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Cristalização da lactose em produtos lácteos

VÁRIOS AUTORES

THERMA/UFV

EM 29/04/2021

8 MIN DE LEITURA

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A cristalização da lactose em produtos lácteos ocorre devido à formação de grandes cristais de lactose, os quais são perceptíveis  ao paladar. 

 

Algumas etapas do processamento de produtos lácteos resultam na concentração dos seus constituintes, sendo a mais comum delas a remoção de água por evaporação. Entretanto, o congelamento da água formando cristais de gelo também pode ser considerado um processo de concentração dos constituintes do leite, como no caso da elaboração de sorvetes de base láctea.

A lactose, o principal açúcar do leite, apresenta baixa solubilidade (em torno de 18 g/100 g de água a 20 °C), podendo resultar na formação de cristais perceptíveis sensorialmente, o que é rejeitado pelos consumidores.

Desta forma, as indústrias buscam por estratégias de evitar o crescimento dos cristais de lactose em produtos como, por exemplo, doce de leite, leite condensado e sorvetes. Neste artigo, iremos abordar a cristalização da lactose, começando pela compreensão da sua solubilidade, mecanismos de cristalização até as principais formas para evitar o crescimento dos cristais.

 

Solubilidade da Lactose

A lactose é um dissacarídeo que se apresenta sob duas formas, denominadas anômeros α e β. Estruturalmente, essas duas formas diferem-se somente com relação à localização do grupo redutor presente no carbono anomérico da unidade de glicose, com variações das posições do hidrogênio e do grupo hidroxila, conforme estrutura na Figura 1.

Entretanto, as duas formas anoméricas possuem propriedades físico-químicas diferentes. Após a dissolução da lactose em água, as conversões entre os anômeros α e β ocorrem continuamente até que se atinja o equilíbrio termodinâmico do sistema.

Por exemplo, à 25ºC, neste estado termodinâmico, a lactose possui 62,25% em sua forma β e 37,75% na sua forma α (PERRONE et al., 2017). O fenômeno da conversão é denominado mutarrotação e influencia muito a solubilidade média da lactose, visto que seus anômeros possuem solubilidades distintas (HOLSINGER, 1997).

Figura 1. Estrutura química da lactose.

cristalização da lactose

 

A temperatura influencia a solubilidade média da lactose (Figura 2b), uma vez que altera a solubilidade dos seus anômeros. É possível observar que até 93,5 °C, a forma β é mais solúvel do que a α-lactose.

Figura 2. Solubilidade em água em função da temperatura: (a) dos anômeros α-lactose e β-lactose e (b) média da lactose.

cristalização da lactose
Fonte: (a) Adaptado de Fox, McSweeney e Paul, 1998) e (b) Adaptado de Mullin, 2001.

 

Exatamente nas concentrações de lactose pertencentes à curva da solubilidade média (Figura 2b), observa-se a condição de saturação, na qual, a quantidade de soluto dissolvido é igual à soma da solubilidade de cada anômero multiplicada por sua respectiva fração molar.

Porém, ao aumentar a concentração da lactose na solução, ultrapassando a solubilidade média, a solução torna-se supersaturada, criando uma condição provável para que a cristalização da lactose ocorra (BRITO, 2007).

 

 

Como ocorre a cristalização da lactose?

A cristalização da lactose é um processo que envolve duas etapas: formação de núcleos (nucleação) e crescimento desses núcleos, também conhecida como propagação. A nucleação é a etapa de início de formação dos cristais em uma solução supersaturada em lactose, na qual um certo número de moléculas de lactose se une, via interações intermoleculares, formando um agregado (ZAMANIPOOR & MANCERA, 2014).

A supersaturação da solução é um pré-requisito para o processo de nucleação e, isto quer dizer que, nessa condição, o potencial químico da lactose no cristal é menor que o seu potencial químico na solução, ou seja, o processo que leva o sistema ao equilíbrio é a formação de cristais de lactose (LEWIS et al., 2015).

