos (e não dos úberes) seguida de completa secagem reduziu significativamente a ocorrência de IIM causadas por Strep. uberis. Um estudo relatou redução de 51% em novas IIM causadas por estreptococos e coliformes com a preparação adequada dos tetos: sanitização dos tetos para retirar o excesso de matéria orgânica, retirada dos primeiros jatos de leite, imersão dos tetos em solução desinfetante deixando o produto agir por 30 segundos, e secagem dos tetos com toalhas individuais.

Dentre outras estratégias preventivas que se tornaram relevantes nas últimas décadas estão a seleção genética de vacas mais resistentes à mastite, a suplementação nutricional e a imunização das vacas contra patógenos causadores de IIM. A capacidade de usar a seleção genética para reduzir a mastite evoluiu gradativamente. Um estudo pioneiro de 1944 relatou diferenças na frequência de IIM entre grupos genéticos separados de vacas de igual produtividade e observou que características hereditárias de suscetibilidade poderiam contribuir para o desenvolvimento de IIM. No entanto, a seleção de vacas mais resistentes à mastite foi dificultada por diferenças na definição da doença e pela falta de ferramentas precisas de diagnóstico. O avanço na seleção genética de vacas mais resistentes à mastite só foi possível após o uso disseminado da CCS individual em programas de controle leiteiro. Além disso, a seleção de vacas mais resistentes à mastite foi encorajada por estudos que relataram a correlação positiva entre os aumentos genéticos na produção de leite e a maior risco de mastite. Embora a seleção de vacas mais resistentes não tenha sido a principal prioridade dos produtores de leite até o momento, inovações em tecnologias de seleção genômica serão usadas para acelerar ganhos genéticos associados com a resistência de vacas à mastite.

O papel do manejo nutricional no desenvolvimento da mastite tem sido controverso e difícil de separar de outros potenciais fatores associados com a doença. Um estudo publicado em 1958 erroneamente sugeriu que o fornecimento de dietas com alto teor de concentrado era um fator de risco para a doença. Os efeitos diretos da nutrição sobre a mastite não foram relatados até a década de 80, quando pesquisadores demonstraram que a deficiência nutricional de selênio e vitamina E aumentou a incidência e a duração da mastite clínica e subclínica. Pesquisas posteriores realizadas na década de 90 demonstraram o papel essencial desses nutrientes na manutenção da função imunológica efetiva da vaca, o que contribuiu para a modificações na formulação de dietas em rebanhos leiteiros.

Outra prática de manejo usada com o objetivo de prevenir a mastite é a imunização das vacas por meio de protocolos de vacinação. O desenvolvimento de vacinas eficazes para prevenir casos novos de mastite tem sido objetivo de várias pesquisas. Porém, embora as vacinas tenham sido usadas para controlar efetivamente outras doenças bacterianas de vacas leiteiras, a natureza da mastite impõe inúmeros desafios para o sucesso da imunização. A mastite é causada por uma variedade de patógenos bacterianos em constante evolução, com cepas que variam entre os rebanhos e que se modificam geneticamente ao longo do tempo. Fatores como o local da infecção dentro da glândula mamária e características de virulência apresentam grande variação entre os patógenos, o que reduz a eficácia das vacinas.

Pesquisas iniciais para avaliação de vacinas ocorreram nas décadas de 60 e 70, as quais buscaram desenvolver vacinas com efeito sobre Strep. agalactiae e Staph. aureus. Embora uma potencial eficácia tenha sido demonstrada em experimentos realizados em laboratório, os primeiros testes de imunização a campo falharam em reduzir novos casos de IIM. De forma contrária aos resultados com bactérias gram-positivas, estudos a campo foram capazes de demonstrar boa eficácia de vacinas contra bactérias gram-negativas. Tais vacinas foram desenvolvidas com base em um antígeno nuclear lipopolissacarídeo altamente conservado. Este antígeno é comum na maioria de bactérias gram-negativas, o que possibilita um maior potencial imunogênico das vacinas entre espécies e cepas intraespecíficas dentro desse grupo de microrganismos.

