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O caso Parmalat: dá para ter algum otimismo?

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

EM 12/01/2004

5 MIN DE LEITURA

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O caso Parmalat surpreende e, ao mesmo tempo, elucida. Surpreende pelo tamanho do buraco, que cresce a cada dia com novas informações que vão sendo descobertas pelos investigadores, pela imprensa e pelos credores mundo afora, tornando qualquer análise ou prognóstico sobre os efeitos do colapso mera especulação. Surpreende por se tratar de uma empresa mundialmente conhecida no setor de alimentos e que, nesses anos todos, tem trabalhado de forma muito eficiente a gestão de sua marca junto ao mercado consumidor. Surpreende pela armação ter sido orquestrada, segundo as informações disponíveis, pelo seu próprio fundador, ao contrário dos outros escândalos recentes, protagonizados por executivos contratados pelas empresas.

Por outro lado, elucida ao colocar os pingos nos "is", nos fazendo compreender que o crescimento acelerado aqui no Brasil, comprando empresas e marcas pelo país, estava ancorado em uma lorota de proporções mundiais, conhecida possivelmente por um pequeno núcleo de pessoas ligadas a Tanzi. Que o episódio nos sirva de alerta e estimule nosso análise crítica em relação a empresas que, de uma hora para outra, apresentam crescimento inusitado em um setor altamente concorrido como o lácteo.

Hoje, não se sabe ao certo não só o tamanho do rombo, mas o que será feito com a empresa e suas subsidiárias. Fala-se por aqui em blindagem da Parmalat Indústria de Alimentos, a empresa brasileira, evitando-se que seja dragada pela crise da matriz. Fala-se em venda fracionada das marcas e unidades da empresa. Fala-se na aquisição global do grupo por alguma grande empresa do setor. Fala-se pela aquisição das subsidiárias da Parmalat por concorrentes locais ou globais.

Além da crise externa, os crônicos problemas com a operação brasileira atrapalham. A empresa opera há vários anos com prejuízo; verificou 3 trocas recentes de comando; tem como produto principal o leite longa vida, responsável por 38,45% das vendas e que se tornou uma commodity, com baixa capacidade de geração de lucro. Mesmo que se consiga blindar a empresa nacional, como sobreviverá sem ter o aporte dos recursos da matriz, em caso de prejuízo, e com baixa disponibilidade de crédito no mercado? Indo por outra vertente, até que ponto a marca principal da empresa - Parmalat - pode ser afetada pela continuidade e pelo agravamento da crise, a ponto de perder consumidores?

No caso da aquisição da empresa por um grande concorrente como a DPA, apontada por muitos como a única em condições de fazer tal investimento, como fica a concentração de mercado? Estas são algumas questões que fazem parte das discussões acerca do destino da Parmalat no Brasil e em outros países também, como no Canadá (veja matéria de hoje), onde o colapso da empresa, líder na captação de leite no país, é vista com apreensão pelos produtores.

O mercado está em compasso de espera, aguardando o "Dia D": 16 de janeiro, data marcada para o pagamento das dívidas com os produtores. Segundo matéria do Valor (12/01/04), a empresa avisou aos bancos que, caso não tenha capital de giro para operar e pagar os fornecedores, há o risco de paralisação das atividades a partir desta semana. Aliás, nesse aspecto, fosse a crise deflagrada no inverno, em época de oferta escassa, a empresa teria perdido enorme fatia do mercado para os concorrentes e talvez já tivesse colapsado por aqui também.

Em meio a tanta notícia ruim, é oportuno destacar alguns efeitos colaterais positivos da crise da Parmalat. O ministro Roberto Rodrigues assumiu o problema para seu ministério e está empenhado não só em resolver o problema pontual, mas fazer com que o setor produtivo saia fortalecido. Em notícia da semana passada, anunciou que o Recoop pode ser reeditado com estímulo à fusão das cooperativas, em tentativa de acelerar um processo que, mais cedo ou mais tarde, terá de acontecer. Também, Rodrigues anunciou a participação da Conab, na compra do leite em pó pago às cooperativas credoras da Parmalat. O envolvimento do ministro, que tem hoje forte presença na mídia e é muito bem avaliado pelo mercado, é significativo e representa não só o compromisso dele com o setor, mas uma vitória das lideranças do setor.

Mas outros efeitos igualmente dignos de nota podem ser mencionados. O fato da pecuária do Rio de Janeiro estar em evidência é um deles. Uma das vítimas da migração do leite para o Centro-Oeste e da perda de mercado das cooperativas (tanto que a central de laticínios do Rio fechou na década passada), o estado via a pecuária de leite perder importância no cenário nacional. Em 1990, o Rio de Janeiro produziu 390 milhões de litros, ou 2,7% da produção nacional. Em 2002, foram 447 milhões, ou 2% da produção. Há muito tempo o leite do Rio de Janeiro não era notícia no país; ontem (11/01) a última página do caderno de economia do Estado de São Paulo foi integralmente dedicada ao efeito da crise da empresa na região de Itaperuna. Além da exposição, as lideranças estão ativas na solução do problema fluminense, mencionando até interesse de compra, pelos produtores, da fábrica da Parmalat na cidade.

