No último artigo publicado nesta seção (Caroço de algodão e resíduo de cervejaria como substitutos de forragens - 16/8/2002), foi discutida a possibilidade de substituição parcial de forragens por subprodutos fibrosos.
Na realidade existem pesquisadores que desenvolvem este tipo de pesquisa em diversas partes do mundo. Estas dietas são denominadas de "baixo enchimento" (do inglês - Low Fill) por utilizar grande quantidade de subprodutos fibrosos, que acabam resultando em altos níveis de fibra (FDN) na dieta, sem que isto implique em um alto volume (enchimento do rúmen). É bom lembrar novamente que a completa substituição das forragens por subprodutos em dietas de vacas leiteiras é praticamente impossível.
Estas pesquisas são conduzidas com grande frequência em regiões onde a produção de forragens é difícil e, portanto, cara. Exemplo disso é Israel, onde foi conduzido um experimento que testou a substituição parcial da silagem de milho por casca de soja em rações completas para vacas em lactação.
Quarenta vacas em lactação foram divididas em dois grupos e alimentadas individualmente por oito semanas com uma de duas dietas experimentais: 1) Ração completa contendo 18% de FDN oriunda de silagem de milho (em conformidade com as recomendações padrão); 2) Outra ração completa similar, na qual a silagem de milho (16,5% da matéria seca) foi substituída por casca de soja. Esta segunda ração completa tinha somente 12% de FDN oriunda de forragem (muito abaixo da recomendação padrão). O teor total de FDN foi de 39% para a dieta com casca de soja e 36% para aquela que tinha somente a silagem de milho.
O consumo voluntário foi de 25,8 e 25,1 kg, respectivamente, para os grupos recebendo silagem de milho e para a casca de soja. Mesmo assim, o grupo que recebeu a casca de soja acabou consumindo maior quantidade de FDN (P<0,1) que o grupo da silagem. As médias de gordura no leite, leite corrigido para 3,5% de gordura e leite corrigido para o teor de energia foram maiores no grupo da casca de soja (P<0,05). A eficiência para a produção de leite e de leite corrigido para o teor de gordura foi ligeiramente superior no lote de silagem de milho.
Análises da digestibilidade in vitro demonstraram maior digestibilidade (P<0,05) da matéria orgânica, FDN, hemicelulose e celulose nas rações completas com casca de soja em comparação à silagem de milho. Apesar destas diferenças na digestibilidade, o perfil de ácidos graxos do leite, incluindo o ácido linolêico conjugado (ALC), foi similar entre os tratamentos.
Os autores concluem que as recomendações do NRC (2001) no que se refere à inclusão de um mínimo de FDN de forragem em rações completas para vacas leiteiras podem ser estendidas para dietas até com um mínimo de 12% de FDN de forragem, em condições similares às apresentadas neste experimento.
Comentário do autor: estas dietas são bastante pesquisadas e largamente implementadas em regiões como Israel, além da Flórida e Califórnia, nos EUA, onde a produção de alimentos é limitada, e sua qualidade é comprometida (forragens mais fibrosas que em regiões temperadas). Se bem formuladas os resultados normalmente se apresentam na forma de maior produção de leite, até mesmo com maior porcentagem de gordura. Infelizmente não existe uma "receita" única que possa ser seguida. No caso da utilização da casca de soja em substituição a forragens, o que alguns pesquisadores recomendam é que a dieta deve conter quantidade suficiente de fibra longa, para que se forme uma boa "manta" fibrosa no rúmen, que terá por função "aprisionar" por maior tempo as partículas de casca, que têm digestão relativamente lenta e precisam, portanto, permanecer maior tempo no rúmen para que sejam digeridas. Caso contrário, a elevada taxa de passagem da casca no rúmen acabará por diminuir a disponibilidade de energia para os animais.
Fonte: Miron, J., et al., 2002. Soybean hulls for replacing corn silage in total mixed rations of lactating cows. J. Dairy Sci 85 - suppl. 1. pág 69.