Porém, para que este núcleo cresça espontaneamente, além da necessidade de a solução estar supersaturada em relação à lactose, o agregado formado deve atingir um tamanho mínimo, conhecido como raio crítico (RC).

Caso o agregado se forme, mas não atinja o RC, este se desfaz e, assim, moléculas de lactose vão se agregando até que se atinja o RC e se tenha uma nova fase formada na solução: núcleos estáveis de cristais de lactose (Figura 3).

Figura 3. Representação esquemática da formação de núcleos de cristais de lactose.  Em “A” e “B”, moléculas de lactose se agregam (representado pela seta verde), mas formam núcleos que não atingem o raio crítico e se desfazem (seta vermelha). Em “C”, moléculas de lactose se agregam e atingem o raio crítico, originando um núcleo estável de cristal de lactose.

cristalização da lactose
Fonte: autoras

Uma vez que um núcleo estável foi formado, dá-se início ao processo de crescimento desta partícula. Nesse processo, moléculas de lactose se difundem na solução em direção ao núcleo, adsorvem em sua superfície e se integram à estrutura do núcleo de cristal formado, fazendo com que esse cristal cresça (ZAMANIPOOR & MANCERA, 2014).

 

Por que o crescimento dos cristais de lactose acontece?

Existem três forças motrizes que atuam no sistema dirigindo o processo de formação e crescimento do cristal: a primeira força busca evitar que os cristais surjam no sistema, porque cada cristal possui um excesso de energia livre na interface (tensão interfacial x área).

A segunda força atua justamente para que formem essa nova fase, visto que ao formarem a energia livre do sistema diminui pois ocorre a transferência de molécula de uma região de maior potencial químico (solução) para uma região de menor potencial químico (cristal).

Por fim, uma terceira força opera para a formação destes cristais, uma vez que mais cristais formados aumentam o número de formas diferentes de distribuir as moléculas de água e os cristais no espaço, aumentando a entropia configuracional do sistema, o que leva à redução da energia livre de Gibbs do sistema. A formação dos cristais implica que as duas últimas forças dominaram sobre a primeira.

Cristais grandes de lactose podem, no entanto, conferir textura “arenosa” aos produtos lácteos. Esse defeito é comum em doce de leite, mas também pode ocorrer em sorvetes e leite condensado, por exemplo.

Em sorvetes e leite condensado, cristais maiores que 14 μm e 30 μm, respectivamente, conferem textura arenosa ao produto. Em geral, considera-se que cristais de lactose devem ser menores que 10 μm para não serem percebidos sensorialmente (WALSTRA et al., 2001). Algumas estratégias podem ser adotadas na indústria para o controle do número e tamanho dos cristais.

 

Como evitar o crescimento dos cristais de lactose?

Atualmente, existem algumas alternativas que são utilizadas para evitar o crescimento dos cristais em produtos lácteos concentrados. Dentre eles, podem ser citados três mecanismos principais:  nucleação forçada, aumento da viscosidade e adição da enzima lactase.

A técnica de nucleação forçada, também conhecida como semeadura, consiste em três ações: resfriamento controlado da solução de lactose, adição de núcleos de cristalização e agitação contínua. Na etapa de resfriamento, a temperatura da solução é reduzida entre 20 e 28 ºC, provocando diminuição da solubilidade da lactose, e consequentemente, favorecendo a formação de núcleos.

Posteriormente, cristais pequenos de lactose (núcleos) são adicionados à solução supersaturada, induzindo à formação de novos cristais, que são formados espontaneamente. Esse processo deve ter o auxílio de agitação constante para melhorar a homogeneidade e a uniformidade dos cristais. Ao final, obtêm-se um produto com textura desejável e com formação controlada de cristais pequenos, o que dificultará a sua percepção sensorial (PERRONE et al., 2017).

O aumento da viscosidade possui papel fundamental na redução do crescimento de cristais de lactose. Esta técnica emprega a adição de agentes espessantes que promovem aumento da viscosidade da matriz.

Neste processo, em função do aumento da viscosidade, a taxa de cristalização torna-se mais lenta, devido à baixa difusão das moléculas de lactose, reduzindo o crescimento dos cristais. Para este fim, é comum a utilização de amido, por exemplo (SILVA et al., 2015).