Os efeitos também se fazem ocorrer no sul. Em Santa Catarina, a Cooperativa Aurora retomou os planos de investir no leite, criando uma alternativa mais segura aos produtores locais (clique aqui para ler a matéria). No Paraná, fala-se em recompra da Batávia pelos produtores, que venderam a empresa à multinacional italiana há alguns anos atrás.

Em Goiás, o presidente da Centroleite, Haroldo Max de Sousa, afirmou que, se a Parmalat tiver interesse em vender sua indústria de Santa Helena, as cooperativas de leite ligadas à central têm interesse no negócio. O presidente da Faeg, Macel Caixeta, lembrou que essa é a oportunidade de as cooperativas e os produtores de leite terem indústria própria, tornando-se donos do negócio, como acontece na Nova Zelândia, França, Estados Unidos, Canadá, Argentina e Uruguai. Nas palavras dele: "Essa é uma idéia que defendemos há anos. Faltava a oportunidade, que agora parece surgir".

Como reflexo da crise da Parmalat, o setor também analisa mais criticamente a insegurança decorrente da comercialização do leite das cooperativas via "spot" aos grandes laticínios: uma solução aparentemente interessante, mas que fica descoberta quando há excesso de leite ou quando há uma crise dessa proporção, com um grande comprador.

Um efeito não menos importante foi a liberação, ainda que tardia, das normas para obtenção de EGF para a safra 2003/04. É quase inacreditável que, desde o vencimento da vigência das normas da safra 2002/03 para o centro-sul, em 30/09/03, o setor passasse a não poder contar com o instrumento, cada vez mais importante à medida que a safra se aproximava. O caso Parmalat, pelo menos, serviu para apressar o já atrasado processo de aprovação das normas para esta safra.

Tudo somado, seria irresponsabilidade dizer que o colapso da Parmalat é positivo para o setor leiteiro no Brasil. Porém, atrelado ao drama, é possível identificar alguns movimentos saudáveis que surgem como alternativa à crise, alguns deles comentados acima. Resta saber se, passado o furacão, essas sinalizações terão força suficiente para se tornar realidade e, assim se espera, criar as bases para que o setor leiteiro tenha maior vigor e seja mais imune as intempéries que o mercado eventualmente nos trás.

MARCELO PEREIRA DE CARVALHO

Engenheiro Agrônomo (ESALQ/USP), Mestre em Ciência Animal (ESALQ/USP), MBA Executivo Internacional (FIA/USP), diretor executivo da AgriPoint e coordenador do MilkPoint.

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RENATO S. MACHADO POMPÉU-MG

POMPÉU - MINAS GERAIS - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 18/01/2004

Sei não é a finalidadade desta seção não é comentar as cartas enviadas. Mas fiquei muito impressionado com a matéria do João Carlos C. Pimentel.

É raro encontrar artigos com tamanha fluidez de texto tratando de um assunto tão complexo. Além disto é um tópico totalmente novo no dilema, a escandalosa quantia de dinheiro desviada. Eu havia pensado que podia ser maior que o PIB de muitos países mas a comparação em bois é bem mais palpável.

Obrigado pela matéria.
Renato S. Machado
Pompéu-MG
ITAMAR DALL'AGNOL

OUTRO - PARANÁ

EM 14/01/2004

Concordo plenamente com o artigo, porém, a grande maioria das cooperativas está desvirtuada de seus objetivos a que foram criadas.

Apesar de ter como sócios produtores, e ser dito pelos dirigentes "as cooperativas são dos produtores", legalmente o são, mas mesmo que queiram não conseguem opinar, pois as assembléias são orquestradas e os interesses são direcionados para pequenos grupos, os dirigentes de cooperativas que, mesmo sem nenhuma ou pouca experiência, querem gerenciar tudo e comandar pessoalmente qualquer negócio, atendo-se a pequenos detalhes e tornando o negócio pouco ou nada competitivo. Isso faz da cooperativa o pior negócio para o associado, pois na hora de comprar os insumos na cooperativa estes são os mais caros e na hora de vender os produtos, recebe sempre os menores preços, servindo inclusive na grande maioria como reguladoras dos preços para baixo, sendo referência para que as empresas, ao invés de definir o quanto vão pagar ao produtor, negociam pagando apenas centavos a mais que as cooperativas.
JOÃO CARLOS DE CAMPOS PIMENTEL

SÃO PAULO - SÃO PAULO - PROFISSIONAIS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS

EM 13/01/2004

Marcelo, meu caro
Minha contribuição a esta discussão.
O ESTRANHO CASO DO FANTASMA DA DRA. JOAN ROBINSON E A PARMALAT

Não sei o porquê, mas nesse caso da Parmalat uma frase da Dra. Joan Robinson me veio à mente como um outdoor de neon azul pulsante. "Todo mundo precisa aprender Economia para não ser enganado pelos economistas", disse ela duramente. Robinson foi aluna e posteriormente colega de John Maynard Keynes em Cambridge, durante as décadas de 30 e 40. Faleceu na década de 70 como a única mulher no Kings College. Como dizem alguns amigos economistas, ela trabalhou fortemente na área da Concorrência Imperfeita.

