A resistência parasitária é um fenômeno pelo qual uma droga não consegue manter a mesma eficácia contra os parasitas, se utilizada nas mesmas condições e após um determinado período de tempo.
A seleção natural criou uma enorme diversidade genética nas populações parasitárias selecionando organismos aptos a sobreviver grandes desafios. Com o surgimento dos compostos antiparasitários, capazes de eliminar grandes quantidades de parasitas, todo este processo foi acelerado.
A seleção parasitária por meios químicos ocorre após poucas gerações, devido principalmente à exposição destes organismos a altas doses do medicamento, transmitindo esta característica para as gerações futuras.
O sinal mais visível da falta de eficácia de um composto é a diminuição de sua ação tóxica de eliminação. O intervalo inicial para que este fenômeno aconteça depende da espécie do parasita, do quão eficiente é a droga e da frequência com que este produto é utilizado.
Existe consenso mundial de que a situação referente à resistência parasitária é preocupante, com prejuízos diretos para a produção de leite, carne, lã e a oferta de animais jovens. Mesmo com tantos prejuízos o monitoramento da eficácia das drogas é pouco utilizado.
O que é Resistência Parasitária?
A resistência parasitária é um fenômeno pelo qual uma droga não consegue manter a mesma eficácia contra os parasitas, se utilizada nas mesmas condições e após um determinado período de tempo (Figura 1). O diagnóstico será positivo para "resistência" quando uma a droga que apresentava redução acima de 98% da carga parasitária, obtém redução de menos de 90% contra determinado organismo após um período de tempo (meses ou anos).
Por exemplo: caso 10 fêmeas de Haemonchus contortus, parasita do abomaso de ruminantes, sobrevivam a determinado tratamento, logo após 7 dias estes parasitas poderão eliminar mais de cem mil ovos "resistentes" na pastagem por dia.
Sabendo que a resistência parasitária é transmitida geneticamente, todos estes novos ovos estarão aptos a tolerar, mesmo que marginalmente, este composto se utilizado novamente.
Figura 1 - Relação de substituição em uma população de parasitas susceptíveis e resistentes em helmintos contra determinado produto. Quanto maior o tamanho da letra mais susceptível/resistente será o indivíduo.
Os primeiros relatos do aparecimento de organismos resistentes aos antiparasitários modernos datam da década de 60, com a diminuição da eficácia ao benzimidazole. No decorrer dos anos 70 e 80 no Brasil, surgiram relatos de diminuição da eficácia entre diferentes bases farmacológicas em uma mesma propriedade. Hoje, a resistência anti-helmíntica múltipla ocorre frente a todos os compostos químicos com graves consequências econômicas.
Causas predisponentes ao aparecimento da resistência parasitária (pressão de seleção):
- Intervalos curtos entre tratamentos.
- Rotação rápida de diferentes grupos de vermífugos.
- Tratamento de todos os animais do rebanho.
- Utilização de produtos de ação prolongada.
- Aquisição de animais com parasitas resistentes.
- Manejo inadequado no momento do tratamento: falta de jejum, doses incorretas, validade.
Resistência parasitária em pequenos ruminantes
O produtor de ovinos e caprinos trata seu rebanho de maneira preventiva/supressiva, utilizando vários tratamentos ao ano, entre 4 a 21, fazendo a rotação de todas as bases disponíveis no mercado. Estas drogas são escolhidas ora pelo preço, ora pela disponibilidade momentânea nas Casas Agropecuárias.
As lactonas macrocíclicas (ivermectinas e milbemicinas) são as drogas mais utilizadas (58%), seguidas pelos imidazóis (17%) e os benzimidazóis (10%). Um fator importante é que somente 50% dos produtores desenvolvem um programa de controle parasitário sob orientação de médico veterinário. Mesmo assim, a resistência parasitária tem sido determinada de forma frequente, muitas vezes, devido a falta de monitoramento com exames coproparasitológicos.
A dependência da utilização de produtos químicos em larga escala sem o uso de alternativas para o combate às infecções parasitárias tem apresentado baixa produtividade e alta taxa de mortalidade de animais jovens. Na Bahia, foi relatado perdas de até 48% do rebanho devido a infecções parasitárias.
Em recente levantamento na região central do estado do Rio Grande do Sul, foram testados todas as classes de drogas disponíveis no mercado contra Haemonchus sp., Ostertagia sp., Trichostrongylus sp., Cooperia sp. e somente um composto obteve eficácia satisfatória, pouco acima de 90%.
