A princípio, o produto - até pelo nome adotado - foca um mercado de nicho, diferenciado inclusive pelo preço praticado, um pouco acima do longa vida tradicional. Aqui em Piracicaba, o Pão de Açúcar traz o produto a R$ 1,47 o litro. Em outras palavras, não passaria de mais um produto no mercado, destinado a um público específico, de poder aquisitivo mais elevado, e ponto final.
Porém, a análise de alguns fatos coloca em dúvida essa versão preliminar. A empresa adquiriu maquinário próprio para produzir a garrafa, um investimento de grande porte. Quem passa na frente da sede da empresa, em São Paulo, depara-se com uma enorme garrafa plástica sobre o saguão do edifício, como a anunciar uma nova era na empresa, que vem apresentando resultados econômicos negativos (leia-se prejuízo) nos últimos balanços, com três trocas de presidente nos últimos anos. O produto-símbolo da empresa na área de lácteos, o longa vida em caixinhas, sofre enorme concorrência de marcas provenientes de diversas bacias leiteiras. Além disso, a embalagem tradicional do longa vida permite pouco espaço para inovação.
Neste cenário, a diferenciação torna-se cada vez difícil; não há marketing suficiente para garantir um bom lugar ao sol, ou melhor, nas gôndolas dos supermercados, responsáveis por mais de 80% das vendas. Aliás, nessa questão, aqui vai um dado interessante: Carrefour e Pão de Açúcar, juntos, são responsáveis por 18% da receita líquida da empresa (dados de 1999, Panorama Setorial - Gazeta Mercantil).
Estará a Parmalat procurando uma nova alternativa de mercado ? Se estamos certos em nossa análise ou não, é cedo para saber. O fato, porém, é que a iniciativa da Parmalat sacudiu quem teria mais a perder com um eventual sucesso estrondoso desse produto: a Tetra Pak, fornecedora das tradicionais caixinhas, que imediatamente colocou propaganda em TV, lembrando preventivamente o consumidor que "o leite vem da caixinha".
Sendo a Parmalat a protagonista dessa novidade, sua significância torna-se inegável. Afinal, o espetacular crescimento do leite longa vida (e da caixinha) se confunde com o próprio crescimento da Parmalat no País, que a alçou ao segundo posto, atrás apenas da Nestlé. Pode-se dizer, com pouca margem de erro, que a Parmalat foi quem mais abraçou a causa do leite longa vida obtido via UHT. Desta forma, um novo lançamento da empresa em sentido contrário, ainda que em seus primórdios, é realmente para deixar o mercado bastante atento. Não custa lembrar que a última grande reviravolta no mercado de leite foi justamente causada pela revolução dos processos e das embalagens, com o leite UHT sendo um dos fatores que alteraram radicalmente a geografia do leite no País e permitiram uma reorganização das forças de mercado.
Será que estamos na ante-sala de uma nova mudança ?