A Úlcera de sola é a afecção mais comum e a mais importante economicamente entre os problemas associados com a laminite. As lesões que comprometem o tecido do talão (tais como a Erosão do talão) e a laminite são os principais fatores responsáveis pela ocorrência da Úlcera de sola.
A lesão ocorre na região adjacente ao processo plantar da falange distal (figura 2). O pesquisador que em 1920 descreveu esta localização anatômica e os fatores mecânicos que contribuem para a ocorrência da lesão foi Dr. Rusterholz, por isso a Úlcera de Sola é também conhecida como Úlcera de Rusterholz.
Figura 1- Aspecto da úlcera de sola
A teoria sobre a associação entre o deslocamento da terceira falange e a ocorrência da lesão foi baseada no estudo dos cascos de animais abatidos (postmortem). Neste estudo, foi observado que muitos animais com laminite e acometidos com Úlcera de sola apresentaram um deslocamento distal da terceira falange. Acredita-se que, inicialmente, um distúrbio no suprimento sangüíneo do tecido córium propicia um dano na junção córium-epidermal e o aumento da elasticidade do tecido córium. Já foi demonstrado em estudos na Inglaterra que a distribuição da queratina na sola do casco é alterada com a presença da Úlcera na sola. Nestes casos, as células basais são localizadas na região suprabasal, esta ocorrência parece contribuir para a deterioração da epiderme nas áreas acometidas com a úlcera, bem como, para a depressão da síntese de proteína, contribuindo para uma baixa qualidade do casco produzido.
Figura 2- A seta aponta a localização usual da Úlcera de sola: região adjacente ao processo plantar da falange distal
Em uma segunda fase, a terceira falange declina verticalmente lesionando o córium adjacente da sola e do talão. A maioria das hemorragias e necroses devido à excessiva compressão do córium são encontradas abaixo do tubérculo flexor, justamente no local descrito por Rusterholz. Na chamada "terceira fase" as lesões tornam-se clinicamente aparentes na sola do casco com a exposição do córium. Esta exposição ocorre devido à baixa qualidade do casco produzido no local, e este "casco fraco" é decorrente dos eventos ocorridos na fase 1 e 2 descritas acima. Mas, é claro que este processo pode algumas vezes ter a "participação especial" do meio ambiente, daí a o determinante papel dos pedregulhos, cascalho, umidade e pisos ásperos na etiologia da Úlcera de sola. Há também algumas evidências que as mudanças hormonais na época do parto resultem em alterações nas propriedades elásticas do colágeno, o qual pode aumentar a mobilidade da terceira falange dentro do estojo córneo, mas a associação do parto com as lesões da sola ainda precisa ser mais estudada.
Figura 3 - Corte transverso do casco
01) animal sem deslocamento da terceira falange
02) animal com deslocamento da terceira falange
* Os cilindros adiposos estão representados em amarelo.
A letra (a) indica que distância vertical entre a borda distal das lâminas da muralha do casco e a saliência distal do córium do talão do casco é significativamente maior nas vacas com Úlcera de casco do que nas vacas sadias.
O coxim digital possui três cilindros paralelos de tecido adiposo: axial, abaxial e médio. Para determinar o grau de declínio da terceira falange nos animais acometidos pela Úlcera de sola e comparar as características do coxim digital entre os animais acometidos e animais sadios, foi realizada uma pesquisa na Universidade de Zurich, na Suíça. Com esta pesquisa foi possível comprovar que a distância entre a terceira falange e a face interna do estojo córneo é menor nos animais acometidos com a Úlcera de sola. Observou-se também que os cilindros de tecido adiposo do coxim digital são menos evidentes nas vacas com Úlcera de sola (figura 3). Foi comprovado que os animais sadios apresentam claramente uma melhor definição do tecido adiposo. O cilindro adiposo axial nas unhas laterais e mediais e o cilindro adiposo central na unha medial foram significativamente menores nos animais com a lesão.A figura 3 evidencia também que a distância vertical entre a borda distal das lâminas da muralha do casco e a saliência distal do córium do talão do casco é significativamente maior nas vacas com Úlcera de casco do que nas vacas não acometidas.
Durante algum tempo os pesquisadores tentaram explicar a patogenia da Úlcera de sola, com muitas especulações e poucas certezas. Todavia, pesquisas tais como as que foram abordadas neste artigo elucidaram muitas questões e abriram novas perspectivas no estudo da prevenção e tratamento da Úlcera de sola.
Fonte:
LISCHER, Ch. J.; OSSENT, P.; RÄBER, M.; GEYER, H. Suspensory structures and supporting tissues of the third phalanx of cows and their relevance to the development of typical sole ulcers (Rusterholz ulcers). The Veterinary Record, v.151, p.694, 2002.