Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, a captação de leite em julho aumentou 10,4% frente a junho, ficando cerca de 15% acima do volume obtido no mesmo mês de 2006. Os dados mostram que os preços mais altos pagos pelo leite estimularam um maior investimento em produção. Até julho, segundo o Cepea, a captação foi 4,4% superior à do mesmo período do ano passado. O IBGE disponibilizará os dados oficiais do primeiro semestre no final de setembro.
Agentes do mercado reportam que em agosto também houve acréscimo significativo de produção, impulsionada pelos altos preços do leite. No entanto, com o clima bastante seco na maior parte do interior do país, principalmente em Minas Gerais e Goiás, para os próximos dois meses o aumento de oferta ainda é incerto. Falta pasto e a alimentação armazenada está acabando.
No ano passado, com os preços do leite em baixa, muitos produtores, desestimulados, não investiram em alimentação suplementar e, portanto, não estavam preparados quando houve forte demanda pela matéria-prima. Afinal, mesmo com uma tendência de redução de oferta por causa do desestímulo, não era previsto um significativo aumento de preços como houve em 2007.
Outro fator que pode direcionar o ritmo da produção ainda é o aumento de custos dos grãos para alimentação animal. Segundo dados do Cepea, a saca de 60kg de soja no Paraná na primeira quinzena de setembro ficou 34,5% acima da obtida no mesmo mês de 2006 e 18% superior à média de janeiro.
Os preços do milho na primeira quinzena deste mês ficaram em média a R$ 26,12 por saca de 60kg, o que representa um aumento de 45,6% frente ao mesmo mês do ano passado e 4,4% em relação a janeiro deste ano.
Gráfico 1. Evolução dos preços da saca de 60 kg de milho (em Campinas/SP) e soja (no Paraná).
A pressão do setor varejista, que reteve as compras de leite longa vida no período de férias (produto que registrou alta significativa nos últimos meses e que, em consequência disso, obteve uma redução de consumo), forçando uma redução de preços, já atingiu o mercado de leite spot (comercialização entre as indústrias).
Segundo agentes de mercado, o valor do leite no mercado spot caiu cerca de R$ 0,10/l entre a primeira e a segunda quinzena de setembro, ficando em cerca de R$ 0,80/l, e ainda há espaço para nova redução. Isso porque a tendência é que a indústria comercialize menos leite spot e invista mais no leite adquirido diretamente de produtores. Nesse sentido, é possível que a fase dourada do leite spot, ao menos nesse ano, tenha passado. Em agosto, ultrapassou R$ 1,00/l em algumas negociações, principalmente em São Paulo.
O aumento da produção nos últimos meses e a diminuição das compras do varejo para pressionar o mercado de leite longa vida fez com que o estoque desse produto nas indústrias aumentasse um pouco. Além disso, há alguma ociosidade industrial, algo que, segundo agentes do setor, não se observa na indústria de leite em pó e queijos.
As reduções de preços observadas na indústria e varejo ainda não chegaram ao produtor em setembro, quando o pagamento feito é relativo à produção de agosto. Para este mês, ainda deve haver estabilidade ou leve aumento de preços, porém seguramente em menores proporções que os acréscimos verificados nos meses anteriores (gráfico 2), segundo agentes do setor.
Para outubro, seguindo o comportamento previsível, a tendência seria de alguma redução dos preços pagos aos produtores, com o "efeito dominó", em função das reduções no varejo e indústria. Agentes ligados ao setor de laticínios acreditam que a diminuição do preço do leite possa vir nas mesmas proporções dos aumentos dos últimos meses, mas ainda assim, os valores pagos devem se manter em elevados patamares. Porém, é preciso cautela nessa análise. Afinal, a falta de chuvas e a sustentação do mercado externo fazem com que uma eventual tentativa de redução do preço ao produtor por parte de algum laticínio resulte em perda importante de volume captado.
Gráfico 2. Aumento de preços no campo em relação ao mês anterior, em centavos por litro.
Uma outra questão é a intenção de aumento de captação de leite ou instalação de várias novas indústrias de laticínios no país, como tem sido regularmente noticiado na mídia. Esse fato pode ser importante para ajudar a segurar os preços pagos aos produtores, visto que as empresas terão que fortalecer a relação com os fornecedores e garantir suprimento para rodar as fábricas.
No mercado internacional, os preços seguem firmes nos elevados patamares atingidos há alguns meses. No caso do leite em pó integral, manteiga e óleo de manteiga exportado da Europa, há inclusive novos recordes em setembro, segundo dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).
A alta generalizada de leite no mundo vem servindo de "âncora" no mercado interno, visto que os atuais níveis de preços atraem as indústrias exportadoras brasileiras. No entanto, essa transição por que passa o setor sugere um desatrelamento, ainda que momentâneo, dos preços internos com os externos. A variável-chave nesse momento será a quantidade de leite destinada à exportação, especialmente a partir do momento em que chegue a oferta de safra no Sudeste e Centro-Oeste. Se suficiente para escoar um eventual excesso de oferta, poderá haver manutenção dos preços em patamares ainda bastante atrativos e alinhados aos preços externos. Nesse sentido, empresas com um canal aberto no mercado internacional deverão ser favorecidas.
Os custos mais elevados tendem ainda a sustentar os preços pagos no campo, visto que, caso a remuneração dos produtores não cubra os gastos, poderá haver queda de produção, o que prejudicaria o abastecimento das várias empresas que necessitam de matéria-prima, principalmente com os diversos investimentos em ampliação da capacidade de produção.