As altas contagens de micro-organismos psicrotróficos no leite cru continuam sendo o grande problema para a qualidade dos produtos lácteos processados no Brasil. Com a implementação da refrigeração do leite e o transporte a granel, procedimentos que se iniciaram em 2002 com a Instrução Normativa nº 51 do MAPA, as pesquisas em qualidade de leite passaram a quantificar e identificar a microbiota psicrotrófica.
O tipo de microbiota é um ponto relevante para a qualidade do leite pois indica a origem dos micro-organismos deteriorantes, direcionando assim as boas práticas que devem ser aplicadas para reduzir a população bacteriana e obter um leite de melhor qualidade.
A literatura relata bactérias Gram-negativas e Gram-positivas, formadoras ou não de esporos, como psicrotróficos de importância em leite. Dentre estes micro-organismos, as pesquisas internacionais, e depois as desenvolvidas no país, apontaram para o gênero Pseudomonas spp. como predominante em leite cru refrigerado. Este gênero possui a fase lag de crescimento celular curta e uma fase estacionária longa, tendo um curto tempo de geração em temperatura de refrigeração quando comparado com outras bactérias Gram-negativas.
Pseudomonas spp. tem temperatura ótima de crescimento de 25° C a 30° C, são encontradas principalmente em solo e água e são capazes de sobreviver por longos períodos em resíduos de leite. Desta forma, problemas como resíduos de água em equipamentos e ausência de boas práticas de ordenha contribuem para o aumento das populações dessas bactérias no leite refrigerado.
Figura 1 - Pseudomonas spp. com capacidade lipolítica (A) (Ágar tributirina) e proteolítica (B). (Ágar leite 10%) isoladas de leite cru refrigerado
Pesquisas mais recentes, desenvolvidas no Mestrado em Ciência e Tecnologia de Leite e Derivados da Universidade Norte do Paraná (UNOPAR), tem mostrado uma menor população de pseudomonas em leite cru refrigerado quando comparado com o total de psicrotróficos. Os resultados dos estudos concluíram que em média, somente 20% dos psicrotróficos isolados são do gênero Pseudomonas spp. A microbiota psicrotrófica, após as mudanças implementadas para a melhoria da qualidade do leite, pode conter outras bactérias Gram-negativas importantes como os gêneros Alcaligenes, Achromobacter e Flavobacterium. Ou ainda ter uma maior frequência de psicrotróficos Gram-positivos formadores ou não de esporos como os gêneros Enterococcus, Corynebacterium, Arthrobacter, Bacillus e Clostridium. Lembrando que alguns destes micro-organismos, como Bacillus spp. e Clostridium spp. ainda são termodúricos, mantendo células viáveis após o tratamento térmico, o que pode ser um grande problema para produtos como leite UHT e queijos.
Bactérias Gram-negativas, são eliminadas durante o tratamento térmico, porém as enzimas proteases e lipases sintetizas são termorresistentes, gerando prejuízos como redução de tempo devida de prateleira, menor rentabilidade na produção de queijos e defeitos sensoriais nos derivados. A síntese enzimática é associada às altas contagens de psicrotróficos no leite, porém devemos lembrar que a microbiota apresenta diversidade genética. Cada linhagem tem sua capacidade proteolítica e lipolítica, que pode ser expressa de acordo com as condições de estocagem do leite. Dados de nossas pesquisas apresentados recentemente no VII Congresso Brasileiro e Qualidade do Leite (CBQL) (2017) apontam que psicrotróficos, como os do gênero Pseudomonas spp., são capazes de sintetizar tanto proteases como lipases, o que gera maiores problemas para indústria.
Outro estudo apresentado por nosso grupo (CBQL, 2017) mostrou altos índices de ácidos graxos livres em leite decorrente da síntese enzimática das espécies P. putida e P. fluorescens. Estes micro-organismos foram isolados de leite cru, o que aponta para uma microbiota de fato presente em nosso leite com capacidade de sintetizar enzimas durante a estocagem do leite sob refrigeração. Sabe-se que a síntese enzimática acontece no final da fase log de crescimento celular e na fase estacionária, havendo assim maior produção de enzimas quanto maior o tempo de estocagem do leite.
Os links abaixo contêm mais informações sobre nossas pesquisas e a microbiota psicrotrófica em leite cru refrigerado!
Referências bibliográficas:
https://www.scielo.br/pdf/cr/v47n1/1678-4596-cr-0103_8478cr20151540.pdf
https://www.seer.ufu.br/index.php/biosciencejournal/article/view/33396/19757
https://www.pgsskroton.com.br/seer/index.php/uniciencias/article/view/4346/3608
Longhi, R.; Aguiar, B.M.; Santana, E.H.W.; Poli-Frederico. R. C. Pseudomonas spp.: perfil proteolítico e lipolítico em leite cru refrigerado. In: VII Congresso Brasileiro de Qualidade do Leite (CBQL), 2017. Anais...Curitiba: Conselho Brasileiro de Qualidade de Leite , 2017. p. 140-141.
Lira, F.M.; Coelho, B.C.; Luiz, L.L.; Pereira, F.A.B.; Fagnani, R.; Santana, E.H.W. Pseudomonas fluorescens e Pseudomonas putida: efeito da estocagem no índice de ácidos graxos livres em leite. In: VII Congresso Brasileiro de Qualidade do Leite (CBQL), 2017. Anais...Curitiba: Conselho Brasileiro de Qualidade de Leite, 2017. p.142-143.