Preços em alta, produção reduzida com o início da entressafra, mercado atacadista aquecido e valores no varejo reajustados. Esse foi o cenário do mês de março, na maior parte do país. Os produtores receberam, na média nacional, 10% a mais pelo leite produzido em fevereiro, segundo dados do Cepea-Esalq/USP, reflexo da maior concorrência pela matéria-prima em função do recuo na produção e da Páscoa. A média nacional em março (leite de fevereiro) ficou em R$ 0,6795/litro, com a captação mostrando recuo de 4,04% de janeiro para fevereiro, de acordo com o Índice de Captação de leite do Cepea (ICAP-L).
No final de março o IBGE divulgou os dados referentes à produção formal de leite no 4º trimestre, com os quais pudemos conhecer o valor da captação formal em 2009: foram 19,6 bilhões de litros, representando uma alta de 1,6% frente à captação de 2008 (gráfico 1). Apesar do recuo na produção no 1º bimestre, a produção este ano está maior: se comparado o ICAP-L de fevereiro/10 com o de fevereiro/09, a produção registra aumento de 2,9%. Ou seja, 2010 começou com mais leite em comparação com 2009.
Gráfico 1. Captação formal de leite no Brasil, por mês, em mil litros.
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As regiões Sudeste e Centro-Oeste abrem a entressafra com condições mais favoráveis aos produtores: em muitas regiões as chuvas caíram por um tempo maior, proporcionando maior período de pastejo; de outro lado, houve uma melhora na relação de troca (preço do leite/custos com alimentação), considerando os menores preços do milho e farelo de soja. Em regiões mais especializadas, os produtores já iniciaram a alimentação do gado, resultando em aumento da produção. Nos próximos meses também deverá aumentar o leite vindo do Sul do país, com o início da safra na região: as pastagens de inverno (aveia/azevém) já começaram a ser plantadas.
No atacado os preços podem já ter alcançado o teto. Algumas indústrias de leite longa vida parecem não estar conseguindo colocar margem maior nos produtos. Segundo agentes consultados pelo MilkPoint, na 1ª semana de abril as cotações para o leite UHT no atacado ficaram em R$ 1,70-1,80/litro. Os queijos e o leite em pó mostraram leve reação em março, e neste início de abril os preços de atacado ficaram entre R$ 9,50-11,00/kg para queijos e R$ 9,50-10,00/kg para o leite em pó. Segundo informações dos agentes consultados, as vendas em outros setores da indústria alimentícia também mostram-se aquecidas, com registros de aumento de vendas de leite em pó para produção de massas, bolachas, sorvetes e iogurtes, o que repercutiu nos reajustes de preços (mesmo que leves) para este produto.
No campo, os produtores devem ter um novo reajuste (de cerca de 4 a 5 centavos) neste pagamento de abril, segundo informou a maioria dos agentes consultados pelo MilkPoint. Os preços médios devem ficar em R$ 0,78-0,83/litro no Sudeste (SP e MG), R$ 0,65-0,70/litro no Sul e R$ 0,75-0,80/litro no Centro-Oeste. Mas algumas indústrias já sinalizaram estabilidade para o pagamento de abril, sendo esta a posição da maioria das empresas consultadas em relação ao pagamento de maio (referente ao leite de abril).
No varejo as altas também foram mais evidentes em março. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE, registrou alta de 4,22% para o leite e derivados, com o maior reajuste no leite pasteurizado (no qual o IBGE engloba o leite UHT): 8,03%. Na pesquisa realizada pelo MilkPoint no varejo de Piracicaba-SP, o preço médio do leite longa vida, em março, foi de R$ 1,87/litro, mostrando uma alta de 11,7% em relação ao preço médio de fevereiro e de 8,6% frente a março/2009 (valor nominal).
O que este cenário mostra é que o ciclo do leite, este ano, se antecipou, com a vinda da safra 1,5 - 2 meses antes e, com isso, a entressafra e o aumento de preços também se anteciparam. Os reajustes, até agora, foram motivados pela redução de oferta de matéria-prima em um cenário de demanda forte. Já o mercado internacional mostrava-se instável nesse início de ano, com as atividades comerciais com outros países estagnadas.
No último leilão realizado pela Fonterra, houve um expressivo reajuste no preço médio do leite em pó integral: 21%, com preço de US$ 3.969/ton, como se pode ver no gráfico 2. Os principais motivos para esse reajuste são a produção menor de leite na Austrália e União Europeia, estoques menores nos Estados Unidos (com exceção dos queijos, que ainda permanecem altos; o CWT reativou o programa de assistência às exportações e realizou, no início de abril, uma operação para exportação de queijo cheddar) e aumento das importações da China e Índia. Apenas no 1º bimestre, um total de 27 mil toneladas de produtos lácteos, no valor de US$ 60 milhões, foram importados através do porto de Xangai, na China e, segundo fontes do setor, este volume é ainda maior, considerando as entradas de outros portos do país. Assim, com oferta restrita de leite no mercado mundial, é possível que os preços tenham novos reajustes. A magnitude da nova safra da Nova Zelândia será importante para definição dos rumos do mercado. Segundo informações da Fonterra, o crescimento do volume captado nesta estação será menor do que o esperado, em função da seca que afeta a região de North Island.
Gráfico 2. Preços do leite em pó integral no Oeste da Europa, Oceania e no Leilão da Fonterra (US$/tonelada).
Em relação ao comércio internacional, no mês de março houve uma queda significativa nas importações brasileiras de lácteos, um sinal positivo. No entanto, a notícia do acordo do Brasil com o Uruguai - pelo qual o Uruguai concede ao Brasil abertura parcial do mercado uruguaio à carne de frango em troca da eliminação de barreiras no comércio de lácteos, carne e pescado fresco - deixou o setor lácteo nacional apreensivo. Temos que considerar também as condições de produção de leite na Argentina, e se os acordos em relação às importações, com este país, serão mantidos. O país está entrando na entressafra, período de maior atenção em relação à entrada de leite de outros países, podendo ser um fator a elevar a oferta de leite no mercado nacional.
Parece estarmos em um mês de transição: início da entressafra no Sudeste e Centro-Oeste, preços reagindo no mercado internacional, mercado atacadista estabilizando, assim como preços no campo. Vamos aguardar os próximos sinais, principalmente aqueles vindos de fora, que no momento, serão os de maior impacto na cadeia como um todo.