Nos últimos dias, tornou-se destaque o desabafo, por meio de um vídeo nas redes sociais, de um produtor de leite se Santa Cruz do Sul/RS sobre o preço do óleo diesel. No vídeo, ele procura mostrar quanto precisa comercializar para abastecer o seu trator com 57 litros de diesel. No dia em que o vídeo foi publicado, 5 de outubro, o produtor precisava vender 181 litros de leite, ou 41 dúzias de ovos ou 7 sacas de milho.
Segundo publicado pelo Ministério da Agricultura a produção de leite brasileira aumentou 673%, enquanto que a demanda aumentou 240% entre 1974 e 2015. Por si só, essa discrepância entre os dois aumentos explica a tendência de desvalorização de preço para o produtor. A relação entre oferta e demanda é o primeiro fator a ser analisado quando voltamos os olhos para o mercado. No cenário atual brasileiro, com altos índices de desemprego, a demanda ainda não tem previsões de aumentar, pressionando a indústria a reduzir os preços dos produtos finais, e, portanto, diminuindo o preço pago ao produtor.
O gráfico de produção, de 1961 até 2015, apresentou crescimento durante quase todo o período, enquanto o gráfico de consumo demostrou um comportamento bem cíclico, intercalando períodos de aumento com redução. O deslocamento para produtos substitutos em função da mudança de gostos e preferências pode explicar a diminuição do consumo da bebida, percebida a partir de 2014. O leite de soja, por exemplo, é um substituto para o leite bovino, o que o tornou um concorrente direto. Com cada vez mais competitividade no mercado, o simples fato de se produzir e entregar para a indústria já não mais garante sustentabilidade para a propriedade rural.
Hoje a tendência de qualquer setor da economia mundial é a redução de custos, e os agronegócios estão seguindo para esse caminho. No cenário econômico atual brasileiro, o governo tem cada vez menos capacidade de atuar de forma direta no mercado, garantindo preços mínimos, ficando mais com o papel fomentador da agricultura, subsidiando financiamentos de safras. Levando em consideração esses cenários, o produtor tem que buscar dentro da sua propriedade meios de reduzir seus custos fixos, aumentando a sua margem de lucratividade.
No caso desse produtor apresentado no texto, ele fala do impacto do preço do diesel na sua propriedade. Prestando uma mini consultoria, sem conhecer mais profundamente a realidade dele, podemos propor algumas possibilidades.
Primeiro, o produtor poderia buscar parcerias com vizinhos, por exemplo, realizando compras coletivas de diesel, aumentando o poder de barganha e podendo conseguir um preço mais baixo por litro com o fornecedor, ou diretamente com um distribuidor/refinaria. Essas compras coletivas não se limitariam apenas ao diesel e também outros insumos poderiam ser adquiridos da mesma maneira.
Em uma alternativa mais complexa, o produtor poderia organizar uma associação ou cooperativa entre agricultores vizinhos. O recolhimento de leite poderia ser centralizado, podendo obter uma maior força com a indústria. Essa associação poderia gerar um tambo coletivo, onde os produtores centralizariam o seu manejo retirando o leite em um local adequado. Até mesmo uma agroindústria poderia surgir, onde os próprios produtores poderiam comercializar os derivados de leite, diminuindo a influência das variações de mercado na sua lucratividade. Dessa maneira deixariam de ser produtores de insumos, para entregar produtos processados diretamente para o consumidor final.
O Brasil é reconhecido internacionalmente pela exportação de seus produtos agrícolas, mas a cadeia leiteira é pouco relevante nesse quesito. Nesse fator, dependemos de políticas públicas que incentivem a exportação de leite. Acordos internacionais se fazem necessários nesse caso, tanto para certificar as indústrias, como também os produtores às exigências dos mercados internacionais. Apesar de ser o 4º maior produtor de leite do mundo (referência), somente a partir de 2002 que as exportações tomaram algum destaque no Brasil. Existe muito espaço para ações governamentais que façam a produção leiteira brasileira atingir o mundo. Essa seria uma maneira de estimular o mercado a remunerar melhor o produtor pela redução da oferta.
A prioridade do produtor é se manter sustentável, reduzindo os seus custos de produção e buscando alternativas de comercialização da sua produção. Os cenários nem sempre estarão desfavoráveis, mas também nem sempre ruins, para se diferenciar no mercado é preciso buscar alternativas principalmente em momentos de crise. Frisa-se principalmente a cooperação entre os próprios agricultores, pois se a base de insumos é a mesma, por que não unir forças para adquiri-los? Por que não utilizar uma mesma infraestrutura? Por que não comercializar conjuntamente? As oportunidades estão aí, basta enxergá-las.