De forma geral, estudos relataram que a vacinação não tem efeito significativo sobre a redução do novas IIM, porém, os sintomas clínicos da doença e as funções produtivas fisiológicas da glândula mamária (ex., redução na CCS e retorno da produção de leite) são reestabelecidas de forma mais acelerada em vacas vacinadas. O potencial das vacas vacinadas em eliminar mais rapidamente as IIM e impedir a progressão para quadros clínicos mais graves estimulou a maior frequência de uso de vacinas contra patógenos gram-negativos. De todo modo, a busca por vacinas eficazes continua a ser uma prioridade da pesquisa e estudos imunológicos estão sendo conduzidos para testar novas vacinas que atuam especialmente contra Staph. aureus e estreptococos ambientais (ex., Strep. uberis).

Durante o último século, a pesquisa caracterizou alguns dos principais fatores das IIM, como os mecanismos da resposta inflamatória e desenvolveu programas eficazes de controle de mastite que foram amplamente adotados em todo o mundo. Os efeitos da mastite na produtividade, desempenho reprodutivo e qualidade do leite foram quantificados. Ferramentas de diagnóstico como a CCS foram desenvolvidas para permitir que os produtores identifiquem vacas com infecções subclínicas de forma a implantar estratégias direcionadas de manejo para controlar patógenos contagiosos. À medida que o tamanho dos rebanhos cresceu e o manejo se intensificou, os pesquisadores reconheceram o surgimento de patógenos oportunistas de origem ambiental que frequentemente resultam em casos de mastite clínica. Grandes avanços nos equipamentos e manejo de ordenha resultaram na ampla adoção de tecnologias e procedimentos padronizados de ordenha. Limitações da terapia antimicrobiana foram reconhecidas, mas o uso de antibióticos para tratar vacas infectadas com determinados patógenos continua a ser a principal ferramenta para o controle da mastite.

Contudo, apesar do progresso significativo observado no último século, a mastite continua sendo a doença bacteriana com maior impacto em rebanhos leiteiros e, portanto, avanços contínuos no controle desta doença são necessários para assegurar a sustentabilidade da pecuária leiteira em todo o mundo. Em regiões com a cadeia produtiva em desenvolvimento como o Brasil, há a necessidade de se fornecer infraestrutura e treinamentos técnicos para auxiliar produtores a adotarem eficientemente estratégias de manejo que minimizem o desenvolvimento de novas IIM, e que resultem na produção de leite seguro e de alta qualidade para o consumo.     

Fonte: Ruegg (2017). Journal of Dairy Science. 100:10381–10397. (https://doi.org/10.3168/jds.2017-13023). 

MARCOS VEIGA SANTOS

Professor Associado da FMVZ-USP

Qualileite/FMVZ-USP
Laboratório de Pesquisa em Qualidade do Leite
Endereço: Rua Duque de Caxias Norte, 225
Departamento de Nutrição e Produção Animal-VNP
Pirassununga-SP 13635-900
19 3565 4260

TIAGO TOMAZI

Médico Veterinário e Doutor em Nutrição e Produção Animal
Pesquisador do Qualileite/FMVZ-USP
Laboratório de Pesquisa em Qualidade do Leite
Endereço: Rua Duque de Caxias Norte, 225
Departamento de Nutrição e Produção Animal-VNP
Pirassununga-SP

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JUNIOR MACHADO

MARECHAL CÂNDIDO RONDON - PARANÁ - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 28/06/2018

Bom dia professor Marcos e Tiago, primeiramente parabéns pelos artigos, sempre são de grande valor para o conhecimento. Gostaria de saber se animais que entram na sala de ordenha com os tetos visivelmente sujos é necessário fazer a limpeza dos mesmo com água e depois o pré dipping ou se somente o pré dipping é suficiente para controlar a CBT e diminuir novos casos de mastite ambiental? Mesmo que após a aplicação do produto ainda tenha sujeira (barro ou fezes) nos tetos dos animais.
TIAGO TOMAZI

ITHACA - NOVA IORQUE - PESQUISA/ENSINO

EM 28/06/2018

Boa tarde Junior, obrigado pela pergunta e interesse no assunto. A maioria dos produtos usados como pré-dipping não possuem ação desinfetante em tetos com excesso de matéria orgânica (fezes, barro, etc...). Portanto, se os tetos estiverem muito sujos, o recomendável antes da aplicação do desinfetante, lavar os tetos com água corrente de baixa pressão, evitando-se molhar o úbere da vaca. Somente os tetos devem ser lavados para evitar que a água escorra para as teteiras durante a ordenha. Abraço.
EM RESPOSTA A TIAGO TOMAZI
JUNIOR MACHADO

MARECHAL CÂNDIDO RONDON - PARANÁ - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 02/07/2018

Obrigado Tiago!

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