O alojamento social de bezerros leiteiros tem também se mostrado eficaz na redução do estresse associado ao processo de desaleitamento. Esta prática também resulta no aumento do desempenho através da redução da neofobia alimentar, quando os animais que passaram pela experiência do alojamento social são inseridos em grupos maiores após o desaleitamento.
Pesquisas mostram que o alojamento de bezerros em grupos tem aumentado o peso ao desaleitamento quando comparado com alojamentos individualizados, o que provavelmente é devido ao aumento da ingestão de matéria seca durante o período de pré-desaleitamento. Este aumento tem sido atribuído a aprendizagem e socialização dos animais durante a alimentação. Os trabalhos mostram ainda que o agrupamento precoce pode ter uma importante influencia no desenvolvimento dos bezerros. Por exemplo, o alojamento social pode estar associado com benefícios cognitivos incluindo o desenvolvimento do desempenho na aprendizagem reversa e o desenvolvimento do reconhecimento de objetos.
Considerando que o baixo consumo de sólidos antes do desaleitamento está ligado a baixos índices de crescimento e ao prolongamento do período de estabilização do consumo de concentrado, o agrupamento de bezerros durante a fase que precede o desaleitamento pode ainda atuar no encorajamento da ingestão precoce de sólidos, sendo capaz de suavizar a transição alimentar entre a dieta líquida e a sólida. Apesar de ser uma prática utilizada em algumas fazendas, ainda não se conhece quando o contato com o seus pares é necessário para se alcançar o benefício do aumento no consumo precoce de sólidos.
O trabalho realizado por Costa e colaboradores (2015) na University of British Columbia’s Dairy Education and Research Centre teve como alvo de estudo os efeitos do pareamento precoce (6 ± 3 d) e tardio (43 ± 3d) no comportamento ingestivo e ganho de peso antes e após o desaleitamento. Este estudo é o primeiro a explorar o efeito do pareamento tardio na alimentação, em comparação com o pareamento precoce ou alojamento individual.
Foram utilizados bezerros holandeses previamente colostrados com uma quantidade mínima de 4L de colostro (>50g/L de IgG) dentro das primeiras 6hs após o nascimento com auxílio de mamadeira. Ao 6º dia de vida os animais foram distribuídos nos tratamentos: individualizados (8 animais), pareados precocemente (8 pares) e pareados tardiamente (8 pares). Os animais mantidos individualmente foram alojados em baias de 1,2 x 2m em cama de serragem, com contato visual com outros animais durante os 70 dias de período experimental.
Os animais que foram pareados precocemente foram mantidos aos pares, em baias duplas livres de divisão. Os animais pareados tardiamente foram mantidos em baias individuais até os 43 dias de vida, 14 dias antes do desaleitamento. Em ambos os pareamentos, os bezerros dispuseram de espaço com duas vezes a área de uma baia individual (Figura 1). Foram alimentados com leite integral, recebendo do dia 0 ao 28º dia de idade 8L divididos em duas refeições diárias. A partir do 29º até o 49º dia, a dieta líquida foi reduzida pra 6L, também fornecidos em duas refeições diárias. Do 50º ao 54º dia de idade, o leite foi reduzido em 20% por 5 dias até serem completamente desaleitados aos 55 dias de vida. Os animais tiveram acesso a água e a dieta sólida (dieta total - silagem de milho, silagem de capim, feno de alfafa e concentrado). Os animais foram pesados semanalmente.
Figura 1. Baia com animais pareados. Foto cedida por João C.H. Costa.
Os resultados obtidos mostram que os bezerros pareados precocemente consumiram mais dieta sólida ao longo do período de desaleitamento, além de apresentarem maior ganho de peso corporal quando comparados a bezerros alojados individualmente ou pareados tardiamente.
A ingestão de dieta total foi similar para os três grupos (Figura 2), mas bezerros precocemente pareados consumiram mais concentrado inicial e consequentemente tiveram uma maior ingestão total de sólidos quando comparados a animais pareados tardiamente.
