O período de desaleitamento é uma fase de grandes mudanças na vida do bezerro, que pode resultar em perdas dos ganhos obtidos na fase de aleitamento e ainda prejudicar o sistema imunológico do animal. Desta forma, estratégias que busquem minimizar os efeitos desta transição tem sido alvo de pesquisas. Uma destas estratégias é a redução gradual da quantidade de dieta líquida, de forma a estimular o consumo de concentrado, minimizando assim o estresse com a interrupção do fornecimento da dieta líquida. Além disso, outra mudança importante neste período é o sistema de alojamento, quando o animal que geralmente está mantido individualizado passa a ser agrupado em pequenos lotes, interagindo com outros animais.
Em geral recomenda-se que o bezerro permaneça alojado individualmente por algum período após o desaleitamento, com objetivo de reduzir ocorrência de doenças respiratórias que os acometem quando são introduzidos no lote. A freqüência de doenças respiratórias quando os animais são introduzidos no lote é aumentada, pois o sistema imunológico dos mesmos está prejudicado em decorrência do alto nível estresse.
Desta forma, um grupo de pesquisadores da Espanha realizou estudos com objetivo de avaliar estratégias de alojamento de forma a reduzir o estresse dos animais durante o desaleitamento.
O primeiro desses estudos teve como objetivo avaliar o efeito da manutenção de animais em sistema de alojamento individualizado por mais 6 dias após o desaleitamento. Todos os bezerros foram desaleitados aos 56 dias de vida, sendo que metade deles permaneceu nos alojamentos individuais 6 dias após o desaleitamento e, a outra metade foi alocada em grupos de 8 bezerros assim que desaleitados.
Os animais apresentaram desempenho semelhante durante o período de aleitamento (Tabela 1). No entanto, após o desaleitamento os animais mantidos individualizados por mais 6 dias apresentaram menor ganho de peso, resultando em maior número de dias para que atingissem o peso final (115kg). Este efeito após o desaleitamento fez com que o ganho de peso do período total de avaliação fosse menor para os animais mantidos individualizados.
Tabela 1. Efeito do período após o desaleitamento para o agrupamento no desempenho de bezerros
Além disso, contrariando as expectativas, as chances de apresentar problemas respiratórios foram duas vezes maiores em bezerros mantidos individualizados após o desaleitamento. Esses resultados contradizem a recomendação tradicional de que se deve manter os bezerros por 7 a 14 dias adicionais nos alojamentos individuais. Uma possível razão encontrada pelos autores para a maior incidência de doenças respiratórias dos bezerros mantidos individualmente, assim como o menor desempenho, é que os alojamentos utilizados não possuíam espaço para exercício, pois possuíam medidas espaço de 1,1 x 1,6 m, o que pode ter limitado a qualidade do ambiente conforme o aumento de tamanho do animal. Assim, avaliações destas práticas de manejo devem ser realizadas em outros tipos de abrigos individuais.
Seguindo a mesma linha de pesquisa, um segundo estudo avaliou a introdução de animais em grupos antes do desaleitamento. Os animais foram desaleitados aos 56 dias de vida, sendo que metade deles permaneceu em alojamentos individuais até o 56º dia e a outra metade foi movida para grupos de 8 bezerros aos 49 dias (7 dias antes de serem desaleitados). Também aos 49 dias todos os animais que estavam recebendo 4 L de leite por dia, passaram a receber apenas 2L.
Os bezerros agrupados aos 49 dias tiveram maior peso corporal e ganho de peso aos 56 dias de idade em relação aos que permaneceram nos alojamentos individuais (Tabela 2), o que se deve ao fato de que esses animais apresentaram também maior consumo de concentrado (Tabela 2; Figura 1). Algumas hipóteses foram levantadas para justificar este aumento de consumo: os alojamentos individuais não eram adequados e influenciavam negativamente o consumo; os grupos promoveram um maior bem estar nos animais, resultando no maior consumo. Dados da literatura indicam que mover os animais para grupos pequenos (8 a 16), promove uma maior interação social entre os animais, e favorece o aumento no consumo de concentrado.
Tabela 2. Desempenho e consumo em bezerros de acordo com o tempo de socialização
Figura 1. Consumo de concentrado de bezerros agrupados aos 49 dias (cinza), ou 56 dias (preto) dias de idade. ** (P <0,005) e * (P<0,10) dentro das faixas de idade.
Não foi observada ocorrência de mamada cruzada ou mamada não-nutritiva, o que é um problema comum quando do agrupamento de bezerros. Como retratado em outros Radares Técnicos, a mamada cruzada geralmente esta relacionada ao baixo consumo de concentrado, o que não ocorreu neste experimento, já que todos os animais desaleitados já possuíam um consumo de concentrado superior a 700g/dia.
Quando a dieta líquida foi reduzida de 4 para 2L por dia, o índice de doenças respiratórias foi de 34% nos animais agrupados aos 56 dias, enquanto nos animais agrupados aos 49 dias foi de apenas 20%. Esses resultados mostram que a saúde dos animais melhorou quando o agrupamento foi feito no momento de redução da quantidade de sucedâneo, aos 49 dias.
Conclusão
O momento de mudança do manejo individual para os lotes pode alterar o desempenho após o desaleitamento dos animais. Mover animais de abrigos individuais para grupos, imediatamente após o desaleitamento, melhorou o desempenho e reduziu pela metade o risco dos bezerros apresentarem problemas respiratórios após o desaleitamento. Além disso, mover os animais para os lotes no momento em que é feita a redução do leite, aos 49 dias, aumentou o consumo de matéria seca, crescimento corporal e a saúde dos animais, quando comparado a redução do leite nos alojamentos individuais. O autor recomenda que os animais sejam introduzidos nos lotes antes de começar a redução do fornecimento de dieta liquida.
Referência
Bach, A.; Ahedo, J.; Ferrer, A. Optimizing weaning strategies of dairy replacement calves. J. Dairy Sci. V.93, p.413-419, 2010.
Comentários
Embora seja recomendação tradicional manter bezerros nas mesmas instalações no período logo após o desaleitamento de forma a reduzir o estresse, o presente trabalho não comprova este benefício. Entretanto, os próprios autores questionam a qualidade dos abrigos individuais no que diz respeito ao dimensionamento dos mesmos para bezerros mais velhos. Temos observado a campo benefícios desta prática de manejo, mas sempre em sistemas de produção que adotam abrigos do tipo casinha tropical. Vários trabalhos tem recomendado o agrupamento de bezerros ainda em aleitamento de forma a estimular o consumo de concentrado, exatamente como observado no estudo relatado. No entanto, outros trabalhos mostram que nem sempre se observa este benefício, principalmente devido a diferença na idade e, conseqüentemente, no tamanho dos animais no lote. Quando os lotes não são bastante homogêneos, em termos de peso e altura, é grande a competição dentro do lote, fazendo com que o consumo médio do lote seja adequado, mas o consumo individual seja bem variável. Assim, além de se preocupar com o dimensionamento de abrigos individuais para que também sejam adequados para animais mais velhos, o produtor deve sempre estar atento a homogeneidade dentro do lote.