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Pressão baixista

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 21/09/2001

4 MIN DE LEITURA

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Passada a semana dos atentados nos EUA, e constatando que a vida continua, voltemos à questão do leite, que vive, aliás, um momento bastante explosivo por aqui, com o perdão da referência infame.

Falando de preços de leite, que é o tema que mais interessa no momento, reflitam que a pressão para redução dos preços do leite vem, na realidade, e de forma estrutural, de todos os lados. Ultimamente, com instauração de CPIs, os olhos estão quase todos voltados para as indústrias - acredita-se - cartelizadas, mas ela não é a única interessada em viver com leite barato.

Se avaliarmos a posição dos supermercados e outros canais de comercialização, imagino que o preço do leite ideal é o menor possível, desde que estes consigam manter suas margens intactas, o que, aliás, é mais fácil de se fazer quando o preço está mais “palatável” ao consumidor. Vamos lembrar que, via de regra, o leite barato é um ótimo chamariz para que o consumidor adquira outros produtos. Lembremos, ainda, que estamos em um país onde dinheiro não é um bem que sobra no bolso de todos - muito pelo contrário, ou seja, preços menores para o leite também fazem diferença para a grande maioria da massa consumidora.

À indústria de embalagens (não só as cartonadas, mas sem dúvida é esta que possui maior poder de influenciar o setor), também, imagino eu, de nada interessa ter preços altos; o importante é vender seus produtos e, neste aspecto, quanto mais barato, mais fácil será o trabalho.

Às indústrias, estas de forma direta, interessa obter produto no menor preço possível, assim como qualquer produtor procura adquirir milho, farelo de soja, medicamentos, adubo, etc., no menor preço possível, respeitando as suas restrições de qualidade minimamente aceitáveis. Nada mais natural e aceitável em um mercado aberto e competitivo.

Ao governo, pelo menos à área econômica, tampouco parece atraente ter preços elevados para o leite, um alimento básico, que chama voto e que a imprensa sabe explorar muito bem, especialmente quando fatos negativos aparecem (preços elevados, contaminações com coliformes, resíduos de antibióticos e piretróides, por exemplo). Lembremos novamente a celeuma que quase ocorreu no ano passado, quando os preços do leite atingiram valores relativamente elevados durante um curto período na entressafra: saiu no Jornal Nacional e rapidamente falou-se em liberação das importações, pois o leite estava pressionando a inflação. É evidente que os seguidos períodos nos quais o leite puxou a inflação para baixo foram sumariamente esquecidos.

A conclusão que fica evidente é que há muita gente interessada em que o leite custe, como matéria-prima, o menor valor possível. Aspectos como a coordenação da cadeia, a transparência entre seus elos, a fixação do produtor no campo, a geração de empregos, o incentivo à melhoria da qualidade, tudo isto vira pó quando o negócio é mercado. Basta uma sinalização de excesso de oferta (ou, ainda mais frustrante, de demanda, inflando os preços da matéria-prima) para que a pressão baixista se faça valer com toda a sua intensidade. Quando falta leite, o produtor suspira aliviado; mas, pelo andar da carruagem, estes momentos serão cada vez mais breves, uma vez que os demais elos estão aprendendo rapidamente a sobrepassar a falta de produto (exemplo: o rápido investimento em leite em pó nacional, frente à inviabilidade crescente de dispor de produto importado).

Neste cenário, é fácil identificar quem perde e quem ganha: perde o produtor, que vê a possibilidade de receber um preço justo cada vez mais remota; perde a indústria de pequeno porte, que tende a ter custos mais altos, menor poder de barganha junto aos fornecedores de insumos e aos seus clientes, os canais de venda ao consumidor; perdem as cooperativas, que precisam, além de competir no mercado, remunerar o seu cooperado da melhor maneira possível. Ganha quem interessa ver leite com preços mais baixos e tem condições de manter suas margens. Ganham, por fim, as grandes indústrias que possuem marcas fortes, linha diversificada de produtos, agressividade comercial e fôlego para aguentar a pressão baixista, quando esta aparece.

O que fica cada vez mais claro é que, com este mercado altamente imperfeito, se não houver ações efetivas (quebra de monopólios e cartéis, se comprovados, atuação em mercados futuros, ou outra forma que permita a proteção dos preços do leite) e, eventualmente, alguma regulamentação (preços mínimos ?), que busque resguardar o produtor desta pressão baixista permanente, corre-se o risco da produção de leite estagnar ou até involuir.

Nota Inútil

É um tanto irônico que, em meio a talvez a mais grave crise do setor produtivo, a Nestlé esteja investindo R$ 50 milhões em campanha publicitária para comemorar os 80 anos de Brasil, ao mesmo tempo em que se sabe a dificuldade de arrecadar uma fração deste montante, que possa ser investido em marketing do leite e educação do consumidor. Um conhecido mais radical me fez a conta óbvia: “R$ 50 milhões ... este valor, durante 365 dias do ano, seria suficiente para aumentar em 3,5 centavos cada litro de leite entregue à empresa no ano passado”. Mas, cuidado, não nos precipitemos, confundindo alhos com bugalhos: o marketing das grandes empresas auxilia a venda de leite. Ainda bem que ele existe, não só elevando as vendas, mas também contribuindo para aliar a imagem de qualidade aos produtos lácteos junto à população (e, nesse aspecto, a Nestlé realmente merece comemorar os 80 anos de Brasil). De qualquer forma, fica a incômoda sensação de estar do lado errado do rio ... ou, como disse Arnaldo Jabor, outro dia, “cada macaco no seu galho – macaco rico, em galho mais alto, claro”.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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