Figura 2. Média de consumo de dieta sólida por bezerros alojados individualmente e pareados precoce ou tardiamente.
1º gráfico: Consumo dieta total (kg/d) x Semanas de vida
2º gráfico: Consumo de concentrado (kg/d) x Semanas de vida
3º gráfico: Consumo total de sólidos (kg/d) x Semanas de vida
Após o desaleitamento o consumo aumentou em todos os grupos, mas foi maior para os animais pareados precocemente, os quais também ganharam mais peso (0,89 vs 0,76 e 0,73 kg/d) quando comparados com os outros dois tratamentos durante o período experimental (Figura 3). Este aumento no ganho de peso diário pode ser explicado pelo maior consumo de sólidos, fator que provavelmente se tornou o mais importante para o crescimento após a 4ª semana de idade, quando o fornecimento da dieta líquida foi reduzida de 8 para 6 L.
Figura 3. Média de ganho e peso diário durante todo o período experimental (ganho de peso diário kg/dia x tipo de pareamento).
Estudos anteriores não mostraram diferenças no consumo de dieta sólida entre bezerros pareados ao nascer quando comparados com animais pareados na 3ª semana de vida. Os resultados obtidos deste estudo indicam que o agrupamento deve ser feito nas primeiras 6 semanas de vida para se garantir benefícios, com destaque para o período entre a 3ª e a 6ª semana como a fase crítica para o agrupamento, isto por não haver diferenças entre animais pareados na 3ª semana quando comparados com animais agrupados ao nascer. Uma vez baseados nestes resultados a recomendação é que seja feito o agrupamento dentro das primeiras 3 semanas de vida.
Embora todos os tratamentos tenham exibido crescimento durante o desaleitamento na 7ª semana de idade, este parâmetro foi mais pronunciado nos animais individualizados quando comparados com animais precoce ou tardiamente agrupados, indicando uma vantagem para se começar a agrupar durante a fase de desaleitamento.
Segundo o corrente estudo, se espera que os efeitos do alojamento social no consumo de sólidos sejam maiores para bezerros com alto consumo de leite. Sendo este parâmetro o mais variável para bezerros jovens, provavelmente por serem mais fáceis de serem detectados em bezerros os benefícios da criação social no consumo inicial de sólidos. Neste contexto, o consumo de concentrado foi consistentemente alto, assim como as diferenças no consumo de forragem, o que provavelmente ocorreu em função da socialização e aprendizagem social. Estes dados sugerem que quando alojados socialmente, os bezerros consomem mais sólidos, simplesmente porque sua atenção é atraída pelos seus parceiros sociais.
Em conclusão, bezerros leiteiros são beneficiados pelo agrupamento precoce, quanto ao consumo de sólidos e aumento de ganho, o que para ser alcançado precisa ser feito ainda dentro das primeiras 3 semanas de idade.
Referências bibliográficas
J. H. C. Costa, R. K. Meagher, M. A. G. von Keyserlingk, and D. M. Weary. 2015. Early pair housing increases solid feed intake and weight gains in dairy calves. J. Dairy Sci. 98:6381–6386.
Comentários
Trabalhos recentes têm demonstrado a importância do agrupamento de animais em aleitamento no seu bem estar e manifestação de comportamentos lúdicos, muitas vezes acompanhados de aumento no consumo de alimento e consequentemente nas taxas de crescimento. Sendo animais gregários, os bezerros se beneficiam seja do pareamento ou do agrupamento com maior número de animais em idades bem jovens, como demonstrado no trabalho. No entanto, o alojamento individual auxilia na redução da disseminação de doenças como as diarreias e as doenças respiratórias; além de auxiliar no controle individual de consumo. No que diz respeito ao alojamento aos pares, é provável que a disseminação de doenças não seja tão marcante quanto quando o alojamento é realizado em grupos de 8-10 animais. Assim, o pareamento precoce pode ser uma alternativa intermediária para atender dois pontos importantes na criação de bezerras em aleitamento: manter a saúde e aumentar a socialização. Estes dois aspectos associados resultarão em maior consumo de alimentos e consequente maior ganho de peso.