Nos dias que antecedem o parto, o rápido crescimento do feto e o desvio de nutrientes para a produção de colostro aumentam os requerimentos nutricionais das vacas. Ao mesmo tempo, o consumo de alimentos normalmente cai em torno de 20%.
Estes eventos opostos colocam o animal em deficiência, principalmente energética, protéica e de cálcio. O cálcio é crítico nesta fase por relacionar-se com as contrações musculares o que faz com que mesmo uma deficiência subclínica possa comprometer as contrações ruminais (parada ruminal, eventualmente seguida de torção de abomaso), e uterinas (retenção de placenta, seguida de metrite) e o fechamento do esfíncter do teto (predisposição à mastite).
As vacas têm alguns mecanismos para, até certo ponto, compensar estas deficiências através da reservas corporais. Além disso, dietas bem balanceadas no pré e pós-parto podem reduzir a incidência de problemas como febre do leite e cetose, desde que o consumo de alimentos não seja muito afetado no pré-parto. Em outras palavras, se a vaca não comer a dieta, não poderá se beneficiar de seus ingredientes, nas quantidades desejadas. Em função disso, alguns pesquisadores pregam a administração oral de soluções de nutrientes (conhecidas pelo nome em inglês "drench"), como meio de repor nutrientes em períodos críticos, como é o caso do dia do parto. Seu fornecimento é feito através de sondas que colocam a solução diretamente no esôfago da vaca, de onde é naturalmente conduzida até o rúmen. Uma ou duas pessoas com algum treinamento conseguem "despejar" grandes volumes de material de forma relativamente simples, segura e rápida.
Os que recomendam esta técnica sugerem a aplicação de 20-25 litros de solução logo após o parto, justificando este grande volume em dois fundamentos: rehidratar a vaca que acaba de perder abruptamente até 55 litros de fluido e eletrólitos uterinos, e colocar peso adicional no rúmen, para que ele desça até o assoalho do abdômen ocupando o espaço deixado pela saída do feto. Este espaço "aberto" repentinamente após a saída do feto pode permitir que o abomaso deslize por baixo do rúmen para o lado esquerdo da vaca, provocando o distúrbio conhecido como "deslocamento de abomaso", com sérias conseqüências para a saúde do animal (pode até levar à morte).
A este volume de água (morna) podem ser adicionados vários eletrólitos e nutrientes. Os autores sugerem o seguinte:
- A adição de 450 a 650 gramas de propionato de cálcio. A solução irá elevar as concentrações de cálcio no plasma sangüíneo por várias horas neste período crítico. O cloreto de cálcio parece ter efeito mais rápido e também pode ser utilizado, mas tem sido associado a úlceras na boca, esôfago, rúmen e abomaso, devido à sua ação irritante;
- O mesmo propionato de cálcio, ou então, o fornecimento de 300 a 500 ml de propileno glicol ou ainda, 1 a 1,5 litros de glicerol (líquido adocicado) também é bastante utilizado. Estes produtos são precursores da glicose e portanto têm potencial para promover a gluconeogenese (formação de glicose), minimizando a necessidade de mobilização de gordura corporal e reduzindo o acúmulo de gordura no rúmen.
A necessidade de outros ingredientes na solução deve considerar o histórico da fazenda, por exemplo:
- A adição de 100 a 150 gramas de cloreto de potássio é de grande valor na reposição dos eletrólitos perdidos no parto;
- Outro mineral a se considerar é o magnésio. Níveis marginais de magnésio no plasma no momento do parto podem afetar o equilíbrio do cálcio e contribuir para hipocalcemia. A inclusão de 200 gramas de sulfato de magnésio na solução oral fornecida após o parto pode eliminar alguns problemas;
- Em alguns rebanhos, até mesmo baixos níveis de fósforo podem ser problema. 220 gramas de fosfato de sódio elevam o nível de fósforo no sangue por 12 a 24 horas
- Também é freqüente a inclusão de bicarbonato de sódio e leveduras, que atuam melhorando o ambiente ruminal, estimulando a digestão da fibra, enquanto a vaca retorna ao nível de consumo normal. As leveduras normalmente são incluídas nas soluções em concentrações 2 a 4 vezes acima do normal. O bicarbonato pode ser utilizado em doses de 100 a 150 gramas.
É bom ficar claro que nenhum destes ingredientes substitui uma dieta de transição bem formulada e manejada. A finalidade deve sempre ser oferecer um suporte adicional durante um período crítico.
Muitos dos ingredientes propostos têm um bom "fundamento" para seu uso e podem ser úteis para as vacas. No entanto, poucos foram realmente testados para determinar sua real efetividade. Tendo isto em vista, recentemente alguns pesquisadores iniciaram estudos e os resultados iniciais sugerem que pelo menos o propionato de cálcio realmente traz benefícios às vacas. Eles sugerem que, mesmo em rebanhos sem alta prevalência de febre do leite ou cetose, o custo da aplicação preventiva da solução oral com cálcio e energia adicionais pode ser justificado pelo aumento potencial de produção de leite (tabela 1).
Tabela 1: Efeito do tipo de "drench" na produção de leite
No experimento conduzido numa fazenda comercial no Texas, EUA, 169 vacas receberam o propionato de cálcio (680 gramas) ou o propileno glicol (300 ml) diluídos em 12 litros de água no momento do parto e novamente 24 horas depois.
As vacas que receberam tanto o propileno glicol quanto o propionato de cálcio ao parir tiveram incidência significativamente menor de metrite comparadas com os controles. Ocorreram 6 casos de metrite no grupo controle, 1 caso nas vacas que receberam o propileno glicol e nenhum nas vacas que receberam o propionato de cálcio.
Os resultados completos deste estudo foram publicados no mês de junho de 2001 no Professional Animal Scientist 17:115-122 (Stokes and Goff).
Comentário do autor: este tipo de procedimento já foi bastante comentado na mídia e entre os técnicos há algum tempo. Como toda nova tecnologia, esperava-se que solucionasse todos os problemas. Estes dados mostram que seu uso estratégico (períodos críticos) pode ser uma técnica auxiliar de grande valia. É preciso avaliar logicamente o custo dos produtos.
Fonte: Adaptado de: Stokes, S. e Goff, J., 2001. We're learning more about drenching fresh cows. Hoard's Dairyman, September 10. Pág. 575.