Os problemas oftálmicos têm um considerável impacto sobre a produtividade dos bovinos. Animais acometidos com distúrbios oculares apresentam redução na produção de leite e ocasionam despesas com o tratamento da patologia. Embora recebam pequena atenção, os distúrbios oftálmicos são mais comuns do que se imagina. Um trabalho de pesquisa onde 502 vacas foram examinadas, foi constado que 18,8% dos animais apresentavam problemas oculares e que a incidência aumentava de acordo com a idade.
Os distúrbios oculares mais importantes que afetam os bovinos são a inflamação da conjuntiva (conjuntivite), da conjuntiva e da córnea (ceratoconjuntivite) e o carcinoma de células escamosas. Este artigo ira abordar o Carcinoma de células escamosas ou Carcinoma epidermóide ocular, que é um dos tumores mais comuns em bovinos. A incidência média desta patologia é de 1 à 1,5%, mas em algumas condições, como em locais com excesso de exposição à luz solar, pode chegar a 5%. O carcinoma ocular é incomum em animais jovens, e a idade média para sua ocorrência é oito anos. A incidência é maior em Bos taurus do que em Bos Indicus.
As lesões precursoras do carcinoma correspondem a um crescimento semelhante a uma verruga na pálpebra ocular. Por isso, é importante manter sob observação os animais que apresentam estas pequenas lesões, sendo que, em cerca de 91% dos casos são lesões malignas.
Foi observado em um estudo com 5000 animais que a incidência do Carcinoma ocular varia com a distribuição geográfica da população, aumentando significativamente com o maior número de horas de exposição ao sol; diminuindo com a latitude e aumentando com a altitude da região.
A etiologia do carcinoma de células escamosas é desconhecida, mas pode-se destacar alguns fatores que contribuem para a sua ocorrência, dentre eles: radiação, irritação causada por sujeira, areia e insetos, viroses e idade. O distúrbio é ainda hereditário, e touros com histórico de carcinomas oculares não deveriam ser utilizados para a reprodução. A predisposição genética pode estar baseada na herança de mutação específica do câncer ou na deficiência do mecanismo de reparação do DNA. A pequena pigmentação da pele na região periorbital é também descrita como um importante fator predisponente.
A maioria destas neoplasias ocorre nas áreas de transição mucocutânea, não protegidas por pêlos e expostas ao sol. Os tumores localizam-se, predominantemente, na terceira pálpebra e no limbo lateral, e o seu crescimento, geralmente começa na borda externa. O tumor desenvolve-se através de uma série de estágios pré-malignos (placas epidérmicas e papilomas), progredindo ao longo de meses ou anos para o carcinoma in situ e posteriormente, para o carcinoma epidermóide invasivo. Os estágios pré-malignos apresentam altas taxas de regressão (30 a 40%).
Comumente, os tumores de células escamosas pré-malignos caracterizam-se por placas pequenas, brancas, elevadas e hiperplásicas, ou ainda por estruturas semelhantes a papilomas, com superfícies verrucosas. Tais estruturas causam irritação evidente na conjuntiva adjacente, resultando em lacrimejamento excessivo e, às vezes, secreção purulenta. Já os tumores malignos são irregulares, nodulares, rosados, erosivos e necróticos. Todavia, não é fácil a diferenciação clínica entre o carcinoma e as lesões precursoras, sendo necessário para diferenciação o exame citológico.
O tratamento mais comum para o carcinoma ocular é a cirurgia, mas antes de decidir pelo procedimento, é aconselhável considerar: valor do animal, estágio da lactação, localização e extensão do tumor.
O diagnóstico precoce da patologia, quando a massa tem menos de 2 cm de diâmetro, permite a consideração de algumas opções de tratamento:
- cirurgia precisa => remoção do tumor com pequena cirurgia. Nos casos em que o carcinoma localiza-se na terceira pálpebra, deve-se realizar a remoção completa desta estrutura.
- radiação => o carcinoma é radiossensível e as lesões pequenas respondem bem à aplicação de radiação.
- criocirurgia => aplicação controlada de nitrogênio no tumor com a devida proteção do restante do olho. O tecido congelado se descola cerca de 10 dias após a aplicação, sendo gradualmente substituído por um tecido de granulação
- imunoterapia => são utilizadas vacinas autógenas feitas a partir do tecido tumoral, mas ainda existem muitas questões obscuras sobre esta técnica.
A massa palpebral maior (com mais de 5 cm de diâmetro) tem menor chance de sucesso com o tratamento, pois a destruição ou remoção do tecido palpebral afetado pode ocasionar danos e exposição ocular. Além disso, os tumores maiores podem ainda invadir os tecidos anexos, ligamentos orbitais e o osso craniano adjacente. Vale a pena destacar que os tumores localizados no canto medial são os mais perigosos, pois alcançam facilmente o ligamento orbital e, conseqüentemente, a órbita óssea. As lesões grandes exigem a enucleação (excisão do núcleo) ou evisceração (excisão do globo ocular), ou até mesmo, o descarte do animal.
Por fim, fica a mensagem que visa voltar a atenção do leitor para os distúrbios oculares dos bovinos, e o alerta para que seja realizado o diagnóstico e o tratamento mais precoce dos carcinomas epidermóides oculares.
Fonte:
WILLIAMS, L.W.; GELATT, K.N. Food Animal Ophthalmology. In: Gelatt, K.N.
Veterinary ophthalmology, 2ed. United States of America: Williams & Wilkins, 1991. Cap. 18, p.606-751.
BLASCHI, W. Carcinoma Epidermóide Ocular Bovino. In: Residência de Clínicas Veterinárias. Universidade Estadual de Londrina, Out., 2002.
Figura 1 - Animal que sofreu evisceração (excisão do globo ocular) devido à ocorrência do Carcinoma de células escamosas