Bezerros alimentados com maiores quantidades de leite ou sucedâneo apresentam aumento no ganho de peso diário e na eficiência de ganho durante o período de aleitamento. Por outro lado, sabe-se que o aumento no fornecimento de sucedâneo diminui o consumo de concentrado inicial neste período, podendo limitar o desenvolvimento do rúmen e diminuir o ganho de peso no período pós-desaleitamento. Esta redução deve-se normalmente ao menor consumo de nutrientes totais e menor digestibilidade ruminal.
Uma alternativa para diminuir os prejuízos no desempenho dos animais no período pós-desaleitamento é aumentar a oferta de proteína metabolizável (PM) no concentrado inicial para evitar a limitação de aminoácidos mesmo com baixo consumo pelo bezerro. No programa de alimentação acelerada, o teor de proteína bruta no sucedâneo deve ser maior que o teor de proteína bruta nos sucedâneos convencionais para permitir as maiores taxas de crescimento de tecido magro. Dessa forma, acredita-se que a PB do concentrado inicial também deveria ser maior. O National Research Council (NRC - Conselho Nacional de Pesquisa americano) recomenda 18% de PB na MS, equivalente a 16% de PB no concentrado inicial para bezerros criados convencionalmente. O modelo do NRC sugere que 18% PB no concentrado deveria ser adequado para bezerros alimentados com sucedâneo com maiores teores de PB, e que o fator limitante de crescimento seria mais a energia que a PB. Entretanto, não existem estudos conclusivos de quando um aumento na concentração de PB ou PM no concentrado inicial é necessário.
Assim, foi realizado um estudo com o objetivo de determinar o efeito do teor de PB no concentrado inicial sobre o crescimento de bezerros leiteiros, do nascimento até a 10ª semana de vida em um programa de nutrição para crescimento acelerado, e comparar este programa ao sistema convencional. A hipótese desse estudo foi que maiores concentrações de PB no concentrado inicial deveriam aumentar a fonte de PM, assim como auxiliar na manutenção do crescimento e no período pós-desaleitamento em bezerros no programa de nutrição para crescimento acelerado.
Para a realização deste estudo foram utilizados 89 bezerros da raça Holandês, 64 fêmeas e 25 machos, divididos em três tratamentos:
1. Sucedâneo convencional (20% PB, 20% EE) + concentrado convencional (19,6% PB na MS)
2. Sucedâneo reforçado (28,5% PB, 15% EE) + concentrado convencional
3. Sucedâneo reforçado + concentrado inicial com alta PB (25,5% PB na MS)
O sucedâneo convencional (12,5% sólidos) foi fornecido, duas vezes por dia, a 1,25% do peso ao nascer (PN) de MS de sucedâneo até a quinta semana de vida dos animais, e 0,625% PN de MS de sucedâneo uma vez por dia durante a sexta semana. Já o sucedâneo reforçado (15% sólidos), foi fornecido 1,5% PN de MS de sucedâneo na primeira semana e 2% PN de MS de sucedâneo da segunda até a quinta semana, divididos em duas refeições por dia; na sexta semana os animais receberam apenas 1% PN de sucedâneo. Todos os animais receberam concentrado inicial, dependendo do tratamento, à vontade e foram desaleitados com 42 dias de vida.
Como pode ser observado na Tabela 1, os bezerros do tratamento sucedâneo reforçado + concentrado com alta PB apresentaram maior consumo de matéria seca total, proteína bruta total e energia metabolizável total. O aumento no consumo de concentrado com alta PB fornece maiores quantidades de PB e EM antes e durante o processo de desaleitamento, beneficiando o crescimento e a saúde dos bezerros durante o período de transição no desaleitamento.
O consumo de MS, PB e EM proveniente do sucedâneo foram maiores (P<0,0001) para os bezerros alimentados com o sucedâneo reforçado, quando analisado apenas a dieta líquida; e o consumo de MS, PB e EM do concentrado inicial durante o aleitamento, foi maior nos bezerros alimentados com o sucedâneo convencional.
Tabela 1. Consumo diário de matéria seca (MS), proteína bruta (PB) e energia metabolizável (EM) no sucedâneo e concentrado inicial durante o período de aleitamento (semana 1 a 5) para bezerros recebendo sucedâneo convencional (SC) ou sucedâneo reforçado (SR), e concentrado inicial convencional (CC) ou concentrado inicial com alta PB (CA)
As medidas de crescimento corporal como peso vivo, ganho de peso diário, altura na cernelha e perímetro torácico, foram maiores para os animais do tratamento sucedâneo reforçado (P=0,0001; Tabela 2). No entanto, a esperada vantagem de bezerros recebendo sucedâneo reforçado + concentrado com alta PB sobre os animais recebendo sucedâneo reforçado + concentrado convencional não apresentou diferença estatisticamente significativa (P=0,11) para as medidas corporais de crescimento.
Tabela 2. Medidas corporais de crescimento durante a semana 5, que antecede o desaleitamento, e semana 10 de bezerros recebendo sucedâneo convencional (SC) ou sucedâneo reforçado (SR), e concentrado inicial convencional (CC) ou concentrado inicial com alta PB (CA)
Contudo, neste trabalho os animais que receberam sucedâneo reforçado apresentaram maiores taxas de ganho e eficiência de ganho até a 10ª semana de vida. A eficiência de ganho e o crescimento corporal não foram diferentes entre o concentrado convencional e o concentrado com alta PB. Portanto, foi concluído que o consumo de concentrado na semana pré-desaleitamento é um forte indicador de ganho de peso na semana pós-desaleitamento, e que bezerros deveriam consumir pelo menos 1 kg de MS de concentrado inicial diariamente antes do desaleitamento para garantir crescimento contínuo no pós-desaleitamento, independentemente do sistema de aleitamento adotado.
STAMEY, J.A.; JANOVICK, N.A.; KERTZ, A.F.; DRACLEY, J.K. Influence of starter protein content on growth of dairy calves in an enhanced early nutrition program. Journal of Dairy Science, v.95, p. 3327-3336, 2012.
Comentários
É crescente a adoção de programas de aleitamento intensivo no Brasil, principalmente devido a possibilidade de aumentos no potencial de produção de animais alimentados com maiores volumes de leite. No entanto, para que este sistema funcione e resulte em aumentos no ganho de peso dos animais, assim como no potencial de produção, o sucedâneo fornecido deve apresentar maior teor de proteína bruta do que os sucedâneos para aleitamento convencional. Os trabalhos na literatura que mostram vantagens desse sistema apresentam na maior parte das vezes 28% de PB, enquanto que os produtos que temos disponíveis no mercado tem em torno de 22% de PB. Além de maior teor de PB no sucedâneo, é importante que a composição do concentrado também seja ajustada de forma que o suprimento de proteína metabolizável não seja drasticamente reduzido por ocasião do desaleitamento. Assim como tanto outros trabalhos, este também mostrou que muitas vezes o fator de maior impacto para o desempenho adequado logo após o desaleitamento é o consumo de concentrado. Práticas que maximizem ganho de peso no período de aleitamento devem sempre considerar seus efeitos no que diz respeito a o consumo de concentrado para que o desaleitamento seja realizado com sucesso. Adicionalmente, alguns trabalhos também já mostram alta correlação do consumo de concentrado ao desaleitamento com a produção de leite futura dos animais.