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Imunidade na glândula mamária

MARCOS VEIGA DOS SANTOS

EM 28/11/2003

9 MIN DE LEITURA

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Prof. Adil Knackfuss Vaz 1

A glândula mamária está envolvida em dois tipos de imunidade: a transferência da imunidade ao recém-nascido e a sua própria proteção contra infecções. Iremos tratar apenas do segundo aspecto, que está relacionado à ocorrência, freqüência e desenlace das infecções intramamárias nos bovinos leiteiros.

As bases da imunidade

A imunidade na glândula mamária pode ser, como em outros sistemas, classificada em dois tipos: a imunidade inata ou inespecífica, e a imunidade adquirida, ou específica. Os próprios nomes são auto-explicativos: a imunidade inata independe de um contato prévio com o agente patogênico, pois é pré-existente, e age da mesma maneira qualquer que seja este agente patogênico. Por outro lado, a imunidade adquirida é um processo de aprendizagem do sistema imune, voltado ao combate de um agente patogênico único. Por isso, requer um contato prévio com este agente, de forma a desencadear no organismo o processo de reconhecimento e eliminação do patógeno. Este contato pode ser uma infecção anterior, a presença do agente em outros pontos do organismo, ou a vacinação contra o agente.

A imunidade inespecífica

A principal via de penetração dos agentes causadores da mastite bovina é o canal do teto. Este canal encontra-se normalmente fechado por um anel muscular no período entre ordenhas, e é bloqueado por um tampão de queratina derivada das células da parede do canal. Esta queratina tem atividade antimicrobiana, mas sua principal função é a de agir como uma barreira física que auxilia a ação do esfíncter do teto. A ordenha ou o ato de mamar remove este tampão e torna flácido o esfíncter, fazendo com que o canal do teto esteja mais suscetível a infecções por um período de até duas horas. Depois deste período a musculatura retoma seu tônus e o tampão de queratina é novamente formado. Existem vários fatores que podem impedir este retorno à normalidade: ordenhadeira com excesso de vácuo ou com pulsação excessivamente rápida, produtos químicos como desinfetantes com ação cáustica, frio, vírus, e outros. Estes fatores podem provocar uma hiperqueratose na extremidade do canal do teto, o que dificulta o seu fechamento. Esta lesão se caracteriza por um anel esbranquiçado e ligeiramente elevado ao redor do orifício. Em casos extremos, pode haver necrose da abertura, com rachaduras que se irradiam dela e que podem servir de abrigo para os agentes patogênicos. Muitas destas lesões são causadas por um herpesvírus, cuja ocorrência parece ser determinada por condições de "stress" do teto. Em países muito frios, este parece ser o principal agente desencadeante, mas é pouco provável que isto ocorra nas temperaturas ambientes prevalentes no Brasil.

Uma vez que o agente patogênico atravessou o canal do teto e alcançou a cisterna mamária, passam a atuar especialmente os fatores solúveis e as células fagocíticas da imunidade inespecífica. Dentre os fatores solúveis a enzima lactoperoxidase é um dos mais importantes. Ela tem uma ação bactericida ampla, sem afetar as células do organismo. O complemento, até pouco julgado pouco importante como defesa da glândula mamária, hoje é considerado um fator quimiotático para o recrutamento de células fagocíticas para o local da infecção. Um de seus componentes, C5a, apresenta uma grande variabilidade entre vacas, o que pode ser um dos fatores da maior suscetibilidade dos animais que produzem menos C5a. A lactoferrina ocorre em maior concentração na glândula seca, mas também é encontrada no leite. Seu papel é o de competir com as bactérias pelo íon Fe+, essencial ao metabolismo bacteriano, e que por causa da lactoferrina não é encontrado em forma livre no leite.

As defesas celulares inespecíficas na glândula mamária normal são representadas pelos macrófagos, células fagocíticas profissionais que, como as demais células brancas, são capazes de reconhecer estruturas na superfície das bactérias que são bastante conservadas dentro de uma classe de patógenos. Elas são chamadas PAMPs (do termo em inglês pathogen-associated molecular pattern) e são por sua vez reconhecidas por receptores nas células do sistema de imunidade inespecífica (PRRs, pattern recognition receptors). Mas a resposta celular na glândula mamária é muito inferior em eficácia em relação à resposta observada, por exemplo, no sangue ou nos demais tecidos do organismo. Vários fatores parecem contribuir para isto, mas o mais aceito é que no leite as células esgotam sua capacidade fagocítica aos englobarem micelas de caseína e glóbulos de gordura.

