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Efeito da mastite sobre a qualidade do leite e dos derivados lácteos - Parte 1

POR MARCOS VEIGA SANTOS

MARCOS VEIGA DOS SANTOS

EM 19/12/2002

9 MIN DE LEITURA

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Introdução

A contagem de células somáticas (CCS) de animais individuais ou do tanque tem sido utilizada em países desenvolvidos durante as últimas décadas, desde que a ampla disponibilidade de contadores eletrônicos tornou esta metodologia acessível em grande escala. Atualmente, a CCS do tanque tem sido usada como uma importante ferramenta para monitoramento da qualidade to leite e da saúde da glândula mamária. A CCS do tanque tem sido utilizada principalmente para a detecção de mastite subclínica em nível de rebanho, para estimar as perdas de produção de leite em decorrência da mastite e como um indicador das características qualitativas/higiênicas do leite.

Recentemente a legislação sobre a produção de leite no Brasil foi alterada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. O antes denominado "Programa Nacional de Melhoria da Qualidade do Leite", que tinha como objetivo implementar várias mudanças na legislação brasileira no que se refere à qualidade do leite, passou por consulta pública e após algumas alterações se transformou na Instrução Normativa no 51. As principais mudanças que esta nova Instrução Normativa trará são: a adoção de parâmetros de qualidade como a contagem padrão em placas, a contagem de células somáticas, a ausência de resíduos de antibióticos, entre outros. A adaptação dos produtores a esta nova lei será feita de forma gradual a atingir os níveis finais de requerimento em um prazo de 7 anos após a entrada em vigor desta legislação.



O limite máximo legal para a CCS do leite nos EUA para produtores individuais é de 750.000 cels./ml e de 500.000 cels./ml no Canadá. Para os países da União Européia, Nova Zelândia e Austrália este limite é de 400.000 cels./ml.

Impacto da mastite sobre a composição do leite

A mastite bovina tem sido descrita como a principal doença que causa prejuízos para a produção leiteira, resultando em redução da produção de leite, aumento dos custos de produção e redução da qualidade (National Mastitis Council, 1996), sendo então definida como uma inflamação da glândula mamária em resposta à invasão bacteriana. A CCS do leite é comumente usada como indicador da incidência de mastite subclínica em vacas leiteiras (National Mastitis Council, 1996).

Como resultado da resposta inflamatória durante a mastite são observadas intensas mudanças nas concentrações tanto dos principais componentes (por ex.: proteína, gordura e lactose) quanto dos componentes encontrados em menores níveis no leite (por ex.: minerais e enzimas) (Kitchen, 1981). Estas mudanças na composição do leite ocorrem devido à redução na secreção de componentes do leite que são sintetizados na glândula mamária, como a proteína, gordura e lactose. Adicionalmente, durante a mastite ocorre aumento da permeabilidade vascular resultando em aumento do influxo de componentes do sangue para dentro do leite.

Impacto da mastite sobre a proteína do leite

O efeito da mastite sobre a concentração total de proteína do leite é variável (Auldist and Hubble, 1998). Entretanto, devido ao aumento do influxo de proteína de origem do sangue (p. ex., imunoglobulinas e soroalbumina bovina) e a concomitante diminuição da síntese de proteína nas células epiteliais (α -caseína, β -caseína, α -lactoalbumina and β -lactoglobulina), o efeito geral é de manutenção de níveis proteína total relativamente constante ou de mudanças muito pequenas (Kitchen, 1981; Auldist and Hubble, 1998).

Durante a mastite, a síntese de caseína é normalmente diminuída. Diversos relatos têm descrito que a caseína como porcentagem da proteína total (CN/PT) é reduzida a medida que ocorre aumento da CCS (Verdi et al., 1987; Klei et al, 1998, Santos et al., no prelo b). Verdi et al. (1987) avaliaram a composição do leite do tanque de diferentes fazendas leiteiras durante o período de dois anos e, desconsiderando as variações sazonais, a porcentagem de caseína/proteína total foi menor para o leite de vacas com mastite subclínica em comparação com leite normal.

A diminuição da caseína como porcentagem da proteína total do leite, a medida que ocorre aumento da CCS, é devida à redução da síntese e pela proteólise da caseína (Senik et al., 1985). A plasmina, a principal protease presente no leite responsável pela degradação da caseína, causa a sua proteólise dentro do úbere durante a mastite, mesmo antes da ordenha do leite (Saeman et al., 1988; Verdi and Barbano, 1991).

A mastite também determina mudanças nas concentrações das várias frações de caseína presentes no leite com níveis aumentados de CCS. De acordo com Le Roux et al. (1995), quando a CCS do leite está aumentada ocorre redução da concentração de α -caseína e β -caseína, e aumento na concentração de γ -caseína. Estas mudanças na composição das frações de caseína resultam em importantes mudanças sobre a qualidade do processamento do leite.