Uma outra frase também me veio à mente estes dias: é que aquela que diz que "Economia é uma ciência exata porque erra 100% das vezes". Economia trata de muitos valores que não conseguimos aprender com facilidade. Por exemplo, quanto vale 1 bilhão de dólares? Não adianta dizer que é o equivalente a 3.333,33 Ferraris Dino porque eu vou perguntar quanto valem 3.333,33 Ferraris Dino e nós não chegaremos a nenhum bom termo na disucssão do valor econômico. Aliás, o que é 0,33 de uma Ferrari Dino?
Isto para dizer que, na minha opinião, 1 bilhão de dólares é um valor "irreal" no sentido de que muita pouca gente jamais chega a fazer uma boa idéia mental dele.

Outra coisa que me veio à cabeça foi aquele fenômeno que aprendemos que oocrre com a naftlalina. Como se chama mesmo aquele fenômeno químico em que aquilo que é sólido passa diretamente para o gasoso? Esse fenômeno tem sido visto com muita freqüência no mundo econômico mas sem as correspondentes explicações dadas pelos químicos. Pois é, valores econômicos tão altos estão volatilizando com certa facilidade ultimamente.

Quero dizer que é muito difícil para mim entender o desaparecimento de valores econômicos se os olharmos assim, apenas como valores econômicos. Precisamos transformá-los em coisas mais tangíveis, "pegáveis com a mão", para ter uma idéia do que representa esse desaparecimento.

Os valores econômicos com que lidam as pessoas em sua atividade diária são muito mais reais. Cem bois gordos são 100 bois gordos, 5 caminhões cheios e outro pela metade com bois. Trinta e cinco mil dólares, bruto. Não que eles também não possam se volatilizar com facilidade. Basta vender inadvertidamente uma boiada para um frigorífico que está se preparando para quebrar. Mas a explicação econõmica do desvio aqui é muito mais fácil. Não precisa ser nem químico nem físico para entender.

Números aproximados da pecuária de corte nacional indicam um abate de cerca 35 milhões de animais. Com cada animal fornecendo em média 14 arrobas de carcaça (por causa das fêmeas de descarte) e com cada arroba valendo em média 19 dólares (também por causa delas), parece ser válido estimar que a pecuária de corte brasileira cria um valor econômico agregado - ao nível do pecuarista que cria, recria e engorda animais para abate - da ordem de 9,5 a 10 bilhões de dólares ao ano.

Agora, quanto foi o rombo da Parmalat no Brasil? Segundo a Gazeta Mercantil (de 13 Jan. 04, p. B-10), apenas as dívidas da Parmalat Brasil com os bancos são de 1,8 bilhões de dólares. Portanto, cerca de 20% do negócio do boi de engorda do Brasil em um ano!!!

Segundo a mesma notícia, ao nível mundial os promotores italianos que investigam a Parmalat Finanziaria desapareceram 8 bilhões de euros (ao câmbio atual algo como 10 bilhões de dólares) dos cofres da empresa antes da concordata de 24 de dezembro.

Ou seja,o rombo mundial da Parmalat é da mesma ordem de grandeza do faturamento bruto de todo um ano de todos os pecuaristas de corte brasileiros. Alguém poderia me confirmar se esta minha conta tem fundamento ou rapidamente me corrigir dizendo que os pressupostos e o raciocínio que usei são falsos e, mais importante, COMO eles são falsos?

Tendo transformando todos esses bilhões de dólares em coisas mais palpáveis como bois e vacas abatidos, faço algumas perguntas aos articulistas do site: como alguém pode esconder o equivalente econômico da produção de um ano da pecuária de corte brasileira (que no seguinte estágio da cadeia fornece mais ou menos 7 milhões de t de carcaça)? Imagine o tamanho desse cofre! Um frigorífico! E imagine o tamanho das pistas que a lavagem desse dinheiro deve ter deixado!

Será que alguns bancos - suíços ou das Bahamas- poderiam estar envolvidos nesse negócio, como a Arthur Andersen estava envolvida no caso da Enron?

Será que os promotores italianos - seguindo a competência profissional dos juízes que enfrentaram a Máfia - não apenas chegarão aos culpados do desvio do dinheiro da boiada mas também conseguirão reaver o dinheiro dos investidores e dos fornecedores?

Será que os bancos que financiaram a Parmalat suportarão as perdas relacionadas a esse investimento de risco (como qualquer outro) que se revelou danoso ou será que conseguirão repassar essas perdas - por mecanismos econômicos ad hoc que sempre surgem quando a pressão é adequada - para os contribuintes italianos e canadenses?

E muito mais importante. Será que os economistas italianos - dos quais Vilfredo Pareto é o grande e inefável patrono - ajudarão a rastrear as pistas dessa montanha de dinheiro? Será que alguns deles se prestarão a dar as razões econômicas para o embasamento intelectual dessa pressão e justificarão mais uma vez a frase de Joan Robinson ?

Mas pelo menos uma coisa todo esse negócio tem sido muito bom. Não é todo ano que começa assim tão bem assim para pessoas que gostam de perguntar...

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