Uma grande fonte de aquisição de parasitas resistentes é na compra de animais. A maior prova disto foi à disseminação no nordeste brasileiro de isolados resistentes de H. contortus oriundos de ovinos adquiridos nos estados do sul do país.
Resistência parasitária em bovinos
O aparecimento da resistência em bovinos foi determinado no inicio dos anos 90 no Brasil. Os gêneros predominantes de parasitas resistentes são: Cooperia sp., Trichostrongylus sp., e Haemonchus sp. No entanto é imperativo mencionar que a resistência parasitária ainda não preocupa a maioria dos bovinocultores brasileiros que utilizam largamente o animal zebuíno.
Pressão de seleção
Este tema integra os conceitos mais importantes que o técnico e o produtor deve levar em consideração, como: tipo de produto, intervalo entre aplicações, época do ano e o tipo de parasita. Tentando esclarecer estes fatores, proponho um exemplo com duas situações:
Situação 1. Propriedade de criação intensiva, onde se utiliza um produto de longa ação (ivermectina ou moxidectina) em intervalo de 90 dias, em época de grande desafio, contra o Haemonchus contortus.
Situação 2. Propriedade de criação a campo, onde se utiliza um produto de curta ação (albendazole ou levamisole) em intervalo de 30 a 45 dias, em época de grande desafio, contra o Haemonchus contortus.
Nestes casos teóricos o objetivo é a redução da carga parasitária ao máximo. Entretanto as duas situações estão colocadas dentro do limite de utilização dos produtos, sendo ambas corretas e incorretas ao mesmo tempo.
Como corretas? Nos dois casos se respeitou o período de ação dos produtos até a eliminação dos resíduos no animal, não afetando a ingestão de larvas susceptíveis.
Como incorretas? Nos dois casos, não foi permitida a permanência de animais não-tratados, que eliminariam ovos susceptíveis ao longo dos períodos.
Caso estes critérios não sejam respeitados, incluindo ainda, a raça dos animais, estado nutricional e momento do tratamento (estresse, ferimentos, lactação, gestação) todos os benefícios do tratamento poderão ser inúteis, prevalecendo somente a característica incorreta da aplicação. Para isto vale lembrar que o objetivo de todos, tentando retardar a seleção para resistência parasitária, deve ser o de reduzir a pressão de seleção nas populações parasitárias.
Como suspeitar do aparecimento de resistência parasitária?
A maior dificuldade encontrada por parasitologistas do mundo todo é a incapacidade de diagnosticar a resistência parasitária precocemente. No caso de produtores, a resistência só será revelada quando este detectar animais fracos, cambaleantes, presença de edema submandibular e/ou com pelo arrepiado ou queda de lã logo após tratamento.
A maneira mais eficaz para determinar a existência de organismos resistentes no campo é através do monitoramento da eficácia das drogas utilizando o teste de redução na contagem de ovos por grama de fezes (FECRT em inglês). Deve-se determinar a quantidade de ovos presentes em dois grupos de 10 animais, trata-se um grupo e novamente determina-se a quantidade de ovos depois de 7 a 10 dias, calculando o percentual de redução. Aconselha-se que este tipo de teste seja feito uma vez ao ano.
Existem técnicas desenvolvidas para uso em laboratórios especializados, porém com alto custo. Somente a biologia molecular poderá trazer maior agilidade e precisão nos diagnósticos. Assim que estiverem disponíveis, será possível identificar criteriosamente o grau de resistência e propor estratégias de controle com maior antecedência.
Como evitar a resistência parasitária
O controle parasitário através da utilização de compostos químicos é a maneira mais prática e eficiente de manter as infecções parasitárias em um nível mínimo. No entanto, este recurso deve ser utilizado de maneira criteriosa, juntamente com outras formas de manejo.
O tratamento estratégico tem como objetivo reduzir o número de dosificações/ano utilizando o conhecimento da biologia do parasita. Existem outras técnicas que podem auxiliar no controle parasitário:
- Fazer rotação lenta de grupos de vermífugos (3 anos/bovinos e 1 ano/caprinos-ovinos).
- Utilizar animais mais velhos, da mesma espécie, associados com animais jovens.
- Utilizar o método FAMACHA para controlar o Haemonchus contortus.
- Utilizar animais naturalmente tolerantes as parasitoses.
- Descontaminar os pastos utilizando o cultivo de lavouras estacionais.
- Restringir o alimento 12 h antes e 8 h após o tratamento por via oral.
- Manejar a lotação de animais nas pastagens.
Para finalizar, é importante salientar que um bom programa de controle parasitário pode significar grande aumento produtivo nos animais (peso, produção de leite, taxa de fertilidade).