Entretanto, é oportuno considerar que esse movimento não é uniforme em todos os estados. A rigor, até agora, apenas MG e GO de fato têm reduções de preço anunciadas. Nos demais estados, se fala em estabilidade ou até alguma elevação. O Conseleite do Paraná, por exemplo, fala em elevação de 1,4 centavo ou 2,35% em relação a maio. No Rio Grande do Sul, apesar da redução anunciada pela Eleva em algumas regiões, na média os valores parecem estáveis, o mesmo ocorrendo em São Paulo. No RJ, a briga entre Parmalat e Perdigão mantêm as cotações elevadas.
O que houve, portanto, em Minas Gerais e Goiás? A indústria desses estados têm sugerido que o movimento nada mais é do que um ajuste de preços em relação a Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que ficaram mais competitivos para acessar o principal mercado, representado por São Paulo.
O gráfico 1 dá uma pista de que de fato, os preços em Goiás e Minas Gerais se distanciaram em relação aos estados do sul a partir da segunda metade do ano passado, depois da forte elevação das cotações em todo o país. Enquanto após o pico, PR, RS e mesmo SP verificaram uma redução significativa nos valores, MG e GO caíram bem menos.
De julho de 2005 a março de 2007, o preço médio em MG era R$,038 por litro maior do que a cotação do PR. De setembro de 2007 até maio de 2008, a diferença subiu para R$ 0,085. Em relação a SP, o preço goiano de julho de 2005 a março de 2007 era R$ 0,022 menor; de setembro de 2007 até maio de 2008, passou a ser R$ 0,04 maior.
O gráfico 2 mostra as duas diferenças (MG-PR e GO-SP). Fica evidente que a perda de competitividade de MG e GO frente a PR (e também RS e SC) e SP. Porém, nota-se que essa diferença já vinha sendo consumida nos últimos dois meses, dando mostras do enfraquecimento relativo em MG e GO já a partir de março.
Porque a diferença entre esses estados subiu no segundo semestre de 2007 e início deste ano? A razão principal provavelmente foi a agressividade de empresas exportadoras, que puderam manter preços mais elevados no final do ano passado mesmo em um ambiente de queda de preços. Hoje, o cenário externo é bem menos favorável; os preços externos estão cerca de 15% mais baixos do que nos picos de 2007 e o câmbio está também entre 15 e 20% pior para exportar.
Outro aspecto relevante foi a forte concorrência na região que engloba Sudoeste Mineiro, Triângulo Mineiro, Alto Paranaíba e Sul de Goiás, que produzem uma quantidade importante do leite brasileiro, além de reunir muito leite spot, mais sensível a especulação. Além das principais exportadoras Itambé e Nestlé, a Eleva (Perdigão), Italac, Parmalat, Piracanjuba, Embaré e Morrinhos mostraram apetite, acompanhadas por empresas locais, como a CALU, de Uberlândia. A Nestlé, ao passar a captação da fábrica de Ibiá de 400 mil para 1 milhão de litros diários (mudando o mix de produtos da fábrica), precisou de leite. O resultado disso foi a elevação das cotações e um certo descolamento em relação aos preços de outros estados.
Também, aponta-se o crescimento da produção de leite em MG e GO. Há relatos de crescimento entre 15 e 25% na captação de várias empresas, no primeiro semestre de 2008 em relação ao primeiro semestre de 2007 que, diga-se de passagem, foi um semestre de baixo crescimento, muito diferente do segundo semestre de 2007. Esse crescimento, conforme já comentado em artigos anteriores, não foi acompanhado pela elevação das cotações do longa vida, pó e condensado no atacado. Ainda, Goiás perdeu os 2% de isenção de ICMS que tinha e, com isso, o final da campanha de marketing de leite, que ajudava a consumir o excedente goiano.
Para complicar, São Paulo passou a recolher 18% de ICMS sobre o leite UHT que vem de fora, o que piorou a competitividade desse leite. Provavelmente, a recuperação dos preços em São Paulo (veja novamente o gráfico 1), praticamente se equivalendo a MG e GO, se deve a isso, ainda que nao se possa provar e que, especula-se, parcela importante do varejo (por exemplo, o pequeno e médio varejo) não esteja aplicando a legislação até por desconhecimento. De qualquer forma, São Paulo deve voltar a ter o maior preço do país, como ocorria até meados do ano passado. No caso de MG, um fator adicional: o leite cru passou a recolher os 12% de ICMS para transitar para SP, sendo mais um fator a dificultar a competitividade do leite mineiro.
Essa é a explicação da movimentação atual. É difícil a previsão futura. Há quem especule que as quedas continuarão, contaminando outros estados, outros acham que o ajuste é pequeno, dependendo de uma pequena redução da oferta, que seria suficiente para estabilizar os preços. Mercado externo e crescimento econômico interno são também variáveis relevantes nessa equação.
A palavra de ordem continua sendo cautela, tanto para produtores como para a indústria. Com novas plantas sendo construídas, com preços recorde de vacas (aliás, é provável que a falta de animais será um gargalo que teremos em breve) e custos nas alturas, um tranco muito forte vai resultar em escassez de leite no ano que vem. Para o produtor, é fundamental manter-se informado e controlar custos, dentro do possível.
Gráfico 1. Preços do leite ao produtor nos principais estados produtores.
Gráfico 2. Diferenças entre as cotações entre MG-PR e GO-SP.