As células somáticas, constituídas principalmente por neutrófilos, são atraídas para o leite através de uma resposta inflamatória conseqüente à infecção. Os mecanismos desta atração são muitos e complexos. Dentre estes estão o complemento (fragmento C5a), IL-1b, Fator de Ativação de Plaquetas e TNF-a. A presença dessas células no leite tem conseqüências importantes:

 

 

  • alteração das características do leite que permitem o diagnóstico da mastite;

  • ligação com anticorpos do tipo IgG2 que opsonizam agentes patogênicos, facilitando assim a fagocitose e destruição destes agentes;

  • resolução de grande parte das infecções intramamárias, em especial das causadas por bactérias Gram-negativas.

Imunidade específica

A imunidade específica na glândula mamária dos ruminantes apresenta particularidades interessantes. Em primeiro lugar, embora a imunidade celular tenha um papel importante no desencadeamento e manutenção da resposta imune através de linfocinas, a fagocitose em si encontra-se muito prejudicada pela saturação da células fagocíticas com micelas de caseína e glóbulos de gordura. Além disso, a população local de células produtoras de anticorpos é reduzida na glândula mamária. Por isto, a maior parte das células imunitárias presentes neste órgão tem origem sistêmica, chegando à glândula como conseqüência de uma agressão infecciosa, e são constituídas por neutrófilos. Esta população celular constitui a maior parte das células somáticas. Nos ruminantes estas células apresentam receptores para IgG2 e não para IgG1, o que dificulta uma eficiente opsonização dos antígenos bacterianos.

A quantidade de anticorpos presentes no leite produzido por uma glândula mamária normal é muito reduzida (menos de 1 mg/ml), mas durante a inflamação estas concentrações podem atingir 80 mg/ml. Isto acontece porque durante o processo inflamatório há um aumento da permeabilidade vascular, o que facilita a passagem de imunoglobulinas do sangue para o leite. É também possível um aumento da produção local, mas como a quantidade de células produtoras de anticorpos na glândula mamária não é grande, o mais provável é que a produção local de anticorpos seja pouco significativa. Por outro lado, o aumento da permeabilidade vascular como conseqüência da inflamação ocorre rapidamente e logo no início da infecção, o que garante uma rápida passagem de imunoglobulinas para a glândula mamária. Mas esta seqüência de acontecimentos (primeiro a infecção e depois a passagem de anticorpos para o leite) faz com que estes anticorpos sejam pouco eficazes para prevenir infecções agudas, mas podem auxiliar a reduzir a severidade dos sintomas deste tipo de mastite.

As imunoglobulinas presentes no leite são do tipo IgG, IgG2, IgA e IgM, esta última em concentrações muito baixas. A IgG1 é a imunoglobulina em maior concentração tanto no sangue como no leite, mas nos ruminantes não é a mais eficaz. Como já vimos, neutrófilos de ruminantes não possuem receptores para esta imunoglobulina, o que a torna pouco eficaz na opsonização de antígenos. Os receptores presentes nos neutrófilos de ruminantes são para a IgG2, que normalmente ocorre em concentrações mais baixas que a IgG1. As imunoglobulinas podem agir diretamente sobre os antígenos, neutralizando-os. isto é especialmente importante na neutralização de toxinas bacterianas como a toxina alfa de Staphylococcus aureus, a qual tem um papel importante na produção dos sintomas da mastite aguda.

Vacinas contra mastite bovina

O objetivo de se obter vacinas eficazes contra a mastite bovina vem sendo perseguido desde a década de 1930, com um sucesso limitado. Esta falta de resultados é devida a:

 

 

 

 

  • grande variedade de agentes causadores da mastite;

  • utilização de antígenos que não levam a uma imunidade protetora;

  • antígenos importantes na proteção que são expressos pelas bactérias apenas in vivo, não aparecendo nas condições de cultivo bacteriano utilizadas na produção das vacinas;

  • desconhecimento da fisiologia da resposta imune na glândula mamária;

  • baixa capacidade imunológica desta glândula.

