Vamos tomar como base um trabalho interessante apresentado na última reunião da SBZ (Vilela, et al. 2005). Os autores ofereceram 2 níveis de suplementação concentrada para vacas em lactação mantidas em pastagens de Coast-Cross, e avaliaram os efeitos dos tratamentos sobre a produção e composição do leite. O que dá muita credibilidade aos resultados é que as avaliações foram feitas por um período de 3 anos consecutivos, envolvendo 108 lactações completas. Foram testados dos níveis de suplementação, 3 ou 6 kg/vaca/dia de um concentrado com 19,5% PB e 86% NDT. Infelizmente o trabalho não mostra dados de composição do pasto, nem do consumo de MS da forragem.
Na tabela 1 são apresentadas as produções diárias de leite, com e sem correção para 3,5% de gordura, e na Tabela 2 encontram-se os valores referentes aos teores médios de proteína, gordura, lactose, uréia, sólidos totais e contagem de células somáticas do leite.
Tabela 1. Produção de leite, sem e com correção para 3,5% de gordura, de vacas Holandesas mantidas em pastagem de coast-cross, recebendo 3 ou 6 kg de concentrado/vaca/dia (média de três anos consecutivos)
Tabela 2. Valores médios de proteína, gordura, lactose, uréia, sólidos totais e contagem de células somáticas (CCS) do leite produzido por vacas Holandesas mantidas em pastagem de coast-cross por três anos consecutivos e recebendo por dia 3 ou 6 kg de concentrado
Com relação à produção de leite, como era de se esperar, as vacas que receberam mais concentrado produziram mais leite. Infelizmente não temos os dados de consumo do pasto, mas é de se esperar que tenha havido efeito de substituição do pasto pelo concentrado, de forma que as vacas que receberam os 6 kg de concentrado provavelmente consumiram menos MS de forragem em relação às que receberam 3 kg.
Isso por si só não acrescenta muito ao conhecimento geral sobre o tema, mas será que esse nível maior de suplementação é vantajoso? Oferecer 3 kg a mais de concentrado para ter uma produção adicional de 3,6 kg de leite (sem correção para gordura)? Depende do preço do leite e do preço do concentrado. Ao fazer uma simulação dessa situação, considerando um consumo de 10 kg MS de pasto para as vacas que receberam 3 kg de concentrado e de 8,5 kg MS de pasto para as que receberam 6 kg do suplemento, observamos um quadro interessante. Analisemos os dados da Tabela 3.
Tabela 3. Retorno sobre o custo de alimentação de vacas leiteiras em regime de pastejo, suplementadas com 2 níveis de concentrado, e com diferentes preços do leite e custo do concentrado, considerando os dados do trabalho de Vilela et al. (2005).
Nessa simulação considerou-se os dados de produção do trabalho analisado, e um custo de R$ 0,085/kg MS de pasto. Se o preço do leite ficar entre R$ 0,30 e R$ 0,35/litro, o aumento no fornecimento de concentrado só é vantajoso se o preço do concentrado não for superior a R$ 0,40/kg. Para quem conseguir comprar ou produzir um concentrado a menos de R$ 0,40/kg, o aumento na suplementação será vantajoso, mesmo que o leite custe até R$ 0,30/litro. Da mesma forma, se o produtor recebe pelo menos R$ 0,40 pelo leite, então o concentrado pode custar até R$ 0,50/kg, que o aumento na suplementação também será vantajoso.
Claro que isso vai depender muito da qualidade da forragem, o que não foi discutido no trabalho de Vilela et al. (2005). Mas, pelos resultados obtidos, com certeza o pasto era de boa qualidade, e os animais eram especializados, outro fator fundamental para se obter boas respostas com a suplementação. O que interessa ao produtor é ganhar dinheiro, e mesmo com o aumento na produção, se o concentrado for caro, e o preço do leite for baixo, dar mais concentrado para as vacas pode não ser uma boa alternativa. Mas se o produtor consegue uma boa relação entre o preço do leite e o custo do concentrado, aí a história é outra. E para avaliar a viabilidade da suplementação, a análise do RCA é uma boa ferramenta para auxiliar na tomada de decisão.
É importante ressaltar que o concentrado em questão possui 19,5% de PB, o que é mais do que suficiente se o pasto for bom, conforme já discutimos em artigo anterior publicado no radar de nutrição (clique aqui para ler). E um concentrado com esse teor de proteína certamente custa mais barato do os tradicionais com 22-25% PB, o que ajuda a viabilizar a suplementação das vacas como forma de aumentar a rentabilidade do sistema.
Outro ponto que merece destaque é que, no trabalho em discussão, o aumento na suplementação praticamente não afetou a composição do leite, como mostra a Tabela 2. O único efeito observado com o maior nível de concentrado foi um aumento no teor de proteína do leite, possivelmente decorrente do maior consumo de concentrado, que resulta em aumento na produção de ácido propiônico no rúmen, que por sua vez aumenta a disponibilidade de aminoácidos para a glândula mamária. Quando se recebe mais pela qualidade do leite, esse é um ponto bastante positivo.
Literatura citada
VILELA, D.; LIMA, J. A.; RESENDE, J. C.; VERNEQUE, R. S. "Qualidade do leite produzido por vacas holandesas mantidas em pastagem de Coast-cross suplementada com concentrado. In: 42ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Zootecnia, Goiânia/GO, 2005. CD/ROM