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Marcos Sawaya Jank: cadeia produtiva do leite precisa profissionalizar relação entre os elos

GIRO DE NOTÍCIAS

EM 21/11/2001

8 MIN DE LEITURA

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Marcos Sawaya Jank


Marcos Sawaya Jank, engenheiro agrônomo, é professor de agronegócios na Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ/USP) e no PENSA (Programa de Estudos dos Negócios do Sistema Agroindustrial), desde 1989. Atualmente, concentra suas atividades no estudo do comércio agrícola internacional, atuando como consultor do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Washington (EUA).

O Prof. Marcos Jank têm grande ligação com a cadeia do leite, seja como produtor (é um dos sócios da Agrindus, tradicional produtora de leite em São Carlos, SP), seja como consultor de empresas do setor.

Nesta entrevista, ele fala sobre a situação da cadeia do leite no Brasil.

Quem quiser ler a entrevista anterior com o Prof. Marcos Jank, sobre comércio internacional e subsídios, clique aqui.



Analisando o mercado interno de leite, observamos que o mesmo está bastante tumultuado no momento, com preços baixos, excesso de oferta e denúncias de cartelização. O problema é conjuntural ou estrutural ? Falta um projeto de longo prazo para o setor ?

MSJ: O que o leite vive hoje não é diferente do que ocorreu nos últimos anos. O grande problema do setor não é o leite importado com dumping ou os oligopsônios. O principal problema é que ainda temos uma situação de enorme instabilidade, fruto de uma visão de curtíssimo prazo principalmente por parte da indústria organizada, baseada na aplicação de preços extremamente baixos em um determinado momento, porque está sobrando leite, mesmo sabendo-se que isso vai quebrar um grande número de produtores e que, no ano que vem, vai ter de correr atrás do produto, pagando preços bem mais elevados. Na realidade, repete-se no mundo do leite o mesmo problema de falta de visão estratégica de médio e longo prazo que eu comentei antes. Isto acaba resultando numa péssima relação entre produtores e indústrias, que inclusive vêm se deteriorando com o tempo. Se não for feito um esforço – e isso definitivamente não é papel pelo governo – para estabelecer “regras do jogo” mais razoáveis, vamos sempre viver da contagem dos mortos e feridos do setor leiteiro. Este é o maior problema hoje: a relação entre os elos da cadeia, especialmente indústria e produtor.

O que poderia ser feito para redesenhar a relação entre os elos da cadeia, especialmente indústria e produtor ?

MSJ: Um primeiro caminho seria o estabelecimento de contratos mais estáveis entre estes agentes. Mas acho que, antes disso, é fundamental implantar o novo programa de melhoria da qualidade de leite no país. O leite ainda é um sistema muito heterogêneo e por isso mesmo muita gente grande que investiu acabou abandonando a atividade. Será que essas centenas de fazendas que quebraram eram todas “ineficientes”, ou há alguma coisa errada? No meu entender, o que mais faz falta é uma sinalização minimamente razoável de preços. Qual vai ser o preço do produto nos próximos 10 anos? Se disserem que será algo em torno de R$ 0,20 a R$ 0,30/litro, é muito melhor do que algo entre R$ 0,10 e R$ 0,45/litro, por exemplo, porque um produtor especializado não sobrevive com uma flutuação muito grande, mas pode se adequar numa faixa mais estável, sem extremos. A implantação do programa de melhoria da qualidade do leite, ao definir finalmente, com precisão, o que é a commodity leite cru no país, fará o papel de reduzir estas flutuações absurdas de oferta, que não encontram paralelo no mundo desenvolvido.

Tem se falado muito de um envolvimento maior do governo, inclusive em tabelamento, preços mínimos, cotas de produç��o. Trata-se de uma visão equivocada?

MSJ: O Brasil tem uma longa experiência de economia fechada, de construção de planilhas de custo de produção, de tabelamento de preços e hoje sabemos muito bem que tudo isto nunca funcionou: pelo contrário, resultou em enormes problemas de relacionamento entre os elos e não gerou aumento da eficiência da cadeia. O que pode aumentar a eficiência do sistema é deixar o mercado funcionar, inclusive no que se refere às importações, ainda que seja imprescindível aplicar medidas antidumping e direitos compensatórios para coibir dumping e subsídios. Eu acho um horror a utilização de cotas de produção, assim como qualquer forma de preço administrado. O mercado precisa ser livre, mas é necessário avançar nas relações entre os elos. Todas as soluções que estão sendo propostas (planilhas de custos, tabelamento) são medidas de curto prazo que não contribuirão para a melhoria do relacionamento entre os elos da cadeia e não vão resolver os problemas. É necessário trabalhar com um cenário de longo prazo, a partir de metas factíveis. Porque não se consegue reunir a indústria e o produtor e discutir civilizadamente estratégias de longo prazo? Eu acredito que há muitas possibilidades de desenvolver novos relacionamentos contratuais que beneficiem produtores, indústrias e consumidores.

Mas os elos são muito desiguais em força.

MSJ: É claro, e ainda mais no caso do Brasil. Para isso, uma das soluções seria a revitalização do cooperativismo. Enquanto em outros países se verifica um fortalecimento do setor cooperativista, no Brasil, infelizmente, ocorre exatamente o oposto, com muitas cooperativas não tendo conseguido acompanhar o processo de desregulamentação. A atual situação financeira do cooperativismo leiteiro no Brasil dificulta a sobrevivência do pecuarista. A recusa e a incapacidade das cooperativas em se fundirem para competir passa também pela mesma falta de visão de longo prazo que falávamos antes, motivada principalmente por vaidades locais de dirigentes. Há cooperativas que não se fundem apenas porque não conseguem definir quem será o próximo presidente, já que ninguém quer abrir mão do seu “pequeno poder”. E isso vai com certeza levar a cooperativa para o buraco.