A utilização da enzima β-galactosidase, popularmente chamada de lactase, é responsável por hidrolisar as ligações β-galactosídicas presentes na lactose, resultando em duas moléculas: glicose e galactose. Estes monossacarídeos possuem maior dulçor, e são mais solúveis quando comparados à lactose, reduzindo a incidência da cristalização.

No estudo de Klein, Jong e Révillion (2010) foi avaliado o efeito da utilização da enzima sobre a cristalização da lactose no doce de leite. Os resultados encontrados demonstraram a eficiência da utilização de 0,2 g/L de lactase, sendo capaz de proporcionar o controle da cristalização do doce de leite, prevenindo a sensação de arenosidade e mantendo a qualidade sensorial do produto durante 180 dias.

Concluindo, a presença de cristais grandes de lactose é indesejável, cabendo à indústria ajustar a formulação e escolher e tecnologia adequada para evitar este defeito em seus produtos.

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Referências

BRITO, A. B. N. Estudo da cristalização de lactose em diferentes solventes.2007.132 f. Tese (Doutorado em Engenharia Química). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos.

DEORA, N. S. et al. Ultrasound for improved crystallisation in food processing. Food Engineering Reviews, v. 5, n. 1, p. 36-44, 2013.

FOX, P. F.; MCSWEENEY, P. LH; PAUL, L. H. Dairy chemistry and biochemistry. London: Blackie Academic & Professional, 1998.

HOLSINGER, V. H. Physicol and Chemical properties of lactose. In: FOX, P. F. Advanced dairy chemistry. 2. ed. London: Chapman & Hall, 1997. v. 3, p. 1-38.

KLEIN, M. P.; JONG, E. V.; RÉVILLION, J. P. P. Utilização da β-galactosidase para prevenção da cristalização em doce de leite. Ciência e Agrotecnologia, v. 34, n. 6, p. 1530-1535, 2010.

LEWIS, A. et al. Industrial Crystallization: Fundamentals and Applications. Cambridge University Press, 2015.

MULLIN, J. W. Crystallization. Elsevier, 2001.

NISHINAGA, Tatau. Thermodynamics-for understanding crystal growth. Progress in Crystal Growth and Characterization of Materials, v. 62, n. 2, p. 43-57, 2016.

PERRONE, T. I. et al. Lactose. In: Cruz A. G. et al. Química, Bioquímica, Análise Sensorial e Nutrição no Processamento de Leite e Derivados: Coleção Lácteos. Elsevier Brasil, 2017.

SILVA, F. L. et al. Production of dulce de leche: The effect of starch addition. LWT-Food Science and Technology, v. 62, n. 1, p. 417-423, 2015.

WALSTRA, P. et al. Ciência de la leche y tecnologia de los produtos lácteos. Zaragoza: Editorial Acrbia, 2001.

ZAMANIPOOR, Mohammad H.; MANCERA, Ricardo L. The emerging application of ultrasound in lactose crystallisation. Trends in food science & technology, v. 38, n. 1, p. 47-59, 2014.

*Fonte da foto do artigo: Freepik

GLÁUCIA VALÉRIA FONSECA LEONEL

Engenheira de Alimentos e mestranda do Laboratório de Termodinâmica Molecular Aplicada (THERMA-UFV).

ELIARA ACIPRESTE HUDSON

Doutora em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela UFV, pós-doutoranda do Laboratório de Termodinâmica Molecular Aplicada (THERMA-UFV)

LUIS HENRIQUE MENDES DA SILVA

Professor Doutor do Departamento de Química da UFV e coordenador do Grupo Química Verde, Coloidal e Macromolecular (QUIVECOM-UFV).

ANA CLARISSA DOS SANTOS PIRES

Profa. Dra. Ana Clarissa dos Santos Pires, Professora do Departamento de Tecnologia de Alimentos da UFV e coordenadora do Laboratório de Termodinâmica Molecular Aplicada (THERMA-UFV)

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