Apesar disto, é possível obter-se resultados razoáveis com pelo menos dois tipos de vacinas:

Vacinas anti-estafilocócicas

Os estafilococos são causadores da maioria das infecções subclínicas da glândula mamária, e tendem a permanecer por longo tempo causando estas infecções. Por estes dois motivos, eles são alvos naturais para o desenvolvimento de vacinas. Muitos estafilococos apresentam antígenos conservados entre as diferentes espécies e amostras, como as pseudocápsulas e a proteína A, que têm sido utilizadas como antígenos em vacinas. Estafilococos também apresentam proteínas de adesão à fibronectina, uma proteína componente do cimento intercelular, que serve para fixar a bactéria ao epitélio mamário. Vacinas contendo estes componentes tem se mostrado eficazes em reduzir infecções subclínicas e melhorar a resposta ao tratamento com antibióticos.

Vacinas anti-Gram negativas

A Escherichia coli e outras bactérias Gram negativas são responsáveis pela maioria dos casos de mastites agudas, de origem ambiental. A descoberta de uma amostra (J5) que apresenta antígenos centrais da bactéria, presentes na maioria das bactérias Gram negativas, possibilitou o desenvolvimento de vacinas contra a mastite ambiental. estas vacinas são especialmente eficazes em reduzir a severidade dos sintomas da mastite aguda e acelerar o retorno da glândula à normalidade. Depois disto, outras amostras bacterianas que expõe ao organismo antígenos semelhantes aos da J5 foram desenvolvidos, em especial a amostra mutante Re-17 de Salmonella typhimurium.

Vacinas anti-estreptocócicas

Estreptococos são responsáveis tanto por casos de mastite aguda como subclínica, e são notoriamente mais difíceis de serem controlados por imunização. Recentemente, descobriu-se que um fator de ativação do plasminogênio pode ser um antígeno eficaz, e que é capaz de conferir proteção cruzada entre os estreptocococos patogênicos. A ativação do plasminogênio é um importante fator de patogenicidade deste gênero de bactérias, porque a presença da fibrina na superfície da célula bacteriana age como um fator antifagocitário.

A escolha de adjuvantes também é importante na formulação de vacinas anti-mastite que sejam eficazes. Para que a vacinação seja eficaz mesmo com a baixa antigenicidade dos antígenos das bactérias que causam mastite, é necessário amplificar esta imunidade pela ação de adjuvantes. Por exemplo, adjuvantes que estimulam a produção de IgG2, capaz de opsonizar antígenos para que sejam fagocitados por neutrófilos de ruminantes, é essencial nas vacinas anti-estafilocócicas. A produção de imunidade local na glândula mamária pode ser aumentada por adjuvantes que atuam diretamente sobre mucosas, como a toxina do cólera e as enterotoxinas LT-IIa e LT-IIb de E. Col.

Por tudo isso, pode-se perceber que a imunidade na gLândula mamária é um assunto complexo, no qual esperam-se ainda grandes avanços no entendimento e no controle imunológico da mastite.

Leitura recomendada

Kehrli, M.E.; Harp, J. (2001) Immunity in the mammary gland Veterinary Clinics of North America - Food Animal Practice, ed. Roth, J.A. Vol. 17(3), pp. 495-516

Nickerson, S.C. (1998) O papel das vacinas no controle da mastite I Simpósio Internacional sobre Qualidade do Leite, pp. 44-53, Curitiba
________________________________________________________________
1PhD Imunologia Veterinária - CAV/UDESC

 

 

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JULIANA ROSA DA SILVA.

ILICÍNEA - MINAS GERAIS - PESQUISA/ENSINO

EM 08/10/2014

Olá, parabéns pelo artigo, gostaria de ter acesso ao texto:

Nickerson, S.C. (1998) O papel das vacinas no controle da mastite I Simpósio Internacional sobre Qualidade do Leite, pp. 44-53, Curitiba



Seria possível que ele fosse enviado por email?
EDILANE NASCIMENTO

JUIZ DE FORA - MINAS GERAIS - ESTUDANTE

EM 20/11/2013

Muito bom!
RAFAEL DANTAS DE ALMEIDA

ANTAS - BAHIA - REVENDA DE PRODUTOS AGROPECUÁRIOS

EM 23/08/2008

Parabens por um belo artigo.
Darão otimas ideias, em principal as protudores.
Abraços..
DOMINGOS FERNANDO MÜLLER FIGUEIRA

SANTANA DO ITARARÉ - PARANÁ - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 04/11/2004

Gostaria de mandar os parabéns pela excelente conteudo do artigo.

domingos fernando m. figueira
m.v responsável técnico pela cooperativa de leite

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