Como o Sr. vê a inserção do Brasil no mercado internacional de leite, com a necessidade, pelo menos momentânea, de exportarmos ?

MSJ: Eu considero que o setor ainda é excessivamente heterogêneo. Há produtores extremamente sensíveis a preços baixos, que investiram em tecnologia e qualidade, conseguindo produzir de forma tão eficiente quanto as melhores fazendas americanas. Na outra ponta, há produtores que tiram volumes ridículos de leite no balde, agüentando qualquer desaforo de preço, pois não tem visão empresarial e custo de oportunidade. Isto ocorre também na indústria, onde há empresas profissionais e, ao mesmo tempo, queijeiros produzindo em condições informais extremamente precárias. Esta heterogeneidade precisa acabar, da mesma forma que aconteceu em TODOS os países onde a pecuária leiteira é importante. Nos EUA, por exemplo, isso aconteceu nos anos 60. A especialização das fazendas leiteiras também vai acabar ocorrendo aqui, cedo ou tarde. E uma das formas de apressar o processo é justamente a EXPORTAÇÃO.

Observe, por exemplo, o salto que o frango deu de duas décadas para cá. Qual foi o vetor dinâmico desta transformação? Foi exatamente a inserção do Brasil no mercado internacional. Veja o suco de laranja, o açúcar, o papel e celulose. Compare a cadeia da soja, voltada para a exportação, com a do milho, ainda voltada para o mercado interno. Compare a evolução da laranja com as demais frutas. Veja quem se profissionalizou mais. Mesmo no caso da carne bovina, já começa a ocorrer algo parecido, com a crescente inserção do Brasil no mercado externo. Não tenho a menor dúvida que o mercado externo vai puxar transformações expressivas na cadeia do boi, principalmente se o Brasil conseguir abrir os mercados fechados da América do Norte e da Ásia. Todas as cadeias que foram submetidas à competição internacional, para valer, se tornaram mais articuladas, mais modernas, com produtos e regras mais homogêneas. Eu acho que a inserção do Brasil no mercado internacional de leite é só uma questão de tempo. O país tem todas as condições de participar deste mercado. Porém, mais uma vez: é preciso modernizar a legislação de qualidade de leite e principalmente repensar todo o atual relacionamento entre os agentes da cadeia.

Mas a própria indústria leiteira brasileira não tem valorizado muito a questão da qualidade, embora existam indícios de que isto pode mudar daqui para frente.

MSJ: Nos outros países, a indústria foi forçada a rever seus padrões, seja por necessidade de diferenciação das suas marcas junto ao mercado consumidor, seja pelo governo, que estimulou pagamentos por qualidade e forçou a coleta a granel de leite refrigerado. Nos anos 40, nos EUA, 90% das fazendas tinham vacas leiteiras, ou seja, todo agricultor produzia um pouco de leite. Quando veio a onda da granelização, em menos de 10 anos reduziu-se o número de fazendas para um terço do que era, de 1,5 milhão de fazendas para 500 mil. Hoje, esta especialização já foi muito adiante nos EUA, resultando em fazendas que realizam apenas uma atividade, como produção de leite OU recria de novilhas OU produção de alimentos, de maneira que o sistema como um todo ganhou eficiência com a especialização dos seus agentes. A partir da década de 60, houve também um crescente processo de fusão de cooperativas locais visando ganhar escala. Como resultado final, as relações entre os elos ficam mais transparentes e maduras, a indústria hoje produz alimentos homogêneos e garantidos e o preço flutua muito menos. Este foi um processo extremamente positivo. Agora, aqui no Brasil o processo é muito lento. A indústria não tem capacidade de olhar o médio e longo prazo e acaba “gostando” desta eterna flutuação sazonal de preços. Viver nessa situação instável, com o produtor achando que no ano que vem a situação vai melhorar porque vai faltar leite, reflete uma total falta de planejamento. Estamos vivendo um jogo de perde-perde, onde no longo prazo todo mundo acaba sendo afetado negativamente.

Outra coisa que dificulta o avanço da especialização é o conceito de que um produtor que produz até 50 litros por dia precisa ser preservado. A R$ 0,30/litro, 50 litros/dia, são R$ 450 por mês de receita bruta, o que dá uma retorno líquido inferior a um salário mínimo por família por mês. É essa miséria que precisa ser preservada ? Eu acho que há um equívoco nos programas governamentais de apoio aos pequenos produtores que simplesmente promovem uma “migração” das vacas leiteiras para produtores que não sobreviverão sem subsídios. Isso é mais um exemplo de falta de projeto estruturado de médio longo prazo.


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ANA LUCIA HANISCH

CANOINHAS - SANTA CATARINA - PESQUISA/ENSINO

EM 12/12/2001

Extremamente unilateral e equivocada a opinião do prof. Marcos. Torna-se bastante complicado a formulação de políticas - necessárias - para o setor de lácteos no Brasil, com idéias como essa. É preciso sair das quatro paredes confortáveis de quem faz "análises conjunturais" somente sob o próprio ponto de vista e conhecer a realidade do dia-a-dia da agropecuária brasileira, sem tantas idéias pré-concebidas, por favor.

JUNIO FABIANO DOS SANTOS

CASTRO - PARANÁ - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 28/11/2001

Gostaria de parabenizar o doutor Marcos Jank, principalmente quando afirma que a política agrícola desenvolvida no país em defesa do pequeno produtor é equivocada, pois não gera condições dignas para o pequeno produtor de leite, que, por sua vez, tenta sobreviver informalizando sua produção e aumentando os riscos de problemas sanitários.

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