O aumento da CCS do leite também afeta a concentração de proteína do soro, resultando em aumento da concentração de proteínas do soro, soroalbumina bovina e imunoglobulinas (Rogers et al., 1989). Estas alterações são causadas, principalmente, devido ao influxo aumentado de substâncias do sangue para dentro do leite, passando através das membranas. Como a β -lactoglobulina e α-lactoalbumina são sintetizadas na glândula mamária, a concentração destas proteínas encontra-se reduzida durante a mastite (Rogers et al., 1989).

Impacto da mastite sobre a gordura do leite

O efeito da mastite sobre a gordura do leite não foi estudado de maneira tão intensiva quanto para a proteína (Auldist and Hubble, 1998). Existe variação quanto ao efeito da mastite sobre a concentração total de gordura do leite. Desta forma, a concentração total de gordura do leite é normalmente reduzida no leite com alta CCS quando comparado com o leite normal, uma vez que a mastite interfere com a habilidade da glândula mamária de sintetizar a gordura (Kitchen, 1981; Munro et al., 1984). No entanto, de maneira inversa, Miller et al (1983), avaliando leite de vacas individuais e Mitchell et al., (1986) utilizando leite de tanque, descreveram que a concentração total de gordura do leite aumentou no leite com alta CCS.

Impacto da mastite sobre a lactose

A inflamação da glândula mamária resulta em diminuição da síntese de lactose e, consequentemente, a concentração deste composto no leite é menor no leite de vacas com mastite em relação ao leite normal (Auldist, et al., 1995). A redução da concentração da lactose do leite com alta CCS é em parte devido às lesões nas células alveolares, no entanto, outros fatores como a passagem de lactose para o sangue também podem estar envolvidos. Klei et al. (1998) demonstraram que quando a CCS do leite aumenta de 83.000 para 872.500 cels/ml, a concentração de lactose do leite diminui de 4.977% para 4.707%.

Impacto da mastite sobre a atividade enzimática: proteólise e lipólise

Atividade proteolítica do leite

A atividade proteolítica do leite pode ter origem de enzimas endógenas, como a plasmina ou de proteases dos leucócitos presentes no leite (Verdi and Barbano, 1988). No entanto, quando a contagem bacteriana do leite é elevada, os microrganismos psicrotróficos produzem proteases extracelulares que são liberadas no leite e contribuem de maneira significativa para a degradação de proteínas (Cousin, 1982). Portanto, um aumento da atividade proteolítica resulta em maior degradação de proteínas, produzindo pequenos peptídeos, os quais podem caracterizar o aparecimento de sabores amargos no leite. O principal substrato que sofre proteólise no leite é a caseína, devido a sua alta concentração no leite e sua alta susceptibilidade, enquanto as proteínas do soro são mais resistentes à proteólise (Verdi et al., 1987).

No leite normal, a plasmina é encontrada juntamente com o seu precursor inativo, o plasminogênio, sendo considerada a principal enzima responsável pela atividade proteolítica do leite (de Rham and Andrews, 1982). Quando a CCS do leite é elevada, a atividade proteolítica de origem dos leucócitos (neutrófilos e macrófagos) é aumentada significativamente (de Rham and Andrews, 1982). Estas células contêm proteases ativas, especialmente quando são ativadas pelo sistema imune. A contribuição da atividade proteolítica além da plasmina é normalmente significativa apenas quando a CCS é mantida acima de 1 milhão de cels/ml (Saeman et al., 1988). Em termos gerais, em altos níveis de CCS do leite ocorre aumento da atividade proteolítica de origem das células somáticas, através da liberação de proteases ativas no leite (Verdi and Barbano 1988).

Durante a mastite, ocorre aumento da atividade proteolítica no leite. Saeman et al. (1988) concluíram que durante uma infecção, quando a CCS aumenta para acima de 600.000 cels/ml, a atividade proteolítica é aumentada em mais de três vezes quando comparada com o nível normal. A plasmina é a principal protease do leite atuando principalmente sobre α s1-, α s2- e β -caseína. Por outro lado, a k -caseína e as proteínas do soro são normalmente resistentes à hidrólise (Verdi et al., 1987). Tanto as concentrações de plasmina e plasminogênio, quanto a taxa de ativação do plasminogênio estão aumentadas durante a mastite (Politis et al., 1989).

De acordo com Saeman et al. (1988), após o término de uma infecção da glândula mamária, a CCS e a atividade proteolítica são reduzidas. No entanto, mesmo após a redução da CCS para níveis normais, a atividade proteolítica do leite permanece aumentada em comparação com os níveis normais. Desta forma, os efeitos negativos da mastite sobre a qualidade do leite são mantidos temporariamente, mesmo após a infecção ter sido eliminada e a CCS retornado ao normal.

