Mas a tendência será realmente de aumento do módulo de produção? Tudo indica que sim, caso a análise seja baseada no sistema de Pagamento Adicional por Volume da Nestlé, a maior empresa do setor e que verificou uma enorme redução no número de produtores de leite nos últimos dois anos, de mais de 22.000 para menos de 9.000 fornecedores, apesar da captação ter aumentado.
Esta empresa, através do Pagamento Adicional por Volume, dá mostras que essa tendência deve continuar ou até se acentuar, visto que a bonificação por volume é muito significativa. Vejamos como funciona, de acordo com o folheto do SNP - Serviço Nestlé ao Produtor:
Para cada litro de leite fornecido no período de cota (de 1º de maio a 30 de setembro), o produtor recebe um adicional de preço de 0,000123 por litro de leite, a ser aplicado para o leite entregue na safra seguinte (de 1 de outubro a 30 de abril), tendo como limite máximo a produção de 1000 litros para a aplicação do bônus.
Assim, um produtor que produza 250 litros de leite, em média, neste período, receberá 250 X 0,000123 = R$ 0,0308 por litro a mais no preço. Já um produtor que produza 900 litros de leite receberá R$ 0,1107 a mais por litro de leite. A tabela abaixo mostra outras faixas de produção em relação ao adicional de preço, aplicado a partir de um preço-base que hoje é de R$ 0,19/litro de leite, para leite-cota.
De acordo com o referido folheto, mesmo que a produção em determinado mês de safra (após o período de formação de cota) seja maior, a bonificação se dará a partir da produção média da cota. Exemplo: se a produção média do período de cota foi 350 litros/dia, o bônus será de R$ 0,043, ainda que a produção de safra seja maior.
Porém, caso a produção de determinado mês de safra seja menor do que no período de formação de cota, o bônus será aplicado tendo como base esta produção menor. Por exemplo, mesmo que pelo bônus teórico obtido na formação da cota o produtor tenha direito a, digamos, R$ 0,043 por litro a mais nos meses de safra, caso em algum mês o produtor reduza a sua produção, o bônus será baseado nessa produção menor. Vamos aos números para facilitar:
- produção média na época de formação de cota: 350 litros/dia
- bônus por litro, para aplicação na safra seguinte: 350 X 0,000123 = R$ 0,0431/litro
Caso 1:
- produção em determinado mês de safra: 500 litros/dia
- bônus por litro, aplicado sobre todos estes 500 litros: R$ 0,0431
Caso 2:
- produção em determinado mês de safra: 300 litros/dia
- bônus por litro, aplicado sobre todos estes 300 litros: 300 X 0,000123 = R$ 0,0369
Quais as implicações desse sistema?
Em primeiro lugar, mesmo considerando que o fator multiplicador - a chave do negócio - que hoje é de 0,000123, possa mudar, fica evidente que quem produz em maior quantidade (até 1000 litros/dia) terá larga vantagem sobre quem não atinge esta litragem média no período de formação de cota. Um produtor de 1000 litros/dia, fornecendo para a Nestlé, receberá R$ 0,105 por litro a mais do que um produtor com 150 litros (considerando demais parâmetros iguais entre eles, como qualidade, além de estarem em uma mesma região). Esta diferença é muito significativa e, mantida por um longo período, vai alterar profundamente o perfil do fornecedor de leite desta empresa.
A outra conclusão é que deve-se obter uma maior estabilidade entre safra e entressafra, pois, se de um lado o bônus é obtido na entressafra (que começou em 1º de maio), por outro lado, se o produtor reduzir a produção em algum mês da safra seguinte, vai ter um menor valor adicional por litro.
Indo mais além na análise, pode-se sugerir que haverá estímulo para a produção de leite na safra. Explica-se: como o bônus por litro de leite garantido na entressafra é aplicado a toda a produção de safra (caso esta seja maior do que na entressafra), e considerando que os custos de produção (especialmente de quem produz a pasto) tendem a ser menores na safra do que na entressafra, conclui-se que garantir um bom sobre-preço na entressafra, e maximizar a produção de leite na safra, será um ótimo negócio. Quem conseguir, por exemplo, produzir 600 litros na entressafra e 800 litros na safra, terá o bônus de R$ 0,0738 (600 X 0,000123) aplicado aos 800 litros/dia, produzidos teoricamente a custos mais baixos. Caso o produtor reduza a produção - para 400 litros, por exemplo - o bônus será de apenas R$ 0,0492/litro. Obviamente, para evitar essa possível distorção, com elevação excessiva da produção na safra, há o preço a ser arbitrado para o leite-excesso, pelo qual a empresa poderá soltar ou segurar a produção neste período.