De acordo com Janzen et al. (1982), foi identificada uma correlação negativa entre a atividade proteolítica do leite e o escore de sabor para leite pasteurizado, resultando em menor aceitação por parte dos consumidores, bem como na redução da vida de prateleira. O aumento da atividade proteolítica pode induzir ao aumento de sabores indesejáveis no leite, especialmente durante o armazenamento, quando os níveis de degradação da caseína são elevados (Janzen, et al., 1982; Harwalkar et al., 1989).

Atividade lipolítica no leite

A atividade lipolítica no leite é causada principalmente pela ação da lípase lipoprotéica do leite (LLP), assim como de outras enzimas lipolíticas, tais como as lipases de origem das células somáticas, dos microrganismos e de outras esterases (Olivecroma, 1992). Ainda que a concentração de LLP no leite seja suficiente para causar altos níveis de lipólise, os triglicérides do leite são protegidos do ataque enzimático pela membrana dos glóbulos de gordura do leite (Olivecroma, 1992). No leite bovino, a maioria da lipase é encontrada na fração do leite sem gordura, estando associada com as micelas de caseína e, portanto, esta compartimentalização previne a lipólise dos triglicérides do leite (Castberg, 1992). Adicionalmente, a lipólise no leite pode ser inibida pela presença de inibidores da atividade lipolítica (Downey, 1980).

Azzara and Dimick (1985) demonstraram que a fagocitose de glóbulos de gordura do leite por leucócitos durante a resposta imune da glândula mamária contra uma infecção pode causar danos na membrana dos glóbulos de gordura do leite e, desta forma, expor o conteúdo de triglicérides à subseqüente degradação pela LLP. Azzara and Dimick (1985), estudando a atividade lipolítica de leucócitos presentes na glândula mamária, demonstraram que os macrófagos isolados apresentavam secreção de enzimas lipolíticas, enquanto que neutrófilos e linfócitos não apresentavam esta característica. Ainda que a contribuição dos macrófagos para a atividade lipolítica total seja pequena, as lipases do macrófagos podem atuar na membrana dos glóbulos de gordura do leite e aumentar a disponibilidade da gordura do leite para o ataque enzimático pela LLP, principalmente em infecções subclínicas prolongadas, quando o número de macrófagos está aumentado.

Devido ao amplo uso da refrigeração do leite na fazenda, a atividade lipolítica de origem microbiana é principalmente devido às bactérias psicrotróficas, as quais são as predominantes no leite refrigerado. Estas lipases secretadas por estes microrganismos Gram-negativos são hidrolases que atuam principalmente na posição α dos triglicerídeos (Castberg, 1992). Se as condições higiênicas de produção e armazenamento do leite forem satisfatórias, as lipases bacterianas não apresentam normalmente um impacto importante sobre a lipólise do leite antes da pasteurização (Muir, 1996). No entanto, devido a característica destas enzimas de sobreviverem à pasteurização, a sua atividade lipolítica passa a ser importante, principalmente quando a contagem de psicrotróficos ultrapassa 106 107 ufc/ml (Downey, 1980). Desta forma, quando a contagem de psicrotróficos do leite é mantida baixa, a atividade lipolítica no leite é principalmente de origem endógena do animal.

Originalmente publicado nos Anais do 2o Congresso Panamericano de Qualidade do Leite e Controle de Mastite, Ribeirão Preto, SP, 2002.

MARCOS VEIGA SANTOS

Professor Associado da FMVZ-USP

Qualileite/FMVZ-USP
Laboratório de Pesquisa em Qualidade do Leite
Endereço: Rua Duque de Caxias Norte, 225
Departamento de Nutrição e Produção Animal-VNP
Pirassununga-SP 13635-900
19 3565 4260

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SUELY DE MELLO

MAIRIPORÃ - SÃO PAULO - MÍDIA ESPECIALIZADA/IMPRENSA

EM 18/02/2019

O leite da vaca com mastite pode ser consumido por humanos??
LARISSA LUISA SCHUMACHER

SANTA MARIA - RIO GRANDE DO SUL - ESTUDANTE

EM 26/08/2017

Boa noite professor Marcos.

Gostaria de saber seu e-mail.

Desde já agradeço!
JANETE GOMES DE MOURA

RECIFE - PERNAMBUCO - ESTUDANTE

EM 12/10/2016

Excelente trabalho.
OSVALDO NEVES ALVES FILHO

NOVA VENÉCIA - ESPÍRITO SANTO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 05/07/2012

Parabéns pelo trabalho.
Gosrtaria de saber se a ccs elevada contribui na diminuição da acidez do leite?
Obrigado

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